A caipirinha custa R$ 12, a cerveja gelada é R$ 5 e a porção de camarão rosa, R$ 130. Tirar a foto em frente ao tríplex no Guarujá apontado como propriedade do ex-presidente Lula é de graça, mas neste verão é a imagem que tem valido ouro nos grupos de WhatsApp de amigos. Às vésperas do julgamento do petista no Tribunal Regional da 4ª Região (TRF-4), a faixa de areia em frente ao número 638 da Avenida General Monteiro de Barros, na Praia das Astúrias, anda monotemática. O futuro de Lula, que será decidido nesta quarta-feira em Porto Alegre, é o principal assunto debaixo dos guarda-sóis instalados diante do edifício Solaris, embora ninguém queria arriscar um resultado.
Com o celular em riste, turistas, entre uma ironia e outra sobre a propriedade do imóvel atribuído pela Lava-Jato a Lula, posam para selfies. Sorriem e apontam para o prédio. Verificam se a foto ficou boa e voltam a refazê-la até encontrar o ângulo perfeito, que enquadre bem os três últimos andares - prova de que realmente estiveram ali. "É o nosso tríplex, comprado com nossa contribuição", diz o comerciante Antônio Carlos Carvalho, de 54 anos, de Catanduva, no interior de São Paulo, que defende a condenação em segunda instância do petista.
Acompanhado do filho e de um amigo, ele caminhou 15 minutos debaixo do sol de 33 graus para "matar a curiosidade". "Vim fazer uma visita para o compadre, mas ele não está. Já mandei a foto no grupo dos amigos do bar". De Brasília, o advogado Sebastião Lucas, de 73 anos, está hospedado na casa de parentes em Itanhahém, a 87 quilômetros de distância do Guarujá, mas fez questão de ir em frente ao novo ponto turístico. "Para mim, isso é julgamento sem provas, sem crime e sem autoria. É julgamento político", defende o advogado.
Uma família com oito pessoas do Espírito Santo apareceu por lá em clima de clássico de futebol. Uns pediam a condenação, outros a absolvição. Todos foram unânimes em afirmar decepção com o padrão do empreendimento. "Eu esperava no mínimo um quarteirão inteiro. Pela repercussão, achei meio chinfrim. Eu achei outros prédios na orla bem mais bonitos", diz a comerciante Cenita Guerra, de 50 anos.
"O tríplex não é do Lula, é do povo brasileiro. Espero que a justiça seja feita", diz o militar Walacy Carvalho, marido de Cenita, que até sugere que o imóvel passe a ser aberto para visitação. Já o filho do casal, o estudante de Direito Gabriel Guerra é da turma que acha que não há provas. "Acho que todo mundo é inocente se não tem prova suficiente", declara.
Uma motorista diminuiu a velocidade para falar com o grupo que se reunia em frente ao edifício. "Querem se hospedar aí? Vocês podem! Esse tríplex é nosso", diz a mulher antes de arrancar com o carro que exibe no vidro traseiro a frase "Lava-Jato Eu Apoio".
O polêmico tríplex de 215 metros quadrados, no entanto, não está disponível para locação. Penhorado recentemente em uma ação contra a OAS Empreendimentos, o imóvel, que, segundo a denúncia do Ministério Público Federal, tem até elevador interno, estaria com condomínio atrasado. Quem quiser conhecer o Solaris por dentro tem de se contentar com apartamentos de 65 e 85 metros quadrados alguns de frente para o mar e outros não. Em um site de aluguel de temporada, uma diária varia de R$ 360 a R$ 716.
Dono de um dos apartamentos, um aposentado de São Bernardo do Campo pede para não ter o nome revelado, mas confessa estar irritado com a confusão. "Sempre votei no PT. Comprei imóvel na Bancoop, mas eu sou trabalhador. Esse apartamento é fruto de muito trabalho", diz o homem que anda temendo protestos mais radicais no edifício. "Já até ouvi gente incentivando sem teto a invadir, mas nós proprietários não temos nada com isso".
MORADORES EM SILÊNCIO
Das 72 unidades, apenas 13 são residências fixas. Todos as demais são imóveis de temporada. Nas reuniões de condomínio, a orientação é que nenhum proprietário fale com a imprensa. O antigo zelador José Afonso Pinheiro foi demitido após afirmar ter visto Lula e dona Marisa Letícia no local. O atual síndico, o oftalmologista Paulo de Távora, não quis comentar.
"Ninguém dentro do prédio fala do homem (Lula). Estamos muito tranquilos. As pessoas de fora é que ficam querendo saber", diz uma outra proprietária, que aluga o apartamento para temporadas. Para ambulantes que trabalham em frente ao Solaris diariamente, embates políticos por ali passaram a fazer parte da paisagem. Como estão ali para fazer negócio, seja para vender coco a R$ 7 ou uma porção de lula a R$ 80, evitam a polêmica e preferem concordar com todo mundo. "Rapaz, se Lula for condenado ou não, não importa. O cliente vai ter sempre razão", diz José Santos, de 50 anos.
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