Enquanto o presidente Jair Bolsonaro (PSL) se movimenta para trocar superintendentes da Polícia Federal e não descarta remover até o diretor-geral da instituição, delegados da PF reagem e reforçam a necessidade de implementação de um mandato com período de três anos para o dirigente do órgão.
Em um encontro na Bahia, a proposta, que é antiga, foi reforçada. No Espírito Santo, a Associação dos Delegados da Polícia Federal também faz coro à ideia. O delegado Guilherme Helmer, falando em nome da entidade no Estado, diz que o objetivo é que o diretor-geral continue a ser escolhido pelo presidente da República, mas, uma vez no posto, não possa ser removido.
A Proposta de Emenda à Constituição 101/2015, no Senado, prevê mandato de três anos, com uma possível recondução.
"Se tem uma investigação que atinge um grupo político e esse grupo tem força para interferir na direção da Polícia Federal ele pode pressionar e conseguir a remoção do diretor-geral e, assim, toda a cadeia da PF pode ser alterada", alerta Helmer.
INTERFERÊNCIA
Questionado se as recentes declarações de Bolsonaro, como "sou presidente para interferir mesmo" dão força à proposta do mandato, ele avalia que sim. "Essas discussões desses últimos dias acabam reverberando a necessidade desse projeto ser aprovado."
Mas isso dependeria do Congresso Nacional. A Câmara, por exemplo, parece estar em outro clima, aprovou recentemente o projeto da Lei de Abuso de Autoridade, que tem pontos controversos questionados por policiais, membros do Ministério Público e do Judiciário, embora encontre amparo em entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Helmer avalia que mudanças, como a ida do ex-Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras ) para o Banco Central não são, em si, ruins: "No Banco Central também temos servidores competentes. A simples mudança não necessariamente interfere na qualidade do trabalho. Espero que a mudança fique no campo republicano".
Há um ano, o então juiz federal Sergio Moro declarou-se favorável à instituição de um mandato para o diretor-geral da Polícia Federal. Para Moro, a medida seria "salutar" a fim de evitar "interferências indevidas e protegê-lo (o diretor-geral) de retaliações políticas".
Moro, como Ministro da Justiça, agora, em tese, comanda a Polícia Federal. "Quem manda sou eu, vou deixar bem claro, dou liberdade para os ministros todos, mas quem manda sou eu", afirmou o presidente da República, no último dia 17, justamente ao ser questionado sobre mudanças na PF.
"MOMENTO NÃO É ADEQUADO"
O presidente do Sindicato dos Policias Federais no Espírito Santo, Marcus Firme, não vê urgência no debate sobre a adoção de um mandato para o delegado-geral da PF.
"Nossa posição, do sindicato e da Federação Nacional dos Policiais Federais, é que isso deve ser tratado entre a categoria, entre os cargos que formam a carreira da Polícia Federal. Este momento não é adequado porque é um momento quente, das falas do presidente. A associação dos delegados está aproveitando isso para ascender a PEC 412/2009, que está na Câmara", avalia.
A PEC 412 trata da autonomia da Polícia Federal e permitiria, por exemplo, que a PF elaborasse o próprio orçamento.
"A gente não concorda com interferência nas investigações e isso nunca aconteceu. A prova é a Lava Jato", pontua Firme.
"A Polícia Federal trabalha, a Lava Jato ocorreu apesar de não termos uma autonomia formal. Ao longo da Lava Jato tivemos um longo período de turbulência em que não sabíamos o dia de amanhã, se o superintendente ia ficar, se o dirigente ia ficar. O Ministério Público Federal não passou por isso", observa Helmer.
"Agora, interferência sobre escolha de superintendentes a gente não vê com bons olhos. A escolha tem que ser técnica e dentro da meritocracia do órgão. Mas são comuns as trocas de superintendente", lembra Firme.
O avanço do governo sobre a Polícia Federal não é isolado, também há tentativa de interferência em outros órgãos de investigação e controle, como o antigo Coaf, renomeado Unidade de Inteligência Financeira - agora com possibilidade de indicações políticas - e sobre a Receita Federal.
Sem contar a escolha do novo chefe do Ministério Público Federal, a ser feita por Bolsonaro, provavelmente, fora da lista de três nomes elaborada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR).
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