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Joãozinho de Deus: um anjo que virou patrimônio de Colatina

Joãozinho de Deus: um anjo que virou patrimônio de Colatina

Andar com fé é com ele mesmo, dizem moradores sobre o peregrino que não perde uma missa na catedral da cidade. A cada dia da semana, uma família o acolhe para as refeições. E as visitas, garantem, são sempre abençoadas #somoscapixabas

Publicado em 11 de julho de 2018 às 21:47

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Até onde se sabe, o nome dele é José Pelegrino. Mas a cidade inteira o conhece apenas como Joãozinho de Deus, figura considerada um verdadeiro patrimônio vivo de Colatina, no Noroeste do Espírito Santo. Hoje com 84 anos, ele próprio conta que veio do Sul do Estado, mas ninguém sabe ao certo como ou mesmo quando foi parar nas terras colatinenses.

Querido pela grande maioria da cidade, Joãozinho não possui familiares vivos e atualmente mora em um asilo. Há quem afirme que ele possui alguma deficiência mental, mas não existe nenhum laudo que comprove isso. Outros chegam a dizer que apenas é um louco, mas quem conhece de verdade é enfático ao garantir o quão dócil e simpático é João.

Professora aposentada, Carmen Lucia de Paiva Schiffler, 67 anos, é uma das amigas que ajudam a cuidar de Joãozinho e lembra que, desde que era menina, já o via andando pela cidade, sempre sozinho, sem nenhum familiar por perto. Ele morou por muitos anos na rua e chegou a ser acolhido por um casal da igreja por alguns anos. Sua vida hoje é andar pela região central da cidade, visitar os amigos, e, sobretudo ir à igreja. Em todas as missas na Catedral de Colatina ele está presente.

Joãozinho de Deus recebe a benção na Catedral de Colatina. Católico fervoroso, ele vai à missa todos os dias. (Catedral de Colatina/Divulgação)

Na catedral, é unanimidade: os católicos afirmam que Joãozinho possui uma alma de criança, ou mesmo de um anjo. Dona Carmen vai além, pois acredita que ele é um enviado dos céus para zelar pelos colatinenses. Até conta que já recebeu uma graça após o clamor do bom homem.

“Há cinco anos, eu tive uma convulsão e fiquei em coma, entre a vida e morte. Quando eu voltei para  casa, não conseguia dormir de forma alguma, mas eu precisava do repouso para me recuperar. Até que um dia o Seu Joãozinho chegou à minha casa, me chamou na janela, que é onde ele gosta de rezar, e disse do jeito dele para Deus sarar a Carmen Lucia para que ela pudesse dormir e descansar. Daquele dia em diante meu sono voltou”, afirma.

Para ela, a bênção foi fruto do clamor do andarilho. “Só pode ter sido obra dele, porque ele é uma alma pura. Ele não sabe fazer mal a ninguém, é carinhoso. É um ser humano tão fantástico que não parece ser desse mundo”.

ANDANÇAS

Além de ir às missas, a outra atividade preferida de Joãozinho é andar pela cidade. E sempre com seus pertences em mão: um pequeno porrete, um chapéu branco e algumas sacolas, onde leva entre outras coisas sua própria almofada para sentar. “Ele não para quieto em lugar nenhum. Não sei como gosta e consegue andar tanto”, pondera Carmen.

Pelo jeito dócil e simples, ao chegar ao asilo há cerca de dois anos, ele logo conquistou o coração e a confiança da assistente social responsável, que passou a liberá-lo para sair e andar. “Deram-lhe uma chave da entrada que ele pode sair e entrar na hora que ele quiser, aí ele aproveita”, explica a professora aposentada.

Aspas de citação

Quando o sino bate, não tem ninguém que o segure de ir para a igreja. Ele não sabe rezar nem ler, mas tem uma fé fantástica. Fala diretamente com Deus. Comunga como todo mundo e é muito querido

Carmen Lucia de Paiva Schiffler, professora aposentada
Aspas de citação

Com a liberdade, as andanças já são quase que programadas. Além de ir à igreja, todos os dias, religiosamente, ele sai do asilo no meio da manhã e vai à casa de alguma família amiga. Na residência de Carmen Lucia é as sextas-feiras, e ela já deixa claro que recebê-lo é a prioridade do dia.

 

“Às vezes a gente pensa que ele não vai se lembrar, mas ele parece ter uma agenda mentalizada e sabe certinho o que de ir à casa de quem. Nas sextas, ele chega por volta de 10h30 e pede café da manhã. E eu paro tudo para lhe dar atenção. Quando dá umas 11h15, já sirvo o almoço porque, como tem missa meio dia, ele já sai correndo para ir.”

Como anda pelas ruas sem a devida atenção ou mesmo atravessando nas faixas, Joãozinho de Deus sofreu dois atropelamentos recentes em Colatina. De acordo com Carmen, nos dois casos foram acidentes envolvendo moto, mas ele logo se recuperou.

“Não teve nada muito sério, mas o problema é que com isso o proibiram de sair do asilo para caminhar. Eu fui lá saber e me explicaram que era para a própria segurança dele. Com o tempo, deixaram que voltasse a sair e todo mundo ajuda a vigiá-lo pela rua”, lembra.

TRATAMENTO

Pela cidade ou mesmo na igreja, ele é sempre carinhoso com as pessoas, sobretudo com as mulheres, a quem Joãozinho sempre cumprimenta beijando-lhes a mão. Já os homens, a saudação é um aperto de mãos.

Dona Carmen comenta que, quando ganha balas ou pirulitos, João sempre gosta de repartir com as crianças à sua volta. Aliás, ele se sente como uma. “Ele não gosta que o chamem de velho. Considera-se mais uma criança. Nem admite que mora no asilo, diz que é uma creche."

Pelas ruas, quase todos o cumprimentam. Porém, há quem não tenha o mesmo carinho, segundo Carmen, e o trate mal em razão da desconfiança ou mesmo do desconhecimento. “Corta o coração ver. Eu sempre brigo. Porque ele é uma pessoa tão boa e indefesa, que chega a ser uma covardia. Fora que é de idade e merece respeito”, salienta.

 Nos gostos pessoais, uma curiosidade: roupa, só camisetas e bermudas. Come de tudo, mas em especial ama chocolate. E adora o vermelho, sua cor predileta. “É um ser humano que parece ser como outro qualquer, mas tem uma alma fantástica. Todos conhecem, mas quem é mais próximo sabe de verdade o quão bom que ele é. Um ser realmente enviado de Deus.”

Conhece o Joãozinho de Deus ou se lembra de alguma história sobre ele? Envie o seu relato para [email protected] #somoscapixabas

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