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Crítica: 'Amanda' usa doçura para retratar a dor das perdas afetivas

Crítica: "Amanda" usa doçura para retratar a dor das perdas afetivas

Em exibição no Estado, filme francês dirigido por Mikhaël Hers encanta por sua simplicidade e pelas atuações acima da média

Publicado em 17 de maio de 2019 às 14:55

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Amanda. ( IMOVISION)

Paris nunca mais foi a mesma após os atentados de novembro de 2015. A neurose pela segurança, o medo do desconhecido, ou mesmo o aumento da xenofobia - especialmente contra os imigrantes muçulmanos -, mancharam de vermelho-sangue o cotidiano glamouroso da Cidade Luz.

O cinema, espelho da realidade, não poderia sair ileso. Os ataques foram lembrados tanto em formato de alegoria, seja no “horror-zumbi” de “A Noite Devorou o Mundo” (2018), de Dominique Rocher, ou na neblina mortal de “O Último Suspiro” (2018), de Daniel Roby, como em produções intimistas, vide a grata surpresa “Amanda” (2018), em cartaz no Estado.

Sucesso no último Festival de Veneza, o drama de Mikhaël Hers - que já tinha mostrado a que veio com o solar “Aquele Sentimento do Verão” (2015) - aposta na delicadeza e na narrativa emocional para contar os dramas de David (Vincent Lacoste).

O rapaz é um típico “bon vivant”. Namorador, de 20 e poucos anos, abandonado pela mãe e sem referências afetivas, ele precisa amadurecer após ganhar uma “obrigação” inesperada: cuidar da sobrinha de sete anos, Amanda (Isaure Multrier), após a morte da irmã nos atentados terroristas que horrorizaram a França, tirando o país da zona de conforto.

INTIMISMO

Em “Amanda”, se destaca a simplicidade e a doçura para falar de violência, da dor da perda e do recomeço afetivo. Uma história humanista, que remete ao cinema clássico de Yves Robert, especialmente quando vemos a criança que usa a própria infância como espelho de uma relação paternal, como visto na obra mais importante do mestre francês, “A Glória de Meu Pai” (1990).

Mikhaël Hers, de rara sensibilidade para contar dramas humanos marcados por tragédias, escapa de artifícios narrativos ao, acertadamente, não apostar no melodrama. Seu filme é singelo e maduro emocionalmente. Um flerte com as obras de uma das melhores cineastas francesas quando o assunto é retratar perdas e dores familiares: Mia Hansen-Løve (“O Pai dos Meus Filhos”, de 2009).

Vincent Lacoste - que já tinha mostrado talento em “Conquistar, Amar e Viver Intensamente” (2018), de Christophe Honoré -, é uma espécie de Jean-Paul Belmondo moderno, denso e sensível na mesma intensidade.

Isaure Multrier mostra uma maturidade impressionante como atriz, em um papel que exige densidade dramática e talento emocional. Uma grata revelação em seu primeiro trabalho.

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“Amanda” é um filme que nos faz refletir sobre a casualidade de nossas ações e a necessidade de viver o agora, quase de maneira urgente. Há diálogos reflexivos, como quando a garota questiona o tio o porquê de ele ter retirado os pertences da mãe de sua vista. Há doçura e indignação em cada fala da personagem. Um filme feito com açúcar e afeto, mas sem afetações ou vícios melodramáticos. Na medida certa.

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