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'Estou apaixonada pelo ES', diz Laís Souza sobre viver em Vila Velha

"Estou apaixonada pelo ES", diz Laís Souza sobre viver em Vila Velha

Aos 29 anos, e faltando menos de um mês para "trintar", Laís revela que desfruta nas terras capixabas de uma qualidade de vida que não tinha em São Paulo

Publicado em 8 de novembro de 2018 às 22:33

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É em um condomínio de frente para a praia de Itaparica, em Vila Velha, que a ex-ginasta Laís Souza constrói sua família, junto da mulher, que é capixaba, do cachorro Stunt e do gato Baguera.

Aos 29 anos, e faltando menos de um mês para "trintar", Laís revela que desfruta nas terras capixabas de uma qualidade de vida que não tinha em São Paulo, com mais simplicidade e mais tempo para fazer o que lhe dá prazer: vai à praia, passeia quase todo final de tarde com o cachorro, sai para se divertir com os amigos e a companheira, acabou se apaixonando pelo Estado.

"Eu, Laís, mudei também. Nas cidades maiores, as pessoas estão muito daquela fome de 'ah, quero ter o melhor carro, quero ter a melhor roupa'. E eu estou em busca de uma coisa diferente. (...) Não quero nunca mais ficar juntando coisa, comprando coisa, empilhando objetos que nunca mais vou usar", afirma a ex-ginasta, que mora no Espírito Santo desde o início do ano.

Laís, que competiu em duas Olimpíadas (Atenas- 2004 e Pequim-2008), recebeu a reportagem da rádio CBN Vitória no condomínio onde reside para falar sobre a mudança dela para o Estado, a carreira, a recuperação após o acidente em um treino de esqui que a deixou tetraplégica e o desejo de aumentar a família com um filho.

 

ENTREVISTA

Por que você resolveu se mudar para Vila Velha?

Já vinha antes, mas resolvi me mudar. Um ponto é porque me apaixonei muito pelo Estado, pela orla e as pessoas me receberam com um carinho muito grande, elas têm me abraçado muito aqui. E vim também porque minha mulher é daqui. Juntou a fome com a vontade de comer.

Essa mudança já estava sendo planejada ou foi algo instantâneo?

Vinha planejando a mudança há um tempo e aí eu acho que eu simplesmente vim. Morava em São Paulo, na capital e em Ribeirão Preto, onde nasci. Vários pontos me fizeram apaixonar por aqui. Um é a praia, outro é a qualidade de vida mesmo.. Só de não perder aquele tempo doido no trânsito faz toda a diferença. Comecei a enxergar algumas coisas com outro olhar, diferente do que estava vendo as pessoas passarem em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro. Acho que não foi só simplesmente me mudar, foi uma mudança de vida mesmo. Eu, Laís, acabei mudando algumas coisas.

Quais seriam essas mudanças pessoais?

Nas cidades maiores, as pessoas estão muito com aquela fome de 'ah, quero ter o melhor carro, quero ter a melhor roupa'. E eu estou em busca de uma coisa diferente.

Seu padrão de vida mudou aqui no Estado?

Mudou, mas acho que foi mais eu mesmo, de poder, por exemplo cozinhar em casa. Inclusive, me apaixonei pela moqueca capixaba. Não quero nunca mais ficar igual uma maluca juntando coisa, comprando coisa, empilhando objetos que nunca mais vou usar. Na praia, com o meu cachorro, tenho um gato também, me sinto muito mais feliz.

Perdeu um pouco esse lado consumista, então?

Com certeza. Estou mudando a direção do meu dinheiro, estou juntando mais para poder gastar com as coisas que eu realmente tenho prazer.

Quais são seus planos no Espírito Santo para o futuro?

Acabei ficando muito preocupada com meu futuro, pensando lá na frente como iria ser. Estou nova, vou trintar (risos). Ou seja, estou velha, mas estou nova, mais ainda tenho muita coisa a passar, tenho as minhas dificuldades no particular. Sei que lá na frente vai estar mais difícil ainda, mais pesado ainda. Sou jovem, tenho todo um gasto. Hoje eu procuro levar uma frase que minha mulher fala muito para mim: 'Lá (Laís), não é o que se gasta, é o que se guarda'. Tenho olhado com muito mais carinho para o meu futuro mesmo, para que lá na frente não falte.

O que você mais gosta de fazer aqui no Estado? Quais lugares você visitou?

Ainda tenho muito o que conhecer. O pouco que eu vi foi mais aqui para o lado da orla mesmo, acabei me apaixonando muito pela orla de Vila Velha toda. Vitória é muito legal também. Fui visitar Alfredo Chaves, fui visitar Pedra Azul. Acho que tudo que tem muita natureza eu gosto muito e, principalmente, quando eu posso levar meu cachorro.

Como está sua recuperação aqui no Espírito Santo. Consegue fazer toda a reabilitação no Estado?

Estou tentando trazer tudo para cá, mudar aquela estrutura para cá. Estou conseguindo devagar. Hoje meu treinamento, em parte, tem sido no condomínio da minha casa mesmo. Faço minhas sessões de fisioterapia normalmente.

E o seu trabalho, com as palestras que você dá em todo o Brasil, como ficou depois que se mudou?

Continuo com as minhas viagens, tem muita palestra lá para o lado de São Paulo, para o Rio de Janeiro. Espero que com muito carinho consiga trazer para cá também o meu recado de vida. Não sou a melhor pessoa para falar e tudo, mas hoje eu acho que o que me ergue é o marketing, minha propaganda. Pode ser que eu seja a melhor figura para passar o recado de um cadeirante, ou do atleta, de superação para as empresas. Trazendo para cá pode ser que eu consiga ajudar e o capixaba, principalmente, me ajudar também.

Como é sua rotina aqui?

Gosto muito, muito, muito de uma praia. A minha rotina está parecida com o que era antes. Na maioria dos dias, trabalho pela manhã. Na minha casa, respondendo todos os meus e-mails, montando as palestras, pensando no que eu posso passar para a frente, levar o maior carinho possível. Sempre acabo aprendendo demais com as pessoas durante as viagens. No final do dia, saio com meu cachorro ou saio para comer alguma coisa. Consegui essa conquista de deixar meu dia da forma que eu quiser. O dia fica mais confortável para mim e não muito cansativo. Consigo dar muita atenção para o meu treino e o meu treino hoje está sendo bem pesado até, acabo ficando umas duas, três horas, dependendo do treinamento que eu faço. Gosto de fazer muitos treinamentos na praia também, porque não fico fechada em quatro paredes e acabo olhando a praia, as pessoas, parece que meu cérebro manda um recado diferente para o corpo, para os exercícios. 

Já expressou o desejo de ter filhos. Você e sua mulher pensam em adoção ou inseminação?

Tenho muita vontade de adotar, tenho vontade de ter meu filho. Pode ser que esse sonho venha acontecer. Nem sei se minha mulher vai concordar comigo, mas estava pensando da gente se unir mesmo, se casar de alguma forma, no final de de 2019 ou começo de 2020 e aí sim pensar em ter filhos.

Na biografia que você escreveu no seu site, você fala que passou a focar em mini-vitórias após o acidente. Quais são as suas mini-vitórias hoje?

Hoje, minhas mini-vitórias são estar saudável, conseguir trabalhar, passar para frente esse pouco que eu conheci, que eu vi. Não gosto de levantar nenhuma bandeira, do tipo 'sou cadeirante, sou gay'ou qualquer coisa assim, mas essas são as mini-vitórias: todo dia acordar, estar bem, treinar, passar o dia. Falava das mini-vitórias dentro do hospital porque cada momento estava com uma coisa. Tive febres, melhorei. Fiz traqueostomia, consegui passar por cima. Hoje dentro do meu treinamento, desde ganhar uma sensibilidade, perceber um movimento novo ou saber que estou com o tronco mais forte, eu chamo de mini-vitórias. Estou juntando dinheiro para poder comprar uma cadeira nova para talvez ter uma mobilidade sozinha, mais independente, conseguir levar a cadeira. Sei lá, não sei o que consigo com o queixo ou uma adaptação com o ombro, que é o único movimento que tenho hoje. Sigo atrás dessas pequenas vitórias do dia-a-dia.

Você disse que não gosta de levantar bandeira...

Acho que eu não sirvo para isso, de jeito nenhum. Eu passo por isso: sou cadeirante, sou mulher e sou gay. Sou muitas coisas, muitos preconceitos que tenho que passar por isso. Nunca apontaram o dedo para mim e falaram. Óbvio que no começo, quando descobriram minha sexualidade, acabou sendo mais importante que meu próprio acidente. Foi quando eu fiquei muito puta porque as pessoas ficavam rotulando e colocando uma coisa que não tem importância nenhuma para outra: o sexo, se eu gosto de mulher ou homem, se é uma vagina ou um pênis. Não mede o que a pessoa é.

O tratamento consome muito do seu orçamento?

Algumas particularidades. Tenho as pessoas que trabalham para mim, até um detalhe que as pessoas não percebem que é fazer xixi, eu pago para fazer xixi, tenho meus remédios. O bolo todo vai juntando e dá um mensal muito alto. Estou procurando olhar para as minhas finanças com muito carinho. Antes eu pensava em ir para um restaurante, hoje penso duas vezes antes de ir e prefiro comer em casa e gastar menos. Hoje sinto uma dificuldade muito grande de fazer as minhas viagens, de não ter lugares adaptados, dificuldade de entrar em um avião. Essas pequenas coisas têm um desgaste muito grande que futuramente eu posso parar ou pelo menos acalmar.

Como você avalia a questão da acessibilidade no Estado para cadeirante, particularmente em Vila Velha, cidade onde você mora?

Em alguns lugares com certeza tenho dificuldade. Tem um hospital aqui em Vila Velha que tem uma rampa gigante e teve uma vez que eu fui e o acesso foi bem difícil. Acabei entrando lá por trás, onde tinha lixo e entrava outras coisas. Essas pequenas mudanças precisam acontecer. Quando cheguei aqui, percebi que tem poucas vagas para deficiente. Falam que a frota de ônibus está adaptada, mas o problema não é o ônibus. É chegar até lá: tem buraco, tem calçada não adaptada, uma rampa que tem de um lado, mas do outro não, um poste no meio da rampa. Isso acontece muito: detalhes que quem tem o movimento das pernas, não percebe. Quando andava, nunca iria perceber.

Seus projetos são ligados ao Esporte?

Não muito. O que eu sou ligada ao Esporte é através das minhas amigas, sempre vou ser apaixonada por ginástica e pelo esqui que eu treinei por anos, mas hoje estou com outros pensamentos.

Como avalia extinção do Ministério dos Esportes, anunciada pelo Governo eleito?

Não sei, não estou nada por dentro. Não sei como está caminhando agora o esporte. Tenho um outro olhar para minha vida. O que eu posso falar é o que eu passei , o que eu vivi. A dificuldade que eu vivi mais foi em relação à atenção para a base, o treinamento de base, o psicológico do atleta. Isso tudo eu passei.

Qual mensagem de motivação você gostaria de deixar para o internauta?

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Cara, a melhor mensagem acho que é que as coisas precisam ser feitas com carinho, com amor. Sabe quando as coisas levam seu nome? A gente tem que prezar pelo nosso nome. A partir do momento que eu passo em um lugar e fiz algo com carinho, ele vai ser lembrado daquela forma. Tem que ser pensado com o carinho, com paciência, para o outro, com amor e seriedade.

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