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EUA correm o risco de perder guerra comercial para a China

EUA correm o risco de perder guerra comercial para a China

Nenhum país tem uma equipe econômica mais desqualificada do que a de Trump e os americanos não apoiam essa guerra

Publicado em 2 de agosto de 2018 às 10:51

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O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. (@realdonaldtrump | Twitter)

O que no início era apenas uma escaramuça – com o presidente Donald Trump impondo tarifas sobre o aço e o alumínio – rapidamente vem se transformando em uma guerra comercial de grande escala com a China. Se a trégua acordada pela Europa e EUA se mantiver, os americanos vão travar uma batalha especialmente com a China e não com o resto do mundo (naturalmente o conflito comercial com Canadá e México continuará em fermentação, uma vez que os EUA fazem exigências que nenhum dos dois países pode ou deve aceitar).

Além das alegações verdadeiras, mas no momento banais, de que todos perderão, o que podemos falar sobre os possíveis resultados dessa guerra comercial lançada por Trump?

Em primeiro lugar, a macroeconomia sempre prevalece: se os investimentos internos dos EUA continuarem a superar suas poupanças, o país terá de importar capital e contabilizará um enorme déficit comercial. E pior, em razão dos cortes de impostos aprovados no fim do ano passado, o déficit fiscal americano já vem atingindo novos recordes – segundo projeção recente deve ultrapassar US$ 1 trilhão em 2020 – o que significa que o déficit comercial certamente aumentará, independentemente do resultado da guerra comercial. A única maneira de se evitar isso é se Trump levar o país para uma recessão, com a renda declinando tanto que investimentos e importações vão despencar.

O “melhor” resultado dessa visão estreita de Trump no tocante ao déficit comercial com a China seria uma melhora da balança comercial bilateral, combinada com um aumento em igual volume do déficit com algum outro país (ou outros países). Os EUA podem vender mais gás natural para a China e comprar dela menos máquinas de lavar roupas. Mas venderá menos gás natural para outros países e comprará lava-roupas ou qualquer outra coisa da Tailândia, ou outro país que tenha evitado a fúria de Trump. Mas como os EUA interferem no mercado, o país estará pagando mais por suas importações e recebendo menos pelo que exporta, não o contrário. Em resumo, o melhor resultado significa que os EUA sairão dessa guerra em situação pior do que estão hoje.

Os americanos têm um problema que não diz respeito à China, mas é doméstico. O país poupa muito pouco. Trump, como muitos dos seus compatriotas, tem uma visão extremamente tacanha. Se tivesse um mínimo de entendimento de economia e uma perspectiva de longo prazo, faria o possível para aumentar a poupança nacional que reduziria o déficit comercial multilateral.

Existem soluções temporárias óbvias: a China pode comprar mais petróleo americano e vendê-lo para outros. O que não fará nenhuma diferença além talvez de um leve aumento no custo da transação. Mas Trump poderá alardear que conseguiu eliminar o déficit comercial bilateral.

Na verdade, reduzir de modo significativo esse déficit será difícil. À medida que a demanda por produtos chineses diminui, a taxa de câmbio do yuan cairá, mesmo sem intervenção governamental. Isso em parte contrabalançará o impacto das tarifas americanas, e ao mesmo tempo, elevará a competitividade da China frente a outros países.

Se os chineses adotarem novas medidas retaliatórias mais agressivas, as mudanças na balança comercial de EUA e China serão ainda menores. É difícil determinar os danos que cada um pode provocar ao outro. A China tem mais controle da sua economia e deseja mudar para um modelo de crescimento baseado mais na demanda interna do que em investimentos e exportações. Os EUA estão simplesmente ajudando aquele país a fazer o que já vem tentando. Por outro lado, adotam medidas no momento em que a China procura reduzir a excessiva alavancagem e o excesso de capacidade; pelo menos em alguns setores, os EUA tornarão essa tarefa ainda mais difícil.

Se o objetivo de Trump é impedir os chineses de prosseguirem com sua política denominada “Made in China 2025” – plano adotado em 2015 com uma meta de 40 anos – para reduzir a disparidade de renda entre China e os países avançados, com certeza fracassará. Ao contrário, as medidas que adotou somente fortalecerão a determinação dos líderes chineses de impulsionar a inovação e alcançar supremacia tecnológica, à medida que percebem que não podem depender dos outros e que os EUA agem constantemente de modo hostil.

Se um país entra em guerra, seja comercial ou não, ele deve ter certeza de que tem à frente bons generais, com objetivos claramente definidos e uma estratégia viável, e apoio popular. É nesse ponto que as diferenças entre EUA e China são muito grandes. Nenhum país tem uma equipe econômica mais desqualificada do que a de Trump e a maioria dos americanos não respalda a guerra comercial.

O apoio público vai diminuir ainda mais à medida que os americanos perceberem que estão perdendo duplamente: empregos desaparecerão, não só por causa de medidas retaliatórias da China, mas também porque o aumento das tarifas impostas por Trump elevam o custo das exportações americanas e o preço dos produtos que compram subirá. Isso pode forçar a uma queda no valor do dólar, aumento ainda maior da inflação – gerando ainda mais oposição. O Federal Reserve provavelmente elevará os juros, o que resultará numa redução do investimento e do crescimento, com mais desemprego.

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Nesse cenário, Trump terá “resolvido”, imperfeitamente, um problema que criou. Mas o mundo que vem acompanhando essa insana guerra comercial será bem diferente: mais inseguro e com fronteiras mais controladas e protegidas. Trump mudou o mundo, permanentemente, para pior. Mesmo com os melhores resultados possíveis, o único vitorioso é Trump – com seu ego descomunal inflado um pouco mais.

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