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'Não passava um dia sem vomitar', diz ex-anoréxica que bomba na web

"Não passava um dia sem vomitar", diz ex-anoréxica que bomba na web

"Não passava um dia sem vomitar", contou Natasha Villaschi

Publicado em 5 de janeiro de 2018 às 22:13

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Uma jovem de 19 anos que se intitula ex-anoréxica, ex-bulímica, ex-compulsiva vem conquistando milhares de seguidores em uma rede social. Desde que decidiu abrir o jogo e contar como é uma vida quase inteira convivendo com um transtorno alimentar grave, a capixaba Natasha Villaschi viu sua fama crescer ainda mais.

Nesta entrevista, ela conta, em detalhes, como viveu um “verdadeiro inferno”, nas palavras dela, desde os 11 anos de idade, quando começou a sofrer com a bulimia, passando pela anorexia e pela compulsão com comida, até poucos meses atrás.

“Até os 18 anos, eu não passei um dia sem vomitar tudo o que comia”, revelou ela. Agora, Natasha vive uma fase saudável. Aprendeu a se alimentar direito, recuperou o peso normal, faz academia e se diverte com pipoca e refrigerante nos final de semana. O depoimento dela é impressionante e indica um problema sério e muito comum entre meninas adolescentes, principalmente.

Início

Eu tinha 11 anos e morava com meu pai. Não sabia o que era anorexia, bulimia. Eu me sentia mais cheinha e descobri que poderia vomitar o que comia para emagrecer. Eu ia para o quarto e vomitava dentro de caixas, de copos, que escondia atrás dos móveis. Teve uma vez que foi o maior trauma que tive na minha vida: passei três dias seguidos vomitando dentro de uma caixa de papelão, que ficava escondida no quarto. Na terceira noite, quando fui jogá-la fora, ela estourou. Meu quarto inteiro ficou cheio de vômito, paredes, chão... Eu tirava a comida de dentro de mim e não conseguia mais parar. Parecia que havia uma voz na minha cabeça dizendo: “Bota pra fora, bota pra fora, bota pra fora”. Você acaba de comer e fica de mau humor, fica agressiva. Eu ficava louca. E era um inferno disfarçar quando tinha visita em casa. Contava os segundos para ela sair, para eu poder me livrar daquela comida. E quando vomitava, vinha aquela paz.

Bulimia

Fui morar com minha avó, que me levou a uma psiquiatra. Na segunda consulta, ela falou que iria falar para minha família. Comecei a mentir, dizer para ela que eu estava controlando. Ela acreditou. Por quatro anos em que morei com minha avó, eu fiz academia, sempre sendo bulímica. E ninguém percebia. Eu não tinha aspecto de pessoa doente. Nem sempre o bulímico é magro. No início, eu até perdia peso. Mas depois perdia pouco peso, até porque comia muito. Eu comia e vomitava. Virou algo normal, parte da minha vida, da minha rotina. Em casa, na escola, na casa dos outros, em viagem... Não pensava na possibilidade de parar de vomitar, que conseguiria sair disso. Até os 18 anos, eu não passei um dia sem vomitar tudo o que comia.

A anorexia

Eu queria parar de vomitar. Não aguentava mais. Pensei: a solução é simplesmente eu não ter fome. Isso era no final de 2016, quando comecei a tomar remédio para emagrecer. Ficava 24 horas sem comer. No dia seguinte, comprava um biscoitinho e comia um ou dois. Ficava mais um dia sem comer. Isso sem falar nas vezes em que comia e botava para fora. A bulimia continuava. Emagreci muito. Em quatro meses, perdi 18 quilos.

Aparência

Minha mãe, minha avó, todo mundo começou a reparar na minha magreza. Um dia, a empregada chegou e começou a chorar quando me viu. Ela perguntou: “Nat, o que está acontecendo com você?”. Eu sentia nojo de comer. Eu vi que o remédio fazia efeito quando eu vi que não conseguia mais comer meu prato preferido, que é pizza. Saía com meu namorado e amigos, todo mundo comia pizza e eu não comia nada e ficava feliz com isso. E emagrecia mais e mais. As pessoas falavam: “Natasha, tá assustador”, “Natasham você está feia”. O osso do meu quadril ficava para fora.

Saúde

Minha menstrução quase não vinha mais. Perdi a força nas pernas, nos braços. Não conseguia lavar meu cabelo no chuveiro, não conseguia segurar o secador para secar o cabelo sozinha. Ia passear com meu cachorrinho e não conseguia nem chegar na esquina de casa. Nessa época, eu pesava uns 43 quilos. E eu tenho 1.67m. Nem tinha mais roupas. Às vezes, o PP não servia. Na loja, quando não tinha meu número, fingia que ficava triste, por dentro eu achava isso lindo. de tanto falarem, fui a um médico, que viu que minhas taxas estavam quase zeradas. Eu estava completamente anêmica. Ele disse que não sabia como eu ainda não havia perdido os movimentos. Queria me internar. Como ele é da minha família, me passou vitaminas e foi acompanhando. Fui a uma psiquiatra, que me passou mais remédios, acho que era um antidepressivo. Tomava junto com remédio para emagrecer, mas achei que cortou o efeito e fiquei com medo de engordar. Parei de tomar tudo. Comecei a tomar mais remédios para emagrecer. Um por dia não fazia mais efeito, meu organismo havia se acostumado. Passei a tomar quatro de dia e dois à noite.

Depressão

Esses remédios começaram a afetar minha mente. Fiquei depressiva, chorava o tempo todo, estava pra baixo, me achando horrível.

Compulsão

Em maio do ano passado, percebi que o remédio para emagrecer parou de fazer efeito e comecei a ter crise compulsiva. Passava o dia inteiro sem comer e, à noite, comia uma pizza inteira sozinha e vomitava depois. Comprei remédios mais fortes para emagrecer, que não adiantavam. Eu acordava comendo e passava o dia comendo. De manhã, ia à padaria na frente de casa, comprava R$ 50 em salgadinhos e comia tudo de uma vez. Depois vomitava. Em seguida, comprava um pacote de nuggets, comia e vomitava tudo. Almoçava três pratos, e vomitava depois de comer.

Crises

Eu comia cerca de 10 mil calorias por dia, uma coisa absurda. As noites eram piores. Uma vez, lembro bem dessa crise, comi três pratos de janta, depois um pedação de bolo de chocolate, depois encomendei uma pizza gigante e ainda um lanche, com dois hamburgueres, duas batatas-fritas e dois milkshakes. Às vezes, passava no McDonald’s com amigos à noite, pedia três sanduíches, três batatas-fritas, milkshakes e falava que era para minha mãe. Era tudo para mim. Comia e vomitava. Se tivesse ervilha congelada, eu comia. Não dava para parar. Comia chorando, comia até o que não gostava de comer só para ter a sensação de comer algo. Mas mesmo vomitando, não dá para eliminar tudo. Por isso, engordei muito rapidamente. Foi um inferno. Isso durou uns três, quatro meses, comendo sem parar. Acordava passando mal e queria comer mais. Ganhei quase 25 quilos, chegando a pesar 68 quilos.

Dietas

Queria emagrecer e comecei a fazer dietas, como a da proteína, low carb. Fui a cinco nutricionistas. Os cinco passaram dietas restritivas, de 600 calorias por dia. Uma delas, mesmo sabendo que eu era compulsiva, me passou para comer, no café da manhã, dois pedaços de queijo e café puro. No jantar, era salada e carne, e a ceia eram quatro castanhas do pará. Eu postava fotinha das quatro castanhas, mas por trás comia o pote inteiro. Era triste. Não que seja errado. Tem gente que faz dieta low carb e se dá bem. Mas não uma pessoa que é doente.

Mudança

Comecei a pesquisar sobre alimentação, sobre corpo humano, como funciona quando a gente come cada alimento. Li sobre metabolismo, sobre exercício físico. Entendi que podia comer e comecei a comer de tudo: carboidrato, gordura, proteína. Comecei a me arriscar. Aos poucos, fui perdendo o medo de comida. Aprendi que comida não é inimiga, ao contrário, é sua amiga! Você tem que nutrir o corpo! A partir do momento que passei a comer de verdade, comida de verdade, arroz, feijão, parei de ter compulsão.

Nas redes sociais

Na fase de anorexia, muita gente comentava que eu estava feia, doente. Mas muita gente elogiava. As pessoas acham maravilhoso ser esquelética, acham lindo. Eu queria ser magrinha, com corpo delicadinho. Para mim, quem estava criticando era porque tinha inveja. Uma coisa que me ajudou foi parar de seguir gente que estimula a magreza, a parar de comer, pessoas que só postavam corpo “perfeito”. Pessoas que eu seguia e ficava me questionando: “Por que eu sou tão horrível? Por que não posso ter um corpo assim?”. Comecei a dar unfollow nessas pessoas e a seguir meninas que postavam a realidade, foto da barriga contraída e foto com a barriga relaxada, mostrando o absurdo dos truques do Instagram. Sei que a rede social motiva bastante, amo postar, é uma motivação a mais. Uso essa ferramenta a meu favor. Sei que vou ajudar as pessoas contando minha experiência. Minha página tem mais de dois milhões de visualizações. Criei meu perfil em junho de 2017. Desde que comecei a falar sobre meu transtorno alimentar, minha nova rotina de vida, ganhei 2.140 seguidores em uma semana. Até comecei a ter cuidado na hora de postar porque vi o quanto eu influenciava outras meninas. Elas seguem o que eu falo. Comecei a seguir a dieta flexível, que foi o que me fez acabar com a compulsão, e vi quantas meninas começaram a fazer também esse método por minha causa.

Mudança

A última vez que tive a compulsão foi em 23 de outubro de 2017. Até postei como foi, o que eu comi. Decidi no dia seguinte não deixar mais de comer. Passei a identificar minha fome. Se eu quiser almoçar e depois comer uma colher de doce de leite de sobremesa, tudo bem. Melhor do que comer um pote inteiro no final de semana. E se eu exagero, fico bem, sei que não vai me prejudicar em nada. Se você tem uma alimentação boa na maior parte do tempo, não tem problema. Mas para chegar nessa consciência, quanta coisa passei. Ficar sem comer não é ter prazer na vida, não é felicidade. Comer e vomitar é doença.

Ajuda profissional

Ir para psiquiatra não adiantou para mim. Não estou dizendo que não é importante. Não sei se é porque não insisti, porque ela ameaçou contar para minha família o que eu fazia e isso quebrou minha confiança... Mas o fato é que naquela época eu não queria me ajudar. Agora, mais recentemente, fui a uma psicanalista. Só não dei continuidade porque sou muito teimosa. Mas eu sei que teria melhorado muito mais rápido se tivesse essa ajuda profissional. Meus problemas têm muito fundo emocional. Sempre indico a todo mundo que é fundamental ajuda de um profissional. Mas ninguém vai te ajudar se você não quiser melhorar. Você vai mentir para se livrar, para o psicólogo parar de pegar no seu pé.

Futuro

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Não tem chance de eu voltar a ter compulsão, bulimia. Hoje sigo a dieta flexível, mas minha intenção é comer normalmente, sem medir quantidade. Já evolui muito, aceito comida e como bastante. Mas quero mais que isso, quero não contar calorias, não ter que me pesar. Poder comer comidas não saudáveis também e não ficar preocupada com as calorias, em gastá-las. Quero me libertar disso. Ser uma pessoa normal. Esse é meu objetivo.

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