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Depoimento de vítima pode ser prova contra médium, diz Promotoria

Depoimento de vítima pode ser prova contra médium, diz Promotoria

João de Deus, que atua em Goiás, tem sido alvo de denúncias de abuso sexual; ele nega as acusações

Publicado em 10 de dezembro de 2018 às 23:15

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Médium João de Deus. (Reprodução/Instagram)

Depoimentos de vítimas podem ser provas suficientes para embasar uma investigação e depois tentar condenar acusados de crimes sexuais. A avaliação é do Ministério Público do Estado de Goiás, que nesta segunda-feira (10) anunciou a criação de uma força-tarefa para receber os relatos e investigar os casos de denúncias contra o médium João de Deus.

Em entrevista nesta manhã, o promotor Luciano Miranda Meireles reforçou a necessidade de as vítimas formalizem as denúncias. “Por enquanto, o que temos é uma reportagem de TV. Precisamos de casos concretos.”

Segundo ele, os depoimentos podem ser o único meio de comprovar as acusações, já que crimes como o de estupro não ocorrem à luz do dia e tampouco têm testemunhas. “Não há por que duvidarmos dos relatos das vítimas. É claro que não vamos encontrar vestígios do crime nem lesões.”

O órgão fez contato com Promotorias de outros estados para evitar que as vítimas tenham de se deslocar até Abadiânia. Na cidade goiana fica a Casa de Dom Inácio de Loyola, centro espírita onde João de Deus atende.

Segundo os promotores, podem ser tomadas medidas nas áreas cível e criminal. A investigação cível pode culminar na interdição do local utilizado por João de Deus para os atendimentos.

“Se for verificado que o local é voltado para a prática de crimes, a interdição pode ocorrer, mas para isso também é necessário que as vítimas nos procurem”, disse Meireles. “Enquanto não tivermos algo concreto, é difícil agir. Se entrarmos hoje com um pedido para interditar [a Casa de Dom Inácio de Loyola], será indeferido”, afirmou.

O Ministério Público de Goiás criou ainda um email específico para receber relatos desse caso ([email protected]). Ele é sigiloso, sendo acessado por apenas quatro integrantes da força-tarefa.
Além dos promotores, foram designados dois psicólogos para acompanhar as vítimas e, se for o caso, elas também poderão ter proteção.

João Teixeira de Faria, 76, já sofreu dois processos judiciais com conotação sexual. Um foi arquivado por falta de provas e no outro ele foi considerado inocente. Segundo a Promotoria, o processo arquivado poderá ser reaberto caso surjam novas provas relacionadas a ele.

Em junho, a Promotoria requisitou a instauração de inquérito policial para investigar uma acusação de abuso sexual contra o médium, mas não recebeu a conclusão da investigação.

A mobilização ocorre após reportagem do programa Conversa com Bial, da TV Globo, e do jornal O Globo mostrarem relatos de 13 mulheres. Um levantamento de casos envolvendo o médium está sendo feito na Promotoria local, inclusive para checar se há mais arquivados.

Pessoas que relataram ter sofrido violência sexual praticada por João de Deus procuraram a Promotoria em São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul.

Segundo o delegado-geral da Polícia Civil de Goiás, André Fernandes, somente no fim de semana houve 25 novos relatos. As vítimas começarão a ser ouvidas em Goiânia nesta semana.

Pelo que foi narrado até o momento, os promotores entendem que podem ser configurados três crimes: violação sexual mediante fraude, com pena de até seis anos; estupro, caracterizado por qualquer ato libidinoso, mediante violência ou grave ameaça, cuja pena é de até dez anos de prisão; e estupro de vulnerável, o mais grave, punido com até 15 anos de prisão.

A vulnerabilidade, afirma Meireles, é caracterizada quando os crimes são praticados contra menores de 14 anos e em situações em que as vítimas estão fragilizadas, como em caso de doença grave. Os dois últimos são hediondos.

As penas, em regra, são acumuláveis. Não haverá uma investigação para cada crime. Os casos deverão ser reunidos em um procedimento investigativo criminal. Muitos casos narrados são antigos, mas, segundo a Promotoria, o prazo para prescrição, dependendo da tipificação, é de 20 anos.

“Muitas vezes as vítimas precisam de um tempo para compreender o que aconteceu, falar a respeito, denunciar. Que elas se sintam encorajadas a denunciar. As vítimas que vivem na mesma cidade, sabendo da influência que ele exerce e de sua posição, talvez tenham mais dificuldade em ter coragem de denunciar. É importante que as vítimas se sintam seguras para relatar”, afirmou a promotora Patrícia Otoni.

OUTRO LADO

Em nota enviada ao Conversa com Bial, a assessoria de imprensa do médium afirmou o seguinte: "Há 44 anos, João de Deus atende milhares de pessoas em Abadiânia, praticando o bem por meio de tratamentos espirituais. Apesar de não ter sido informado dos detalhes da reportagem, ele rechaça veementemente qualquer prática imprópria em seus atendimentos".

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Ao jornal O Globo, a assessoria disse que as acusações são "falsas e fantasiosas" e questiona o motivo pelo qual as vítimas não procuraram as autoridades. Ainda afirma que a situação é "lamentável, uma vez que o Médium João é uma pessoa de índole ilibada".

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