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Especialistas fazem críticas a projeto que flexibiliza porte de arma

Especialistas fazem críticas a projeto que flexibiliza porte de arma

Segundo estudo do Ipea de 2015, Estatuto do Desarmamento ajudou a evitar 121 mil mortes

Publicado em 22 de fevereiro de 2018 às 10:55

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-. (Getty Images)

A notícia de que parlamentares preparam, no Congresso, um pacote que pode flexibilizar o Estatuto do Desarmamento preocupa especialistas ouvidos pelo GLOBO. Segundo eles, estudos produzidos no Brasil e no exterior sugerem uma relação entre casos de homicídios e o número de armas em circulação no país. Eles temem que as novas regras, se aprovadas, aumentem o número de portes de armas concedidos no país e, consequentemente, os crimes. Segundo a Polícia Federal, desde 2004, primeiro ano de vigência do estatuto, até 2017, foram autorizados 61.771 portes. A mesma PF informa que, hoje, há 644.569 armas registradas no sistema do órgão, incluindo armamento de civis, de empresas de segurança e de forças policiais. Não fazem parte desse número as armas computadas no sistema do Exército, destinadas a militares da Forças Armadas, juízes, promotores e desportistas, segundo o site do sistema.

Para Daniel Cerqueira, técnico de planejamento e pesquisa do Ipea e coordenador do Atlas da Violência, a “difusão de armas de fogo na sociedade é um elemento criminogênico”:

— A evidência científica mostra que, quanto mais armas, mais crimes. Nos Estados Unidos, existem vários pesquisadores consagrados que mostram que, quando você tem mais armas em circulação, também observa mais crimes violentos, mais feminicídios, por exemplo. E também não se consegue diminuir a ocorrência de crimes contra o patrimônio.

Cerqueira foi autor, em 2015, de um estudo do Ipea mostrando que o aumento da taxa de homicídios entre 2003, ano em que o estatuto foi sancionado, e 2012 foi de 0,3%. Nos sete anos anteriores, havia sido de 21,4%. Outros fatores contribuíram para esse resultado, mas ele estimou, à época, que o desarmamento evitou 121 mil mortes por armas de fogo nesse período. No mesmo estudo, ele cita que 1% a mais de armas em circulação já causa aumento de até 2% na taxa de homicídio do país.

Pelo Estatuto do Desarmamento, quem deseja ter posse de arma precisa comprovar “a efetiva necessidade” de tê-la em casa, além de atestar que não tem distúrbios e antecedentes criminais. A justificativa é analisada pela Polícia Federal antes da concessão da posse do armamento. O que deputados da bancada da bala — que defendem leis mais flexíveis para aquisição e uso de armas — querem são regras menos rígidas de comercialização. A iniciativa vem à tona justamente no momento em que foi decretada uma intervenção federal na área de segurança do Rio.

Julio Jacobo, pesquisador responsável pelo Mapa da Violência, faz coro e afirma que é falsa a premissa de que armas podem oferecer mais segurança:

— Não há muita vantagem em estar armado; pelo contrário. Quando o bandido invade a casa de alguém, a primeira coisa que procura é dinheiro e arma de fogo. (Ter arma) muitas vezes significa chamar a morte no próprio domicilio, raramente é sinal de proteção.

Em 2006, o relatório final da CPI do Tráfico de Armas do Congresso Nacional mostrava que, de 10,5 mil armas apreendidas no país e rastreadas a pedido da comissão, 55% tinham registro antes de passarem às mãos dos bandidos. No Rio, segundo estudo do Instituto Sou da Paz, 46,6% das armas apreendidas em 2014 eram revólveres e 36%, pistolas.

MULTIPLICAÇÃO DA VIOLÊNCIA

Para o coronel José Vicente Filho, ex-secretário nacional de Segurança Pública, a literatura sobre o tema mostra que não vale a pena afrouxar a legislação sobre compra e porte de armas:

— Não acho válida. É uma falsa percepção de que, quanto mais as pessoas se armam, mais poderão se defender. A reação quase sempre é desvantajosa. Não há nenhuma evidência mostrando que mais armas signifiquem menos crimes.

Coordenador do Viva Rio, ONG que participou da campanha pelo estatuto, Rubem Cesar Fernandes afirma que liberar mais armas pode “multiplicar a violência”:

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— Se a razão é medo, com arma de fogo você fica mais vulnerável. Essa é uma péssima ideia em um momento ruim.

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