> >
Rodovia Serafim Derenzi,em Vitória: o caminho da fé

Rodovia Serafim Derenzi,em Vitória: o caminho da fé

Em 10 km, rodovia abriga 49 igrejas de várias denominações

Publicado em 9 de junho de 2018 às 22:08

Ícone - Tempo de Leitura 0min de leitura
Daniel Abreu, do grupo de louvor, comanda cântico na primeira Assembleia de Deus de São Pedro. (Ricardo Medeiros)

Domingo, dia de celebração para diversas religiões cristãs. O início da noite na Rodovia Serafim Derenzi, a maior via de Vitória, que tem 10 quilômetros de extensão, começa com a peregrinação dos fiéis nas calçadas: homens, mulheres, crianças, jovens e idosos, muitos carregando a Bíblia enquanto se dirigem para as 49 igrejas localizadas pelo “caminho da fé”.

A Serafim Derenzi corta 15 bairros a oeste da ilha de Vitória, onde moram mais de 69 mil pessoas. E existem pelo menos cinco igrejas a cada quilômetro. A aposentada Laide Baudson, de 81 anos, é uma das que participam da peregrinação de fiéis na via há décadas. Ela frequenta a primeira Assembleia de Deus instalada em São Pedro, na rodovia, desde o início da década de 80, quando se mudou para a região e lá ainda havia um grande lixão. Evangélica desde menina e vinda de Ecoporanga, com o marido e 10 filhos, ela sempre se apegou à fé. Chegando na Capital, logo se apressou em encontrar uma igreja para frequentar.

"Meu cunhado comprou um pedaço do mangue e construímos um barraquinho para morar. E desde quando me mudei vou nessa igreja. Só saio quando ela fechar", disse.

VEJA VÍDEO

HISTÓRIA

A história da fé que margeia a Serafim Derenzi tem início com a chegada de migrantes à Capital, vindos do interior do Espírito Santo, de Minas Gerais e do Sul da Bahia. O jornalista Amylton de Almeida escreveu no livro "Lugar de Toda Pobreza" sobre a formação de São Pedro, primeiro bairro da região: "Na escolha dos terrenos, a primeira coisa que decidiram em conjunto foi a localização de suas igrejas: católica e protestante, e (do terreiro de) umbanda".

O pastor da igreja frequentada por dona Laide, a primeira Assembleia de Deus de São Pedro, Benhur Castelo, diz que a história dos templos faz parte do desenvolvimento do bairro. "Geralmente os locais escolhidos para montar uma igreja eram terrenos doados por moradores", relata Benhur.

VEJA VÍDEO

SOM

De segunda a sexta-feira, os templos ficam fechados a maior parte do tempo. Já no domingo, é comum os cultos e encontros começarem a partir das 19 horas, sempre cheios de fiéis. E, além do barulho dos automóveis, a rodovia ganha o som dos cânticos, orações, e pregações de líderes religiosos. Em alguns pontos da via, eles são tão próximos que é possível ouvir os louvores de uma igreja de dentro de outra.

A maioria são pentecostais, de crenças em curas, milagres, profecias e revelações, com destaque para atuação das Assembleias de Deus: são 19 na rodovia. Além delas, há muitas neopentecostais, como a Igreja Universal do Reino de Deus e a Mundial do Poder de Deus, em que há também "sincretismo religioso", explica a professora de estudos das religiões Claudete Beise Ulrich.

Igrejas evangélicas tradicionais também marcam presença na Serafim, como a Batista e Adventista, que enfatizam estudos teológicos e interpretação rígida da doutrina. E, em menor número, há as Católicas: a Paróquia de São Pedro Apóstolo e o Santuário-Basílica de Santo Antônio.

LOCALIZAÇÃO E VISIBILIDADE DA RODOVIA ATRAEM TEMPLOS E FIÉIS

A grande quantidade de igrejas na Rodovia Serafim Derenzi, em Vitória, é explicada principalmente pela boa localização, com facilidade de acesso e visibilidade. Muitas pessoas e veículos transitam na via, que serve de passagem para 15 bairros, todos os dias. Porém, é marcante o número de templos evangélicos: de 49, eles são 47. Isso mostra que um outro fator que fez a diferença na região foi o crescimento das igrejas dessas denominações nas últimas décadas no Estado.

Igrejas na Serafim Derenzi: localização chama a atenção de novos fiéis. (Mracelo Prest)

Para o doutor em Ciências da Religião Edebrande Cavalieri, a escolha do local é estratégica para conquistar novos fiéis. “Cada igreja quer um lugar que seja mais visível possível. Elas não fazem propagandas na televisão para atrair gente. Então, a localização é importante para se tornar conhecida pelas pessoas”, explica Edebrande, que é professor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).

Marcus Ueslei de Souza é apóstolo da Igreja Casa de Oração do Avivamento, que fica na rodovia, em Nova Palestina. Ele afirma que, além da visibilidade, a localização ajuda no trânsito dos fiéis até o templo, que começou com 60 pessoas, cresceu, e teve que mudar de dentro do bairro. Hoje, os cultos têm cerca de 800 frequentadores.

"As ruas são apertadas dentro do bairro. Na medida em que foi aumentando o número de membros, começamos a ter um fluxo muito grande de pessoas e problema de trânsito. Então, precisamos ir para principal, a Serafim Derenzi", argumenta Marcus.

A maioria dos templos na rodovia, que corta 15 bairros, é de denominações evangélicas . (Marcelo Prest)

FORTALECIMENTO

O último dado do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é de é de 2011 e revela a força que os evangélicos já vinham ganhando por aqui: o Espírito Santo é o lugar do país com o maior número de fiéis, mais de 1 milhão de pessoas.

Nessa onda, Edebrande destaca que as igrejas pentecostais e neopentecostais se fortaleceram na região da Serafim Derenzi a partir do início dos anos 90. Enquanto isso, a Igreja Católica, que no passado foi muito atuante com as comunidades eclesiais de base, se distanciou da periferia, como a região oeste de Vitória.

O que marca essa história de fé também é o passado de luta e pobreza dos primeiros ocupantes do local, que chegaram a Vitória sem emprego, na época de industrialização da cidade, nas décadas de 70 e 80.

“É nas camadas menos favorecidas, pelos indicadores do próprio IBGE, que notoriamente as igrejas pentecostais e neopentecostais têm penetrado mais. Porque atendem diretamente a situação de pobreza, de falta de saúde e desemprego”, explicou o doutor em Ciências da Religião.

O pastor da Igreja do Evangelho Quadrangular Carlos Alberto Dias confirma as mudanças, mas pontua também a necessidade que os indivíduos têm em seguir uma religião. “São Pedro mudou muito. Invasão pobreza e lixão ficaram no passado. As pessoas buscaram Deus e por isso foram abertas outras denominações. Faz parte do ser humano buscar algo, que não está em pessoas e em bens, e sim no espiritual”, disse.

VEJA VÍDEO

Este vídeo pode te interessar

 

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta

A Gazeta integra o

The Trust Project
Saiba mais