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Trinta vítimas de balas perdidas em apenas 4 meses no Espírito Santo

Trinta vítimas de balas perdidas em apenas 4 meses no Espírito Santo

Inocentes são feridos ou mortos por estarem no fogo cruzado

Publicado em 6 de maio de 2018 às 23:32

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"Ela queria concluir o curso de designer gráfico e começar o curso de manicure. Ela só queria trabalhar e dar um futuro melhor para o filho dela", afirmou a mãe de Karolaine. (Fernando Madeira )

Karolaine queria terminar o ensino médio e concluir as aulas de design gráfico. Encantada com a área de estética, já planejava o próximo curso: o de manicure. Sonhava em ter uma profissão para dar uma vida melhor ao filho, de apenas 1 mês. Sonhava. Todos os planos chegaram ao fim no dia em que a jovem, de apenas 18 anos, ficou no caminho de uma bala perdida. Atingida por um tiro na cabeça, ela não pôde mais sonhar.

A estudante Karolaine do Rosário Matos foi vítima de bala perdida durante um confronto entre policiais militares e criminosos no bairro Porto Novo, em Cariacica, no dia 3 de abril. A jovem, que havia acabado de ser mãe, observava da porta de casa um protesto que acontecia em uma rua de baixo, quando o confronto começou. Ela estava a cerca de 300 metros do tiroteio quando foi baleada. Chegou a ser socorrida, mas não resistiu.

Karolaine faz parte da triste estatística de vítimas de bala perdida na Grande Vitória. Seja em confronto entre traficantes rivais ou com a polícia, inocentes perdem sonhos e vidas no meio do fogo cruzado.

Karolaine do Rosário Matos morreu após ser atingida por bala perdida. (Facebook)

“A gente vê esse tipo de tragédia pela TV, mas nunca imagina que vai acontecer com a gente. Minha filha estava longe da confusão, mas a bala foi na cabeça. Estava na hora errada e no lugar errado”, lamentou a mãe de Karol, Luciene da Silva do Rosário de Jesus, de 34.

Embora fontes oficiais não divulguem o número de baleados, incluindo feridos, a reportagem contou 30 casos de pessoas atingidas por balas perdidas noticiados pela imprensa de janeiro a abril deste ano. A Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social (Sesp), porém, registra os casos de morte por bala perdida. A Sesp informou que, em 2017, foram cinco casos e, neste ano, até abril, consta no registro da secretaria um caso de assassinato por bala perdida.

Dos 30 casos publicados pelos veículos da Rede Gazeta, a maioria aconteceu em Vila Velha. Foram 12 baleados e uma morte em quatro meses no município, sendo um baleado em Jardim Marilândia, uma mulher e um adolescente em Divino Espírito Santo, três baleados em Ataíde, um em Santa Rita e dois em Cobi de Baixo. Em Ilha dos Aires quatro pessoas foram baleadas, entre elas um menino de 13 ano que não resistiu e morreu.

O segundo município com mais registros de bala perdida foi Cariacica: oito baleados e a morte da estudante Karolaine, em Porto Novo. Três foram vítimas em Flexal 2, uma menina de 8 anos atingida em Padre Gabriel, um menor em Nova Rosa da Penha I, uma menina em Novo Horizonte, um jovem em Alzira Ramos e um menor de 14 anos em Castelo Branco.

Na Serra a reportagem noticiou cinco baleados: duas mulheres e dois homens em um bloco de carnaval de Manguinhos, além de um morador de Central Carapina, atingido com um tiro no peito ao olhar pela janela a troca de tiros entre criminosos.

Em Vitória foi noticiado um estudante baleado em Ilha de Monte Belo, durante um confronto entre um assaltante e um atirador não identificado.

MAIS CASOS

Terror na Serra

Um jovem de 24 anos foi assassinado a tiros e outras quatro pessoas foram atingidas por balas perdidas, em 11 de fevereiro, em Manguinhos.

Tiros após festa

Dois jovens foram vítimas de bala perdida nas proximidades de um baile funk conhecido, em Santa Rita, no dia 29 de abril.

Disparo na cabeça

Um jovem de 19 anos foi baleado na cabeça, na madrugada do dia 24, quando saía do baile do Mandela, em Alzira Ramos, em Cariacica.

Atingida na rua

Uma menina de apenas 8 anos foi baleada na perna enquanto brincava no bairro Padre Gabriel, em Cariacica, no dia 10 de fevereiro.

MINIENTREVISTA

Com constantes lágrimas nos olhos, a doméstica Luciene da Silva do Rosário de Jesus, 34, conversou coma reportagem sobre a filha, a estudante Karolaine do Rosário Matos, 18, morta por bala perdida durante um confronto entre PMs e criminosos.

Como foi o dia, antes da morte?

Pela manhã, antes de sair para trabalhar, dei um beijo nela e no neném. Quando voltei do trabalho a gente falou sobre as coisas que estavam acontecendo no bairro, a manifestação, os confrontos... Ela tomou banho, colocou o pijama e foi na rua olhar a movimentação. Me disse que já ia para casa. Mas não voltou.

Como aconteceu?

Ouvi a movimentação, corri pra fora e quando a vi, entrei em desespero. Corri pra pegar os documentos dela, mas quando voltei, ela já tinha sido socorrida. Depois disso eu não consegui mais sair do bairro por causa dos confrontos. Fui ao hospital de manhã.

Como tem sido a vida?

É difícil voltar a rotina. Não é fácil chegar em casa e não vê-la, tem um vazio. Ela era um pedaço de mim. Foi difícil também para o bebê porque ele ainda mamava no peito. Estamos tentando seguir.

MINIENTREVISTA II 

Se há quem carregue o trauma de ser atingido por uma bala perdida, há aqueles que já foram alvos de dois disparos. Foi o que aconteceu com uma doméstica, de 56 anos. Ela colhia abacates em uma árvore no quintal de casa, em Flexal 2, Cariacica, quando levou um tiro em cada perna e caiu da árvore.

Como aconteceu?

Era umas 16 horas, eu estava tirando abacates do pé quando começou o tiroteio. Não tive tempo de correr. Era a polícia contra os bandidos. Caí da árvore e meus vizinhos que me ajudaram .

Como é viver nessa situação?

É triste. Eu não desejo para ninguém, nem para um inimigo. Tomar um tiro dói e queima demais. Nunca pensei passar por isso, ainda mais em duas pernas. Eu agradeço a Deus e aos meus vizinhos.

Ficou o medo?

Sim. Eu fico assustada quando escuto um barulho. Vou para meu quarto e fico no cantinho pedindo ajuda a Deus. Peço para ele acalmar quem atira.

Pensa em se mudar?

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A casa aqui é minha, foi minha mãe que me deu. E todos os lugares estão violentos. Não adianta fugir.

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