Pânico, insegurança e tremedeira... uma sequência de sensações que impede Davi de Souza Theodoro de dirigir. O professor de natação, de 21 anos, relata que possui a carteira de motorista, mas ficou traumatizado após a tia morrer em um acidente de trânsito em 2016. Desde então, não consegue mais pegar no volante por receio de que isso também aconteça com ele.
Do mesmo modo, a massoterapeuta Ivone Sarmento Muniz, de 47 anos, parou de dirigir. Ela conta que tem bloqueios emocionais devido ao medo de ser criticada. Há 11 anos, quando tirou a carteira de habilitação, treinava ao lado do marido e ele a pressionava, relata.
A massoterapeuta disse ainda que acabou acomodada com a situação, mas alimenta a esperança de um dia conseguir superar o trauma.
Apesar de parecerem casos isolados, o medo de dirigir afeta a vida de muitas pessoas. A psicóloga Tainá Tatagiba, de 28 anos, explica que é comum atender pacientes com esse tipo de problema.
"Geralmente, os motoristas reprovam em algumas fases antes conseguir tirar a carteira de habilitação. Depois de aprovados, a probabilidade é que não voltem a dirigir devido à ansiedade e receio de acidentes. Há também aqueles que sofreram traumas e entram em desespero só de entrar no carro", expõe.
COMO DRIBLAR O MEDO DE DIRIGIR
Para superar as fraquezas, Tainá indica técnicas de enfrentamento e controle emocional.
1. A primeira instrução é dirigir tendo em mente de que isso é importante para você e não há a necessidade de provar nada para ninguém.
2. A outra é estabelecer metas para melhor alcançar os resultados. O motorista habilitado que tem medo de dirigir deve escolher um lugar calmo e sem trânsito para treinar e estar familiarizado com o veículo. "Nessa fase, é comum sentir medo novamente, mas ele diminui conforme você o enfrenta. Caso seja frequente e intenso, é necessário procurar a ajuda de um psicólogo", completa.
3. A especialista aponta ainda que trabalhar a respiração é um excelente método de controle da ansiedade.
4. Por fim, também é interessante o suporte de um amigo ou familiar.
Esses métodos fizeram a diferença na vida da Engenheira Civil Juliana Resende, de 41 anos. Ela informa que tinha crises de pânico ao dirigir e sempre inventava desculpas para não reconhecer e enfrentar o transtorno. Entretanto, essa situação mudou depois que o marido deu o incentivo de fazer terapia.
ANÁLISE COMPORTAMENTAL PARA SUPERAR O MEDO
Analisar o comportamento das pessoas é outra técnica significativa no combate ao medo do volante. Por meio dela, é possível avaliar a dificuldade emocional, origens dos traumas, níveis de ansiedade e capacidade intelectual.
A psicóloga analista do comportamento, Aline Hessel, relata que é necessário, primeiramente, realizar uma entrevista específica com o indivíduo e também uma avaliação com ela dentro do veículo. A partir desses métodos, será possível traçar as estratégias de superação. Além disso, é importante enfrentar a situação e ela deve ser feita de forma gradativa, do fácil para o difícil, para alcançar melhores resultados.
A especialista afirma ainda que o diagnóstico costuma ser complexo, tendo em vista que os profissionais de saúde, na maioria das vezes, desconhecem tal quadro. "É muito importante a pessoa ter consciência que quanto mais tempo afastada do carro, maior será a necessidade de um profissional para ajudar. O diagnóstico costuma ser muito difícil porque a maioria dos profissionais da saúde desconhecem tal quadro e as pessoas opinam como frescura ou mesmo incapacidade intelectual da pessoa que não consegue dirigir. Porém esse é um quadro muito comum e que pode gerar tamanha frustração e a pessoa pode acabar desenvolvendo outros problemas, tais como a depressão ou pânico", completa.
TERAPIA COM REALIDADE VIRTUAL PARA VOLTAR A DIRIGIR
A terapia com realidade virtual também tem sido eficaz no tratamento contra a fobia de direção e é um dos métodos indicados pelo terapeuta comportamental e professor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Eliseu Batista Borloti.
De acordo com Eliseu, por meio da realidade virtual é possível que o indivíduo reaja exatamente como faria em situações naturais.
Esse tipo de tratamento é adequado para pessoas inseguras e também para as que passaram por algum tipo de trauma. Entretanto, não deve ser o único método para tratar a fobia. É preciso avaliar a situação para descobrir as origens do medo e escolher a melhor alternativa.
O PAPEL DO CENTRO DE FORMAÇÃO DE CONDUTORES
Os centros de formação de condutores também possuem um papel essencial no processo de superação de medos e limitações. É preciso ensinar com atenção, paciência e respeito para gerar segurança. O instrutor de auto escola Jhonifer Carlos Possati, de 31 anos, afirma que é comum receber e acompanhar alunos com medo do volante e que planeja as aulas conforme as necessidades apresentadas por eles.
Cada caso é um caso. Geralmente os alunos que têm alto grau de ansiedade são os que mais inibem o ato de pegar no volante e eu oriento procurar um especialista. Entretanto, na maioria das vezes, costumo levar o aluno em um ambiente calmo para ele conhecer o veículo. Dirigir em locais tranquilos é primordial para se sentir seguro. Tudo parte da prática. Só quando ele se sentir preparado, vamos enfrentar o trânsito, explica.
MISSA EM HOMENAGEM ÀS VÍTIMAS DE TRÂNSITO
Superar uma perda ou trauma não é uma tarefa fácil e exige apoio, paciência e tempo. Sensibilizado com a causa após observar o sofrimento psíquico de parentes e vítimas de acidente de trânsito, o senador Fabiano Contarato, ex-delegado titular da Delegacia de Delitos de Trânsito, teve a ideia de celebrar uma missa em referência ao Dia Estadual em Memória às Vítimas de Acidente de Trânsito para transmitir mensagens de conforto e esperança.
O evento acontece desde 2006 e é realizado no primeiro domingo de agosto no Convento da Penha, em Vila Velha. Para Contarato, as pessoas, ao passarem por traumas, sentem medo de errar e das consequências desse erro. Portanto, essa dor deve ser vista pela sociedade como algo sério e relevante e que elas precisam de acolhimento.
"Como delegado de trânsito, constatei outras mortes que eu acho tão graves quanto a morte física: a morte do matrimônio; a da família, destruída após a perda de um ente querido. Essas são mortes simbólicas que doem tanto quanto a real, mas que não entram nas estatísticas. Por presenciar situações que me deixavam angustiado".
APOIO PSICOLÓGICO E ASSISTÊNCIA DO DETRAN
O Departamento de Trânsito do Espírito Santo (Detran|ES) oferece assistência psicológica gratuita às pessoas que se envolveram em acidentes de trânsito ou que perderam parentes nessas condições. O serviço é realizado pela equipe no Núcleo de Atendimento e Reintegração Psicossocial às vítimas de Acidentes de Trânsito e os Familiares (Narp-Tran), em parceria com a Delegacia de Delitos de Trânsito.
As terapias variam entre cinco e dez sessões, de acordo com a necessidade de cada paciente. O atendimento é feito de segunda a sexta-feira, das 9h às 17h, na Sede do Detran, em Vitória.Para se cadastrar, o interessado deve ligar o telefone (27) 3227-4589.
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