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Seu filho morde? Saiba como lidar com a fase

Seu filho morde? Saiba como lidar com a fase

Especialistas dizem que colocar de castigo ou ensinar a bater de volta não é a solução

Publicado em 12 de abril de 2019 às 18:52

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Fábia Avila com o marido João Francisco e o filho Miguel: quadro da calma para ajudar a lidar com as emoções da criança. (Vitor Jubini)

Eles são uns anjinhos. Pequeninos, doces, sapecas e cheios de energia. Mas, de uma hora para outra, ficam com raiva, mordem, batem, empurram, gritam. Crianças muito pequenas, geralmente entre 2 e 3 anos, costumam testar para valer a paciência dos adultos.

Nem todo pai e mãe consegue lidar com a agressividade típica nessa fase da infância e parte para o tudo ou nada, ou melhor, para a palmada ou o castigo. E se o filho foi a “vítima” de um coleguinha, pior ainda.

“A questão que precisamos entender é que a criança se comunica assim porque não tem outra maneira. Não é com intenção de machucar, de revidar. É única ferramenta que ela tem naquele momento”, destaca Claudia Prados, pedagoga e diretora pedagógica de uma escola de educação infantil em Vitória.

O que deveria, então, ser encarado com mais naturalidade acaba virando motivo para insatisfação de alguns pais. “Nossa escola tem 25 anos. A gente passa por isso com frequência. Vemos a angústia dos pais cuja criança foi agredida e a daqueles cuja criança agrediu alguém”, diz Claudia, que resolveu escrever uma carta para esclarecer um pouco sobre essa fase difícil e tranquilizar os pais.

“O problema é que muitos pais querem bater nos filhos. Dizem ‘você vai apanhar porque bateu no coleguinha’. Ou ensinam a bater de volta. Mas isso é errado, não funciona”, comenta a pedagoga.

Bom seria se os pais conhecessem um pouco mais do desenvolvimento infantil. “Nessa idade, a criança ainda está aprendendo a lidar com os ‘nãos’. Mas ela não sabe dizer ‘eu não gostei’. É uma resposta complexa. Por isso, ela empurra, bate, usa o corpo para responder isso, pois está começando a aprender os códigos da linguagem, as leis”, explica a psicóloga Bianca Martins.

Coletivo

A convivência com outras crianças tem esse papel, mas não é de uma hora para a outra. “Não basta entrar na escola para aprender esse comportamento coletivo. Por isso, a criança ora morde, ora é mordida. Ela empurra e é empurrada”, afirma.

No entanto, o fato de esse comportamento ser normal, uma fase, não significa que tenha que ser tolerado. A questão é como fazer para não perder a calma nessas horas e ensinar aos pequenos como lidar com as frustrações e dificuldades da vida?

“Uma criança que agride precisa ser advertida, mas de forma amorosa. Cabe mostrar a ela, com todo amor e respeito, que não se bate em ninguém, que se conversa. A forma de reagir é falando, e não batendo. Cada birra é uma oportunidade, cada mordida é uma lição a ser ensinada. Parece que nunca vai terminar. Mas o comportamento agressivo vai passar”, orienta Claudia.

Da mesma forma, não é legal armar um complô com outros pais contra um coleguinha que anda avançando sobre os demais da turma. “Os pais não devem deixar que coisas simples de uma criança tomem uma proporção maior do que realmente são”, aponta Claudia.

Isso não pode ser visto como fraqueza ou passividade. “É comum o pai da criança mordida achar que ela está passiva. Tem que acolher e instruir o filho para contar como se sentiu e ensiná-lo que deve dizer ao amigo ‘não me morda’. Explicar que o amiguinho ficou nervoso. Mas nunca mandá-lo morder de volta. Atacar invalida tudo que a gente espera, que é a interação”, reforça Bianca.

Esse diálogo não vai acontecer uma vez só. “A criança não vai aprender de uma hora para a outra. Tem que repetir 590 vezes! Com o tempo, com o amadurecimento, ela vai entender que precisa se conter, vai experimentando o que pode e não pode, começa a ter mais trânsito na questão do social, a ter empatia, a não ser violenta. Também estará mais apropriada da linguagem até ser foi alfabetizada nos sentimentos dela”, diz ela.

Treino

É um treino mesmo, segundo Claudia. “Se os pais começarem a estudar sobre comportamento infantil vão entender os porquês. Sempre tem algo por atrás. E aí, vão saber filtrar essas reações. As coisas vão fluindo. Às vezes, a criança precisa de um tempo a sós. E a melhor intervenção pode ser a não intervenção”.

Logo, o menino cresce e aprende que não precisa bater, empurrar para mostrar o que quer e o que não quer. “Quando as crianças atingem os 6 anos de idade, em que têm um repertório 20 vezes maior do que tinham aos 3 anos com apenas o dobro da idade, essa agressividade instrumental desaparece”, lembra a pedagoga.

Menino aprendeu a usar "quadro da calma"

Miguel tem três anos e meio. É esperto e, como a maioria das crianças da idade dele, está na fase da birra, de não aceitar um simples ‘não’ como resposta. Às vezes, demonstra isso de forma mais agressiva. Mas mais do que apenas pedir aos céus por mais paciência para lidar com essa fase, os pais do menino foram atrás de outros recursos.

“Sei que meu filho tem personalidade mais forte, de defender a opinião dele, de querer ter mais liberdade. E a educação tradicional quer controlar as crianças. Mas vi que se fosse ficar dando ordem, castigo, se fosse bater e gritar com ele, além de desrespeitoso, não funcionaria”, diz a mãe do Miguel, a engenheira de alimentos Fábia Avila Guimarães, 40 anos.

Fábia conta que resolveu estudar a fundo sobre a educação infantil. “Recorro a livros, workshops. Eu e um grupo de amigas estamos estudando e aplicando. Antes de ter filho, eu achava que castigo era válido. Mas vi que há alternativas”.

Uma das ferramentas usadas em casa é o que ela chama de roda da calma. “Usamos figurinhas que ele mesmo escolheu. Ali tem opções para ele se acalmar quando se sentir irritado ou nervoso, triste ou frustrado”.

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E tem funcionado: “Quando ele comenta que um colega bateu, falo para ele que, da próxima vez, é para botar a mão na frente e dizer que não gostou. Nunca bater de volta. Vejo que ele vai ganhando maturidade com essa orientação. Ele já conta que fez carinho, começa a verbalizar, mostrando que compreendeu”.

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