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Olho no olho e respeito contra o radicalismo

Olho no olho e respeito contra o radicalismo

Especialistas elencam estratégias para auxiliar a convivência com opiniões distintas

Publicado em 28 de abril de 2019 às 01:59

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Fechar-se às próprias convicções pode significar perpetuar informações equivocadas e preconceitos. E há algumas estratégias para que seja menos doloroso conviver com visões políticas distintas. Elas passam obrigatoriamente pelo respeito e pela manutenção da civilidade nas discussões.

"É importante mostrar que o contraditório não é um diabo com chifres, rabo e tridente. Outro ponto é possibilitar o contato com pessoas. Isso é o elemento principal da destruição do preconceito. Pessoas tendem a colocar o outro como errado, como fascista ou homofóbico. E a convivência, o contato, vai desmentindo isso", comentou Elizeu Borloti, do Departamento de Psicologia Social e do Desenvolvimento da Ufes.

Michel Gherman, da UFRJ, segue na mesma linha. Para ele, os encontros são fundamentais.

"A única possibilidade que temos é construindo encontros. As escolas, as feiras livres, os bairros, as praças públicas têm que passar a ser efetivamente lugares de encontro. Acho que a única possibilidade de a gente evitar uma ameaça civilizatória é investindo no encontro, com o diferente e com a diferença", opinou.

LIDERANÇAS

Cientista político da USP, José Álvaro Moisés sugere novos comportamentos sob dois aspectos: individual e geral.

"Do ponto de vista individual, supõe-se humildade e capacidade de perceber que eu não sei tudo e tenho que estar aberto a contemplar a opinião dos outros. Se acha que não tem nada a contribuir, fecha-se como uma ilha. Do ponto de vista geral, é preciso que lideranças, autoridades que dirigem o governo e o Estado brasileiro, afirmem publicamente a diversidade das opiniões", frisou.

Felipe Tessarolo, professor de Mídias Sociais e Novas Tecnologias da Faesa, ressalta a importância de que as discordâncias ocorram dentro de padrões de civilidade.

"É tentar não excluir quem pensa diferente, mas que de alguma forma mantém civilidade no debate. Eu acabo excluindo algumas pessoas, não porque elas pensam diferente. Mas porque não conseguem debater sem agredir ou ofender aqueles que pensam o contrário. O caminho é procurar o diálogo. Não é fácil, mas o caminho é manter a civilidade e uma discussão saudável, até para entender o outro lado e saber mais sobre outros pontos de vista", destacou.

 OS RELATOS

"Bloqueei pelo bem da minha saúde mental"

Rogi Cezarino Universitário, 31 anos

Rogi Cesarino, estudante universitário, bloqueou redes sociais após eleição do ano passado . (Ricardo Medeiros)

"Deletei pessoas que eu amava, amigos que saíamos para beber juntos. Houve uma separação por causa da eleição. A gente nunca havia tido problemas com relação a nada. Mas nas eleições viraram aquelas pessoas que estavam certas e pronto, acabou. Bloqueei porque não dava para ler as mensagens. Tem gente que não dava para conversar. São pessoas que não entendem o que é um debate. Fiz pelo bem da minha saúde mental. Não acreditava que Bolsonaro ou Haddad seriam bons para o Brasil. Não existe tomar um remédio e curar. A política é obra humana, tem que ser maleável. Nós tivemos oportunidade de entrar numa universidade, e era amigo que precisou do Fies. A gente teve um privilégio. Somos responsáveis por debater, melhorar o país. Eram coisas do tipo: 'Foi um crime o que fizeram com Bolsonaro, mas com Marielle Franco (vereadora do PSOL do Rio assassinada. Segundo as investigações por miliciano)... Não sabia nem quem era'. Olha o nível da pessoa. Foi ruim Bolsonaro ser atacado, mas foi pior a Marielle ter morrido. O Facebook está contaminado. As pessoas não querem debater. Querem ter razão. Vão despejar ódio. Algumas pessoas eu considerava muito, mas não estavam abertas. Aí você vê que não faz sentido e não quer mais se envolver nesse assunto. Decidi que política só ia debater pessoalmente, numa roda de debate, com mediador. Na rede social a pessoa não está ali para debater."

"Eu me via extremamente irritado e desgastado"

André Neiva, empresário, 46 anos

André Neiva, empresário, deixou de seguir algumas pessoas com posicionamentos extremistas. (Carlos Alberto Silva)

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"Não tem isso de que o cara é petista e defende o grupo da esquerda e, por isso, é mais verborrágico do que o cara da direita. Nos dois extremos tem o mesmo comportamento, o mesmo modus operandi, incapacidade de dialogar, de exercitar a empatia. Tenho amigos dos dois lados, perdi amizades por causa da campanha política. Os dois lados compartilham da mesma doença. Bolsonaro não é mito, assim como Lula não é Deus. Houve momentos em que eu me via extremamente irritado e desgastado. E via que não valia a pena manter vínculos de amizade que não eram nem tão próximos. Fui deixando de seguir algumas pessoas para deixar de ver determinados comentários que me criavam mal-estar. Se a figura sobre a qual estou conversando está acima do bem e do mal, não tem discussão. Não posso achar que não houve prova para condenar o Lula. E não posso não reconhecer que uma canetada do Bolsonaro, no episódio do aumento da gasolina, prejudicou a Petrobras. Retirei pessoas do meu relacionamento por questões de saúde mesmo. Tem coisa que não dá. 'Se votou no Bolsonaro é porque é homofóbico e bate em mulher'. Não sou obrigado a ouvir um comentário desse. Não é porque Bolsonaro fala em comprar espingarda que vou ter que comprar uma. Não é porque Lula é do PT e rouba que quem vota no PT rouba também. Não pode ser assim."

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