A. é um menino de 11 anos e muito inteligente. Sabe tudo sobre futebol e basquete. Com uma curiosidade peculiar para a idade, gosta de História, Geografia e de Política, tanto que fez questão de acompanhar, pela TV, o impeachment da então presidente Dilma Rousseff.
Mas ele não é um garoto qualquer. Embora saiba ler e escrever, nunca foi à escola, não fez viagens em família, nem frequenta festinhas infantis. Passa praticamente a vida dentro do próprio quarto, que parece uma sala comum de um hospital. Quando sai, é com uma cadeira de rodas especial, adaptada para ele.
Nascido com AME, A. já passou por muitos altos e baixos ao longo da vida, desafiando a ciência: é o único paciente no país a viver tanto tempo com a doença sem precisar de uma traqueostomia. Ou seja, ele respira, na maior parte do tempo, sozinho. E isso é tão raro quanto a própria síndrome.
Quando A. nasceu, não havia medicamento como o Spinraza. Mas seus pais, mesmo conscientes de que nunca veriam o filho dar os primeiros passos, encararam de frente uma batalha para que ele tivesse todas as oportunidades possíveis.
Ele não sabe sobre essa doença. Sabe que é uma criança com limitações. Mas é extremamente lúcido, tem a capacidade cognitiva perfeita. É questionador. O mundo criativo dele é imenso, conta a mãe de A., a funcionária pública Sheila Pimentel, 41 anos.
O garoto se alimenta por uma sonda no estômago e não fala, mas consegue se comunicar. Ele balbucia letra por letra, e a gente vai formando as frases, explica ela.
A família, como tantas outras, também está brigando na justiça para que o menino tenha acesso ao novo medicamento. Com esse remédio, sabemos que ele vai muito mais longe. É como dar vida a um ser com planos de viver, ressalta o pai, Renato Pimentel, 45.
Crianças com AME, vivem numa briga contra o tempo. Ele tem uma vida muito fechada porque uma infecção pode levá-lo à morte. Quando saímos de casa, é tudo de forma extremamente segura e controlada. Levamos aparelho respirador portátil, medidor de oxigênio... É triste, mas a gente finge que isso não existe, vai atrás das possibilidades, e as deixamos na frente dele. Vejo ele sonhar. Eu também sonho! Vejo meu filho trabalhando um dia, diz Sheila.
A esperança é que o Spinraza torne a rotina menos sofrida. Não quero só para ele, mas para todas as crianças com AME, diz Renato.
NO ESPÍRITO SANTO, APENAS UM PACIENTE RECEBEU MEDICAMENTO
Assim como a família da pequena Helena, muitas outras precisaram recorrer à Justiça para ter acesso ao tratamento para a Atrofia Muscular Espinhal (AME). Segundo o Ministério da Saúde, existem atualmente 106 processos judiciais com solicitação do medicamento Spinraza contra a União. A pasta afirma que já destinou R$ 1,3 milhão para aquisição do remédio, até junho deste ano.
Outra opção é tentar obter junto ao governo do próprio Estado. No Espírito Santo, de acordo com a Secretaria Estadual de Saúde (Sesa), apenas um paciente foi beneficiado.
Temos o histórico de apenas um paciente, que conseguiu, no início deste ano, via mandado judicial, R$ 2 milhões para seis meses de tratamento, afirmou a gerente de Assistência Farmacêutica da Sesa, Gabrieli Fernandes Freitas.
A solicitação, segundo a gerente, deve ser feita a partir de um processo administrativo junto à Farmácia Cidadã Estadual, e uma comissão multidisciplinar fica encarregada de analisar solicitações do tipo.
É necessário que o Ministério da Saúde se posicione e faça uma política específica para o tratamento da AME, dizendo qual público deve ter acesso ao medicamento. A gente aguarda, para que a gente possa, então, acolher essas famílias, quando vier a solicitação, para que a gente saiba qual o procedimento, comenta a gerente.
O Ministério da Saúde informou que o Spinraza teve seus resultados analisados pela junta médica multidisciplinar do Núcleo de Judicialização do Ministério, sendo indicado para as seguintes situações: crianças com até 7 meses de vida, com AME tipo 1, com duas cópias do gene SMN2, sem qualquer necessidade de assistência respiratória; e crianças de 2 a 12 anos, portadoras do AME tipo 2, sem qualquer necessidade de assistência respiratória, sem escoliose ou contraturas.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta