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Pecados que afetaram a duplicação da BR 101

Pecados que afetaram a duplicação da BR 101

Atrasos no leilão, brigas na Justiça e até redução do preço do pedágio, diminuindo recursos para obras

Publicado em 17 de setembro de 2017 às 00:49

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Sem a duplicação, motoristas enfrentam riscos e congestionamentos na BR 101 . ( Ricardo Medeiros)

O vai e vem para garantir a duplicação da BR 101 antecede em muito a assinatura do contrato. A história começa em 2011, com o lançamento do edital para a concessão da rodovia, adiado para ajustes nas regras. Isso atrasou o leilão. Depois vieram brigas judiciais entre os concorrentes, o que postergou a assinatura do contrato algumas vezes, atrasando em quase dois anos o aguardado início das obras.

Mas o pecado original, apontado como um dos principais fatores dos problemas enfrentados hoje pela concessão, vem do preço de pedágio oferecido para ganhar a licitação: o valor foi 45,63% menor do que o estabelecido pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Isso reduziu praticamente pela metade a receita necessária para as obras, como relatam especialistas. “É muito alto. Era premissa de otimista”, avalia Cláudio Frischtak, da Inter.B Consultoria Internacional de Negócios.

Segundo informações do site da ANTT, a tarifa do leilão foi de R$ 0,06237 por km, “estabelecida pelos estudos de viabilidade técnico-econômica”. O consórcio que hoje é a Eco101 venceu oferecendo o valor mínimo: R$ 0,03391 por km.

De acordo com o professor da Fucape, Fernando Caio Galdi, dar um lance por quilômetro rodado menor, com deságio (redução do valor) de 45,63%, acarreta, ao longo dos anos, uma receita também menor para a empresa. “E menos capacidade de investimento”, pondera, acrescentando que a receita de uma concessionária é o número de carros que passam pelo pedágio multiplicado pelo preço.

A empresa, avalia Galdi, tinha uma projeção da receita com base nos quilômetros e no tráfego. Um cenário que acabou sendo alterado em decorrência da crise econômica. “Mas é risco do negócio e da concessionária ao entrar em um contrato como este. Deram um lance agressivo para ganhar o leilão. Agora tem que cumprir o que está estabelecido no contrato”, pondera.

Quatro anos após a assinatura do contrato - seis após o início desta história - a empresa alega não ter como cumprir o principal objetivo dele: ampliar a BR 101 no Estado, de Norte a Sul. Obras foram iniciadas em alguns trechos, mas até hoje nenhum quilômetro duplicado foi entregue.

Dentre os problemas apontados pela Eco101, está a demora na obtenção das licenças ambientais, as dificuldades para desapropriar/desocupar a faixa de domínio e os obstáculos para garantir o volume de empréstimos anunciados no lançamento da concessão. Isso acompanhado da redução do volume de tráfego - a fonte das receitas.

Outra virada na história aconteceu logo após a realização do leilão. O segundo colocado - Consórcio Rodovia Capixaba - questionou, até na Justiça, o resultado final. Apontava problemas no plano de negócios apresentado pelo vencedor, o Consórcio Rodovia da Vitória.

As brigas duraram um ano, até que houve um acordo: se uniram e todos passaram a fazer parte de um único consórcio. E não se falou mais nas irregularidades. Os capixabas criaram uma empresa, a Centauros, da qual fazem parte os grupos Coimex, Águia Branca, A. Madeira, Urbesa/Arariboia, Tervap, Contek. Com ela, sem ganhar a licitação, passaram a fazer parte da Eco101 com 27,5% das ações.

Mas a briga teve seus reflexos: a assinatura do contrato foi postergada em quase um ano. O planejamento inicial, quando o edital foi anunciado, era de que o leilão aconteceria em 2011, e no ano seguinte o contrato já estaria assinado, com obras sendo iniciadas, o que só aconteceu em 2013.

O pedágio inicial, que seria com uma tarifa vencedora do leilão de R$ 0,03391 por quilômetro – data base de janeiro 2009 –, foi atualizada em abril de 2013 para R$ 0,04297. Com isto, a tarifa de Pedro Canário, por exemplo, passou de R$ 2,10 para R$ 2,66. O pedágio começou a ser cobrado no ano seguinte, em 2014, já com outro aumento, quando o valor, de Pedro Canário, era de R$ 2,80.

De acordo com o contrato, no primeiro ano a empresa teria que fazer obras de recuperação, sinalização e manutenção em toda a rodovia. Logo depois começariam as obras de duplicação. O previsto é que metade da rodovia estaria duplicada até o sexto ano da concessão (maio/2019), o que equivale a 235,7 quilômetros.

Outros 207,5 quilômetros deveriam ser feitos até o décimo ano da concessão (maio/2023), e, por último, os 32,7 quilômetros finais, que seriam feitos até o 23º ano da concessão (maio/2036).

GATILHO

Mas além do prazo, o contrato prevê um gatilho, que é acionado quando o volume de carros na rodovia ultrapassa o limite estabelecido para cada trecho. Segundo levantamento de A GAZETA, o gatilho foi acionado em três trechos, o que determina a antecipação das obras. Mas nada aconteceu.

Para acelerar os trabalhos, foram autorizadas obras em quatro trechos: João Neiva, Ibiraçu, Anchieta e Itapemirim, além do Contorno de Iconha. Mas até hoje nenhuma delas foi concluída. Nova promessa foi feita na última semana, após cobrança da ANTT, de que as obras serão reiniciadas em outubro.

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Enquanto os investimentos seguem em ritmo de pare e siga, o número de mortes na BR 101 vai se acumulando. Só este ano, até o feriado da Independência, foram 123. Dentre elas a tragédia do último domingo, quando onze pessoas morreram.

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