Aos 88 anos, a memória às vezes falha, o andar pode ser um pouco mais lento, porém as mãos continuam firmes, e ao mesmo tempo carregam delicadeza na hora de moldar panelas de barro. É nesse momento de ofício que reside a grande alegria de Maria Conceição Gomes Barbosa, uma das paneleiras mais antigas de Vitória e na ativa! , primeira personagem a dividir um pouco de sua história nesta série de reportagens que, aos domingos, vai celebrar a autoestima do povo espírito-santense.
Dona Conceição, como é carinhosamente chamada, diz que reinventou sua vida a partir do barro. Isso porque, até por volta dos 40 anos, ela trabalhava em casa, na região de Goiabeiras, costurando e fazendo bordados. Mas, embora fizesse tudo com capricho e não lhe faltasse encomendas, costumavam faltar bons pagadores.
Para ajudar no sustento da casa de 13 filhos, decidiu seguir as dicas da sogra para fazer panelas. Eu disse: Me arranja uma bolinha de barro para eu fazer panela. Mas ela respondeu: O que é isso, menina? Você tem um trabalho tão bonito, tudo o que você faz é maravilhoso. Faço eu panela porque não sei fazer outra coisa. Mas eu queria aprender. Só que ela não me deu a bolinha, não quis que eu aprendesse.
Determinada, dona Conceição aproveitou que um dos filhos costumava acompanhar outra paneleira até o barreiro de onde é retirada a matéria-prima das panelas e pediu que o menino levasse para casa um pouco de barro. Assim, de pequenas remessas, ela foi, sozinha, aprendendo a moldar as panelas.
Naquela época, com as panelas prontas, os filhos se revezavam para levá-las para vender. Eles vendiam lá na Vila Rubim, no Morro da Fonte Grande, em Jucutuquara. Eles andavam por tudo quanto é lugar com aquelas panelas.
Dona Conceição recorda que, de um início difícil, passou por um período mais próspero, inclusive com alguns dos filhos também fazendo e sustentando as famílias com as panelas.
Ao longo das últimas décadas, enquanto ela construía sua trajetória e moldava o barro, A GAZETA também ajudou a dar visibilidade a uma das atividades que mais simbolizam o Espírito Santo.
Mesmo sendo hoje a paneleira mais idosa na ativa, dona Conceição confidencia que, se a deixassem, iria até no barreiro tirar o material: Venho mexer com o barro, abro umas cinco ou seis panelas e deixo aí. Vou para casa, faço o almoço e volto para pregar as orelhinhas (as alças). Depois, faço as tampas. Se eu for ao barreiro, ainda dou umas enxadadas e jogo o barro para cima, diz, alegre.
Questionada sobre qual outro capixaba ela acha que as pessoas também deveriam conhecer melhor e se orgulhar, dona Conceição indicou Cacau Monjardim. Conheça mais sobre ele.
QUEM É CACAU MONJARDIM?
Jornalista e escritor, José Carlos Monjardim Cavalcanti é o autor da célebre frase Moqueca, só capixaba, o resto é peixada, criada em 1974 quando estava na Bahia a trabalho. Ele é ainda um ferrenho defensor das panelas de barro de Goiabeiras e costumava comprar as suas com a família de dona Conceição.
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