> >
Análise identifica a presença de microplástico em água engarrafada

Análise identifica a presença de microplástico em água engarrafada

OMS irá avaliar os riscos relacionados com o consumo dessas substâncias

Publicado em 15 de março de 2018 às 15:10

Ícone - Tempo de Leitura 0min de leitura
Água engarrafada. (Pixabay/Reprodução)

A água engarrafada é vendida aos consumidores como pura e saudável, mas esta pode não ser a realidade. Um trabalho investigativo realizado pela Orb Media revelou a presença de micropartículas de plástico — com menos de 5 milímetros de diâmetro — em 93% da amostra analisada, de 259 garrafas de 11 marcas líderes compradas em nove países, incluindo o Brasil. Em uma delas a concentração por litro ultrapassou a marca de 10 mil partículas. O impacto desses materiais sobre a saúde humana ainda não foi pesquisado, mas após a divulgação dos resultados a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou que irá avaliar os riscos da ingestão.

“Enquanto a OMS continua priorizando os riscos conhecidos da água para a saúde, estamos conscientes de que esta é uma área emergente de preocupação para consumidores e Estados membros”, afirmou o órgão das Nações Unidas, em comunicado. “Assim, a OMS, como parte de sua revisão contínua de novas evidência sobre a qualidade da água, irá analisar as escassas evidências disponíveis para identificar lacunas e estabelecer uma agenda de pesquisas para a avaliação de riscos”.

O estudo foi supervisionado por Sherri Mason, pesquisadora da Universidade Estadual de Nova York em Fredonia. Os resultados mostram que, em média, cada garrafa tinha concentração por litro de 10,4 micropartículas de plástico com diâmetro maior que 100 micrômetros, o equivalente à espessura de um fio de cabelo. Os testes também constataram a presença de 314,6 partículas por litro com dimensões entre 6,5 e 100 micrômetros.

Das 259 garrafas analisadas, apenas 17 estavam livres do microplástico. A concentração máxima foi de 10.390 partículas. Em alguns casos a concentração era tão grande que um astrofísico, acostumado a contar estrelas no universo, foi convocado para auxiliar nos cálculos. Os pesquisadores usaram uma técnica que consiste em adicionar uma tintura vermelha fluorescente que adere a superfícies plásticas, mas não a materiais que ocorrem naturalmente.

As partículas maiores de 100 micrômetros puderam ser identificadas usando uma técnica espectroscópica. Das cerca de 2 mil micropartículas analisadas, 54% eram fragmentos de polipropileno, plástico usado nas tampas das garrafas. Também foram encontrados pedaços de náilon (16%), poliestireno (11%), polietileno (10%), poliéster (6%) e outros plásticos (3%).

As marcas testadas foram: Aqua (Danone), Aquafina (PepsiCo), Bisleri (Bisleri International), Dasani (Coca-Cola), Epura (GEPP), Evian (Danone), Gerolsteiner (Gerolsteiner Brunnen), Minalba (Grupo Edson Queiroz), Nestlé Pure Life (Nestlé), San Pellegrino (Nestlé) e Wahaha (Hangzhou Wahaha Group). As amostras foram adquiridas em 19 cidades espalhadas por nove países: Brasil, China, Estados Unidos, Índia, Indonésia, Líbano, México, Quênia e Tailândia.

COMPANHIAS DIZEM RESPEITAR LEGISLAÇÕES LOCAIS

Em comunicado, a Minalba Águas Minerais informa que “o processo de extração e envase da água da fonte mineral Água Santa, localizada em Campos do Jordão (SP), segue todos os padrões de qualidade e segurança exigidos pela legislação brasileira, refletindo, com rigor, a manutenção das propriedades minerais vindas da natureza”. Estar em conformidade com as legislações locais também foi a resposta de outras marcas analisadas.

A Nestlé testou seis garrafas de três regiões após ser consultada pela Orb Media. Segundo Frederic de Bruyne, diretor de qualidade da companhia, os resultados apontaram a presença de 0 a 5 partículas de microplástico por litro, valores bem abaixo dos testes conduzidos pela equipe de Sherri Mason. A alemã Gerolsteiner também conduziu testes internos, que “tiveram como resultado uma quantidade significativamente mais baixa de micropartículas por litro”.

Segundo Andrew Mayes, professor de Química na Universidade East Anglia e criador do método de detecção com a tintura vermelha, explica que as partículas menores de 100 micrômetros devem ser chamadas como “prováveis microplásticos”, porque “podem ser outra substância desconhecida na qual a tintura vermelha está se aderindo”.

Bruyne, da Nestlé, destacou que os testes conduzidos por Sherri não incluíram a remoção de substâncias biológicas da amostra. Dessa forma, argumentou, é possível que haja falsos positivos. A pesquisadora rebateu, dizendo que esta etapa é realizada apenas em água coletada na natureza.

— Certamente eles não estão sugerindo que a água pura, filtrada e cristalina possa conter madeira, algas e outras substâncias — apontou Sherri.

EFEITOS SOBRE O ORGANISMO SÃO DESCONHECIDOS

Os efeitos sobre o organismo humano ainda são desconhecidos, mas estudos sugerem que 90% do microplástico que consumimos é excretado, mas os 10% restantes ficam retidos no corpo. As partículas maiores se prendem às paredes do intestino, mas as menores, na casa dos 20 micrômetros, podem entrar na corrente sanguínea para se alojar nos rins ou no fígado.

Porém, não existem informações sobre os impactos do acúmulo de microplástico na saúde humana. Para Martin Wagner, toxicologista da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia, é provável que a questão seja de menor preocupação.

— Isso é um tanto lógico, porque acredito que nosso corpo seja bem adaptado em lidar com partículas não digeríveis — comentou, ressaltando que o conhecimento sobre o assunto é muito limitado. — O plástico não precisa viajar pelos oceanos para os peixes para você consumi-lo. Você tem contato diretamente no supermercado.

Uma avaliação da União Europeia conduzida em 2016 estimou que do microplástico consumido por humanos dos frutos do mar “apenas uma pequena fração deve penetrar profundamente nos órgãos” e a nossa exposição a toxinas por esse contato é baixa. Mas Jane Muncke, cientista da organização alemã de pesquisa Food Packaging Forum, afirma que essas estimativas foram baseadas em modelos científicos, não em estudos laboratoriais.

— Existe alguma interação no trato gastrointestinal com essas micropartículas que poderiam potencialmente fazer com que esses produtos químicos fossem absorvidos pelo corpo humano? Não temos dados experimentais para confirmar essa suposição — disse Jane. — Nós nem conhecemos todos os produtos químicos nos plásticos. Existem muitas incógnitas. Isso, combinado com a alta exposição de toda a população com essas coisas, torna a história grande. Eu acho que seja algo para nos preocuparmos.

Este vídeo pode te interessar

 

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta

A Gazeta integra o

The Trust Project
Saiba mais