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Por que a música pode ser tão bem à saúde?

Por que a música pode ser tão bem à saúde?

A ciência mostra que ela pode aliviar a dor e ajudar a tratar doenças

Publicado em 1 de junho de 2018 às 11:32

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Nicolas Neves está sempre com fone de ouvido. (Vitor Jubini)

Uma simples canção pode te relaxar, te animar, te deixar triste, concentrado e menos ou mais estressado. A ciência se interessou em estudar os efeitos da música no cérebro e foi além ao descobrir que ela pode soar tão bem aos ouvidos quanto ao coração. Parafraseando aquele velho ditado: quem escuta música, seus males espanta.

Uma sonata de Mozart ou uma canção da cantora pop britânica Adele pode fazer você dormir como um anjo. A música pode ser relaxante a ponto de ser tão ou mais eficaz do que a meditação ou do que um ansiolítico, tipo de droga tranquilizantes usada para controlar a ansiedade.

Ela pode afastar a depressão, aliviar a dor, equilibrar a pressão arterial, entre outros benefícios já constatados em diversos estudos, que tratam da ação da música em seres humanos desde que estão na barriga da mãe até o estágio final da vida.

DOENÇAS

"A música trata, recupera, reabilita e até ajuda a prevenir doenças", afirma a musicoterapeuta Maristela Smith, que atua na área de problemas neurológicos do Hospital das Clínicas de São Paulo.

Não é de hoje, segundo ela, que a música passou a ser objeto de estudo na área da neurociência. "Já se sabe que a música gera um estímulo tão grande que não há uma região do cérebro que não seja influenciada".

O cérebro processa o som, e o corpo inteiro sente os efeitos. "Quando você fica doente, tudo muda: o ritmo respiratório, cardíaco. Numa hipertensão, por exemplo, tudo fica desregulado. E a música é capaz de entrar em sintonia com o organismo, que tende a sincronizar com o ritmo ouvido", destaca a especialista.

TERAPIA

Maristela explica que a musicoterapia vai muito além de tocar uma música ou cantar para doentes. "Fazemos uma pesquisa, vamos atrás da história da pessoa para saber o som certo a ser usado na terapia. E há toda uma intenção clínica. Podemos querer que a música atue no resgate da memória, para verificar atenção e concentração, para aliviar uma dor aguda ou crônica, na diminuição do grau de ansiedade ou estresse, melhorar o sono", lista Maristela.

A música toca fundo nas emoções. "Estudos mostram que a música ajuda a controlar o estresse e vários marcadores fisiológicos. Um som mais relaxante pode ajudar no sono, bem como uma mais agitada aumenta a atividade do sistema nervoso simpático, aumentando a adrenalina", cita o professor Vitor Valenti, pesquisador do Centro de Estudos do Sistema Nervoso Autônomo da Unesp, em São Paulo.

Será que uma mesma música provoca efeito semelhante em qualquer pessoa? "Existem alguns elementos estruturais da música que levam a determinadas reações. Por exemplo, 90% das pessoas que escutarem um som repetitivo e lento por mais de 15 minutos vão sentir sonolência. Da mesma forma que algumas músicas mais agitadas podem ajudar na performance dos atletas", comenta a musicoterapeuta.

Mas em geral, diz ela, cada um reage de um jeito a um som. "É algo muito pessoal. Por isso, buscamos sons e ritmos que têm significado para o paciente. Teve um caso em que usamos o som de um papagaio falando para um paciente que tinha esse bicho de estimação", cita.

O universitário Nicolas Augustin Neves, de 21 anos, está sempre com um fone de ouvidos. A música o acompanha em praticamente tudo, no sono e nas andanças pela cidade. Até na hora de estudar ele apela para um sonzinho. "Quase não tiro o fone para nada. Gosto de estudar escutando música porque acho que melhora minha concentração. Na rua, quando saio de bicicleta, coloco sempre um som mais animado. E como sou agitado, preciso de uma música mais calma para conseguir dormir”.

"QUANDO TIVE CÂNCER, A MÚSICA ME AJUDOU MUITO"

Começa o terceiro movimento do concerto de Rachmaninoff, e a dona Sonia vai fechando os olhos. Quando toca o Noturno, de Chopin, ela já está em sono profundo. A música embala os sonhos dessa senhora de 76 anos. “Todos os dias é assim. Não durmo sem escutar minhas músicas. Deixo o som tocando a madrugada toda”, conta Sonia Saadi.

Dona Sonia Saadi mostra a playlist que ela escuta na hora de ir dormir. (Bernardo Coutinho)

Para ela, melhor companhia na cama não há: "A música clássica me ajuda a dormir, me relaxa, alimenta meu espírito. E quando me levanto, pela manhã, tomo banho e boto para tocar enquanto me arrumo".

Na playlist dela não entram só Mozart, Bach e outros compositores eruditos. Tem espaço para um sambinha também. "Adoro ver a Alcione cantar", comenta.

RECUPERAÇÃO

Dona Sonia é professora de piano. Mas música para ela é muito mais do que um ganha-pão. "Sou apaixonada por música. E sei que é poderosa. Tive câncer um tempo atrás, e a música me ajudou muito na recuperação", diz ela.

Não é só impressão da professora. Diversos estudos já comprovaram que a música auxilia na recuperação de pacientes, desde os cardíacos até os que tratam um câncer.

"Há vários trabalhos científicos no mundo apontando que a música ajuda no pós-cirúrgico. Além de aliviar a dor, traz conforto emocional muito grande", observa a musicoterapeuta Maristela Smith.

Escutar música pode atuar até na prevenção de doenças graves. "Há estudos em relação ao Alzheimer e à Esclerose Lateral Amiotrófica, por exemplo. Não é que a música vai evitar esses doenças, mas ela pode prevenir a aceleração delas, adiar um pouco a chegada", destaca.

"É COMO UMA DROGA DO BEM", DIZ PESQUISADOR

Pouca gente pensaria em receitar música para alguém com hipertensão. Mas esse foi justamente o foco do estudo de pesquisadores brasileiros, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Marília.

"A gente tem estudado desde 2012 como a música muda parâmetros fisiológicos no corpo", explica o professor Vitor Engrácia Valenti, pesquisador do Centro de Estudos do Sistema Nervoso Autônomo da Unesp (São Paulo).

O estudo concluiu que hipertensos tiveram uma reposta mais rápida no tratamento com auxílio da música. "Quando o paciente tomava apenas o medicamento, os efeitos benéficos surgiam a partir de 40 minutos. Quando ele tomava o anti-hipertensivo e ouvia música, a reposta do coração foi mais rápida e mais intensa. A frequência cardíaca diminuía em cerca de 20 minutos. Isso chamou muita atenção", explicou Valenti.

Ele ressalta que a música não substitui o tratamento convencional. Mas auxilia, dá suporte a esse tratamento.

 

Isso acontece, segundo ele, porque a música atinge uma região do encéfalo relacionada com prazer. “No momento em que as pessoas escutam uma música que elas gostam, é ativada a mesma região de quando a pessoa usa uma droga. A cocaína causa uma ativação intensa assim, mas a pessoa fica dependente. E nos artigos que vemos, nenhum mostrou que a música causa dependência”, aponta.

O efeito é promovido a partir da audição de músicas relaxantes. “Com ritmos como funk ou pagode não têm essa característica”, diz.

O QUE A CIÊNCIA DIZ SOBRE A MÚSICA

Música mais relaxante do mundo

Um estudo do Radox Spa com a empresa de neuromarketing Mindlab International criou uma playlist para quem quer relaxar. Eles constaram que a canção Weightless, da banda Marconi Union, é 11% mais tranquilizante do que qualquer outra da lista, que incluíam músicas do Coldplay e Adele. Nos oito minutos de duração de Weightless, os níveis de estresse e ansiedade dos voluntários caíram em 65%

Segundo a pesquisa, que teve ajuda de neurologistas e terapeutas, a canção a 60 beats por minuto (BPM) reduz a frequência cardíaca ao nível das ondas alfa do cérebro

Ouça aqui a playlist com as músicas do estudo

Música mais alegre do mundo

A música Don’t Stop Me Now, da banda britânica Queen, hit de 1978, foi apontada por pesquisadores da Universidade de Groningen (Holanda) como a música que mais deixa as pessoas alegres no mundo. Eles consultaram 2 mil pessoas, que selecionaram 126 músicas dos últimos 50 anos que consideravam as mais felizes. O ritmo acelerado (150 batidas por minuto), a aletra positiva e os acordes maiores estão entre os aspectos presentes em canções alegres, segundo o estudo

Ouça aqui 

O som da alegria para bebês

Psicólogos da Universidade de Londres (Reino Unido) criaram, juntamente com a cantora Imogen Heap o projeto Sound of Happy (som da alegria), no qual desenvolveram a primeira música composta cientificamente para “trazer a felicidade e o riso em bebês de 6 a 24 meses”, segundo os autores. A canção tem melodia simples, repetitiva, com vocal feminino e contém risos e outros sons de bebês que tiveram suas reações monitoradas

Ouça aqui

Menos internações

Um estudo da The Cochrane Library apontou que algumas canções podem deixar os pacientes internados, que respiram por aparelhos, mais relaxados e, assim, há um risco bem menos de ocorrerem complicações no estado de saúde deles

Ajuda para hipertensos

A música se mostrou eficiente para, em conjunto com medicamentos, controlar a pressão arterial de um grupo de pessoas. Entre as músicas escolhidas para o estudo estão Someone like you (instrumental piano) e Hello, de Adele; Amazing Grace (instrumental), do cantor de música cristã Chris Tomlin; e Watermark, da cantora Enya

Menos dor no câncer

Pesquisa feita no Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, com pacientes com câncer que tinham dor crônica, mostrou que a música teve efeito semelhante ao da morfina para alguns deles

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Fontes: Com informação de El País, Veja e Estadão

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