Gabriel Tebaldi

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Cedo demais

Confira a coluna Outro Olhar deste sábado, 16 de julho


Há palavras que traduzam a dor de perder um filho? No último domingo, mais vidas se foram na imperdoável 101. Na BR que não permite falhas, bastam segundos para que o milagre da vida se desfaça. Mesmo assim, a estrada é constantemente desafiada pela onipotência da juventude, deixando feridas para todos os lados.

Depois de uma noite de baile funk, Mayara Azevedo assumiu a viagem de Guarapari a Vitória após o noivo cochilar ao volante. Pouco depois, instantes de sono arruinaram sua vida num acidente que matou três dos cinco passageiros. Dentre eles, Thiago, seu próprio noivo.

Naquela noite, o pai, a mãe e as irmãs de Thiago foram a uma festa da igreja. Faltou apenas o rapaz de 25 anos. A família não sabia que o filho estava em Guarapari, mas o pai, Mauro César, desabafou: “Acordei três vezes à noite. Parecia que tinha algo me avisando”.

O destino, então, foi cruel: Mauro descobriu a morte do filho pela internet ao acessar a notícia do acidente. Restou-lhe, aí, a angústia: “Se o Thiago estivesse com a gente, eu não teria perdido meu filho”.

“É tão estranho, os bons morrem jovens”, cantou Renato Russo. Aos 19 anos, Luiz Henrique voltaria de Guarapari em uma van alugada com amigos. De última hora, porém, decidiu pegar carona para acompanhar Juliana, com quem estava ficando. Contrariando a insistência dos amigos, Luiz seguiu viagem.

Em sua casa, a família o aguardava para festejar: naquele domingo era aniversário da mãe de Luiz. A notícia chegou quando a festa já estava pronta. Ficaram as palavras da Legião: “você se foi cedo demais”.

A tragédia resgata a combinação de bebida e direção em uma juventude que é algoz de si mesma. Rompe-se, assim, o ciclo da vida quando pais caminham perdidos para enterrar seus filhos. Em verdade, não há palavras que expressem tal dor.

Talvez o gesto da mãe de Thiago seja o grande símbolo da dor materna: antes de fecharem o caixão, a mãe beijou a testa do filho como quem o abençoa para uma noite tranquila de sono. Ali cantaria Renato: “O que sinto não sei dizer. Só sei que você foi embora cedo demais”.

Gabriel Tebaldi é graduado em História pela Ufes

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