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Cadê a lei de incentivo cultural que estava aqui?

Cadê a lei de incentivo cultural que estava aqui?

Antes comuns nas grandes cidades, leis de incentivo à cultura minguaram. O que aconteceu?

Publicado em 18 de fevereiro de 2019 às 01:34

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Diante da instabilidade do estímulo vindo do poder público, artistas locais se desdobram para manter viva a cultura capixaba. A falta de continuidade de editais das leis municipais de incentivo à cultura faz com que a classe artística acabe não dando vazão a alguns projetos. Nos últimos dois anos, dentre os principais municípios da Grande Vitória, apenas Cariacica lançou editais por meio da lei.

Os editais de fomento à cultura são, em muitos casos, um trampolim para que artistas consigam financiar seus projetos e servem para garantir o acesso democrático aos recursos públicos destinados à área. Só na Capital, mais de 1.100 propostas foram contempladas em dez anos.

18/02/2019 - Ilustração de lei de incentivo à cultura. (Ilustração/Amarildo)

Alguns funcionam através da renúncia fiscal, quando empresas privadas investem nos projetos culturais selecionados em troca de abatimento de impostos. Outros já repassam a verba diretamente para o artista.

“Não é que o artista tenha a verba para toda a produção, mas é um incentivo para que ele dê o pontapé para seu trabalho. Sem os editais, muitos artistas não têm como se mostrar no mercado”, explica a produtora cultural Stael Magesck.

De acordo com as prefeituras, a justificativa para essa descontinuidade dos editais vai desde à baixa arrecadação em alguns períodos até questões estruturais envolvendo a pasta que demandam uma reformulação do texto da lei.

O incentivo financeiro proporcionado por esses editais, é claro, não é a única alternativa para os profissionais criativos, que contam com outros aparatos do poder público. Mas, sem esse patrocínio, projetos como produção e circulação de filmes, exposições, livros e espetáculos poder se tornar impraticáveis.

“Tem artista que banca o próprio trabalho e tem artista que não tem essa condição ou disposição. Às vezes, a gente tem que se virar em outros trabalhos – dando aula, tendo negócio próprio, ou tendo outro emprego – para ter dinheiro de subsistência e realizar o projeto de maneira independente. Isso é possível, mas não é ideal”, pondera a bailarina Ivna Messina, do Grupo Z de Teatro.

“O que todo mundo tem feito, tem feito na garra, porque as prefeituras não têm dado suporte”, confirma Vanessa Pianca, da Comissão Espírito-Santense de Folclore.

O escritor e editor da Cousa, Saulo Ribeiro, lembra que os editais estaduais têm sido regulares, mas não abraçam a diversidade cultural da Grande Vitória, pois precisam abranger os 78 municípios.

“Na Grande Vitória, há uma demanda muito grande, e um edital a nível estadual não dá conta. É fundamental que os municípios tenham seus próprios mecanismos de cultura”, disse.

Único da Grande Vitória com edital aberto este ano, até agora, o município de Cariacica já viabilizou 264 projetos ao longo de 12 anos de Lei João Bananeira. De 2007 para cá, só não houve edital nos anos de 2014 e 2016, segundo informações da secretária Renata Rosa Weixter. As inscrições este ano vão até 22 de março.

“A lei corresponde a mais da metade dos recursos culturais da secretaria, e a gente a prioriza porque a cultura tradicional do município é muito forte”, disse a secretária.

EXPLICAÇÕES 

Enquanto Cariacica ainda tem sua lei de incentivo à cultura funcionando, outras cidades da Grande Vitória suspenderam as suas. Confira a explicação de cada uma.

Silva em show no último Viradão Vitória, em 2018. (Ricardo medeiros - 07/09/2018)

Vitória

A Lei Rubem Braga foi criada em 1991. O último edital foi publicado em 2015. De acordo com o secretário de Cultura, Francisco Grijó, ela foi temporariamente suspensa em 2016 para uma reformulação do texto da lei.

“A gente considerava a lei muito boa, muito importante para classe artística, mas precisava de ajustes. Muitos proponentes pegaram dinheiro público e não prestaram contas. Nós precisávamos reaver esse dinheiro retido, precisávamos ter uma nova postura”, explica.

Com a reformulação, o novo texto da lei, que ainda deve passar pela aprovação da Câmara Municipal, traz mudanças importantes. No lugar da modalidade de renúncia fiscal, os contemplados vão receber o repasse diretamente da prefeitura. Além disso, outros grupos foram incluídos na lei, como games, cultura afro-brasileira, arte digital e novas tecnologias.

A previsão é de que um novo edital seja lançado ainda este ano.

Vila Velha

O último edital da Lei Homero Massena foi lançado em 2012, a suspensão temporária também se deve à necessidade de adaptação. A lei foi criada quando a Cultura ainda era uma subsecretaria vinculada à Secretaria de Educação.

“É um problema estrutural. Não se pode tocar um projeto que esteja com orçamento vinculado a uma estrutura e capitaneado em uma estrutura diferente. As adaptações são necessárias porque são orçamentárias”, explica o secretário Maciel de Aguiar.

A prefeitura está fazendo estudos técnicos no corpo da lei e que a previsão é de que um novo edital seja lançado no segundo semestre deste ano.

Além de alterações que garantam mais agilidade no processo, a secretaria quer providenciar mais orientação aos artistas proponentes de projetos. O objetivo é transpor gargalos comuns nessa área, como a prestação de contas.

Serra

A Lei Chico Prego é de 1999, e o último edital foi lançado em 2016, mas os contemplados nem chegaram a receber o incentivo.

De acordo com o secretário de Turismo, Cultura, Esporte e Lazer, Alessandre Motta, uma modificação na lei causou a falta de pagamento e a impossibilidade de novos editais nos anos seguintes.

Ele explicou que em 2017 os projetos aprovados seriam contemplados, mas houve uma intervenção da Câmara Municipal para a mudança de um artigo da lei, que tratava do repasse da verba.

Se por um lado, havia o entendimento de que o repasse deveria ser feito diretamente para o contemplado, por outro, havia a interpretação de que a verba deveria ser destinada através da renúncia fiscal.

Segundo ele, a discussão se estendeu até 2017, quando a prefeitura decidiu reestruturar a lei. Agora, a gestão aguarda a aprovação do projeto de lei na Câmara Municipal. O objetivo da prefeitura, de acordo com Motta, é que um novo edital seja lançado no segundo semestre deste ano.

ENQUANTO ISSO, EM CACHOEIRO...

A Grande Vitória pode não ter a maioria de suas leis de incentivo em funcionamento, mas em Cachoeiro de Itapemirim, a Lei Rubem Braga anda a todo vapo. Dos 104 projetos inscritos, 29 vão ser desenvolvidos em Cachoeiro com apoio da prefeitura.

As propostas foram contempladas no último edital, de 2018. A lista com todos os vencedores foi publicada na edição de terça-feira (12) do Diário Oficial da cidade.

Teatro Rubem Braga, em Cachoeiro de Itapemirim, recebe projetos apoiados. (Reprodução)

Desse total, 24 projetos foram contemplados por área e outros cinco, por terem alcançado nota para aprovação de quaisquer outras áreas culturais, conforme dispõe o edital, quando em casos de recursos remanescentes ou vacância de propostas em alguma área, o que é novidade na lei.

Cada proponente vai receber até R$ 18 mil. O investimento previsto no edital, ao todo, é de R$ 575.915,00.

De acordo com a consultora interna da Secretaria de Cultura do município, que é responsável pela gerência das leis de incentivo, os editais têm sido publicados todos os anos desde a “estreia”, em 2009.

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“O único contratempo que tivemos foi em 2016, quando um problema administrativo fez com que tivesses que cancelar o edital. Mas ele foi substituído por duas edições da lei em 2017. Fizemos dois para não perder aquele recursos que estava disponibilizado”, explicou.

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