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O sufoco de cada dia dos cadeirantes para pegar um ônibus

O sufoco de cada dia dos cadeirantes para pegar um ônibus

Problemas vão desde ônibus que não param a acesso aos pontos

Publicado em 18 de março de 2018 às 23:01

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O drama dos cadeirantes para pegar ônibus. (Bernardo Coutinho)

Andar de transporte coletivo não é tarefa fácil. Agora embarcar em um ônibus sendo cadeirante é uma tarefa ainda mais complicada na Grande Vitória. São diversos problemas que atrapalham, como dificuldade de acessar os pontos de ônibus, falta de abrigo para cadeirantes, ônibus que não param e até insatisfação de passageiros. Isso quando a plataforma de acesso não quebra.

Uma das pessoas que sofrem com a dura rotina é a artesã Neidimara Martins, de 50 anos. A GAZETA acompanhou um dos trajetos que ela faz, entre o Centro de Vila Velha, onde mora, até a Praia de Camburi, em Vitória. E não é nada fácil. Nesse dia nenhum equipamento deu problema, mas ela diz que isso já aconteceu várias vezes e não é tão incomum.

Um dos principais problemas é a falta de acessibilidade nas calçadas, já que o ponto fica um pouco depois da casa dela. O jeito é andar no meio da rua, dividindo espaço com os carros. Na volta é a mesma coisa. No ponto de ônibus ela também fica na rua, já que a escada do ponto tem acesso limitado. Um risco de atropelamento.

“Todo o meu trajeto em Vila Velha é pela rua. Não existe calçada em Vila Velha. Quando tem, existe um poste no meio ou um buraco. Faltam rampas nos pontos, já que muitos são inclinados”, reclama.

No percurso em que a reportagem acompanhou Neidimara, as portas dos coletivos pararam de funcionar por alguns instantes e ela relata que ouviu uma mulher dizer que “todos os dias tem um cadeirante para atrapalhar”. “Como se o problema da porta fosse culpa minha”, lamenta.

Ela também lembra que de vez em quando encontra motoristas e cobradores com má vontade ou que fingem não ver ela dando sinal no ponto de ônibus. Para a artesã, ainda há um longo caminho para se chegar à inclusão.

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Não adianta ter acessibilidade nos coletivos se o cadeirante não consegue chegar no ponto

Maristela Lugon, advogada
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“É direito nosso o ir e vir, assim como para os demais pedestres. Isso é assegurado por lei. Nós trabalhamos, estudamos, ficamos doentes, como todos”, pondera a passageira. 

LEGISLAÇÃO

A legislação federal mais recente que dá mais direitos aos cadeirantes é a Lei Brasileira de Inclusão, que entrou em vigor há dois anos. Em um dos artigos diz que “a pessoa com deficiência tem direito à igualdade de oportunidades como as demais pessoas e não sofrerá nenhuma espécie de discriminação”.

Para a presidente da Comissão Especial dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Ordem dos Advogados do Brasil no Estado (OAB-ES), Maristela Lugon, isso não é cumprido totalmente. Ela elenca outros problemas enfrentados pelos cadeirantes.

“Vitória é uma cidade com muitos morros. Quem mora em lugar íngreme não consegue descer até os pontos. As empresas dizem que tem mais de 80% acessível. Mas não adianta, se o cadeirante não chega no ponto”, acrescenta.

“PROBLEMAS PODEM OCORRER”

Algumas das reclamações dos usuários cadeirantes do sistema Transcol são em relação a elevadores que quebram nos coletivos. A diretora de operações da Companhia de Transportes Urbanos da Grande Vitória (Ceturb), Rosane Giubert, explica que problemas podem acontecer, mas normalmente estão relacionados a vários fatores.

“Existem situações? Existem. São equipamentos eletrônicos e pode acontecer dos ônibus saírem da garagem funcionando e quebrar no meio do caminho. Mas sempre pedimos que os motoristas e cobradores observem esse problema antes das viagens. Há também situações em que os ônibus quebram por causa do asfalto ruim”, justifica.

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Estou em prisão domiciliar sem cometer crime

José Olympio Barreto, presidente do Mova
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Segundo a diretora, entre o início do ano até agora já foram aplicadas 17 penalidades contra as empresas por problemas relatados por usuários nas plataformas que elevam os cadeirantes até o interior dos ônibus. “Mas é um número muito pequeno em relação à frota. Foram 825 mil viagens durante esses primeiros meses do ano”, completa.

Rosane também garantiu que a fiscalização acontece para evitar que motoristas e cobradores deixem cadeirantes nos pontos. Denúncias podem ser feitas no 0800-039-1517.

O Sindicato das Empresas de Transporte Metropolitana da Grande Vitória (GVBus) respondeu, em nota, sobre os problemas enfrentados pelos cadeirantes dizendo que apenas três coletivos de toda a frota de 1.591 veículos não têm elevadores – sendo que os que não têm estão na reserva.

O órgão também garantiu que os problemas são resolvidos imediatamente após a reclamação do usuário. Sobre treinamentos, o sindicato disse que treina os profissionais para oferecer um bom atendimento aos cadeirantes, com treinamentos internos e cursos específicos.

PREFEITURAS

Todas as prefeituras da Grande Vitória disseram que as calçadas, que dão acessos aos pontos de ônibus, são de responsabilidade dos proprietários das residências e imóveis comerciais, que são sempre notificados a se adequarem ao padrão. Em Vila Velha, por exemplo, a multa pode chegar a R$ 9,2 mil caso isso não aconteça.

Na Serra e em Vitória, as prefeituras afirmaram que os pontos de ônibus são feitos pensando em um espaço nos abrigos para os cadeirantes. Em Vitória, a secretária de Desenvolvimento Urbano, Lenise Loureiro, ponderou que os novos empreendimentos e novos pontos comerciais já devem contar com calçadas padronizadas.

“Sempre notificamos para que os proprietários se adequem. Novas lojas também precisam começar a funcionar com a calçada regular”, completa. Em Cariacica, a prefeitura ressaltou que vale o mesmo.

OUTROS OBSTÁCULOS ATRAPALHAM CADEIRANTES

Além da dificuldades com ônibus, vários outros problemas atrapalham quem é cadeirante na Grande Vitória. Entre eles está o difícil acesso para quem mora em locais como morros, tanto para pegar coletivos quando para se locomover pelos bairros.

O presidente do Movimento Organizado de Valorização da Acessibilidade (MOVA), José Olympio Rangel, é cadeirante e mora em uma ladeira no bairro Fradinhos, em Vitória. Sair de casa só com o serviço especial para cadeirantes da Capital, o Porta a Porta.

“Fico impedido de sair de casa sem cometer nenhum crime. É uma prisão domiciliar”, declara.

Segundo ele, que acompanha as reclamações dos cadeirantes, os problemas no Porta a Porta e no Mão na Roda, que é o serviço do Transcol, são frequentes. No caso do sistema metropolitano hoje são 3,3 mil usuários cadastrados, segundo o GVBus, mas só 25 carros disponíveis.

No caso de Vitória, a prefeitura diz que vai disponibilizar mais oito carros até o final do mês. Hoje são cinco disponíveis apenas.

Segundo o secretário de Transportes e Infraestrutura Urbana da Capital, Tyago Hoffman, a medida vai acabar com a fila de espera, de cerca de 270 cadeirantes atualmente.

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Outros obstáculos nas ruas também fazem parte da vida dos cadeirantes, como buracos, árvores, postes de energia, lixo jogado na calçada, carro estacionado na calçada.

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