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Em quais situações um juiz pode se negar a julgar um caso?

Em quais situações um juiz pode se negar a julgar um caso?

Professor de Direito explica os motivos que podem impedir um juiz de julgar um determinado caso. Oito juízes de Viana se negaram a julgar caso Dondoni

Publicado em 16 de agosto de 2018 às 16:42

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O caso de Dondoni agora segue para análise do Tribunal de Justiça do Espírito Santo. (Gabriel Lordêllo/Arquivo A Gazeta)

Todos os juízes de Viana, criminais e cíveis, se declararam suspeitos ou impedidos de julgar o empresário Wagner José Dondoni de Oliveira, que matou uma família em um acidente de trânsito há dez anos. Na última semana, os oito juízes declararam, dia após dia, as suas suspeições. O caso agora segue para análise do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), que terá que designar um magistrado para realizar o Júri Popular. Mas, afinal, em quais situações um juiz pode se negar a julgar um determinado caso?

Para responder a essa pergunta, a reportagem do Gazeta Online conversou com o professor da Faculdade de Direito de Vitória (FDV), Gustavo Senna Miranda. Os motivos que podem levar um juiz a se negar a defender um caso estão estabelecidos nos artigos 252 e 354 do Código Processo Penal e vão desde a participação de parentes do juiz no caso a ser julgado até razões pessoais, de "foro íntimo", que também são aceitas por lei.

Situações que levam ao impedimento do juiz

1 - Participação de parentes no caso: "Se o cônjuge ou parente até 3º grau do juiz tiver relação direta com o processo. Se um parente do juiz for defensor, advogado, órgão do Ministério Público, autoridade policial, auxiliar da justiça, perito ou mesmo escrivão no caso, o juiz então não pode julgar o caso", explica o professor.

No caso Dondoni, o primeiro juiz, chamado de natural da Primeira Vara Criminal de Viana, se declarou por impedido em função de um parente dele, de primeiro grau, já ter atuado no processo, o que o impede de realizar o julgamento. 

2 - Juiz presente anteriormente no caso: "Se o caso, por exemplo, demorou para ser julgado, e o juiz em questão já foi advogado de uma das partes (antes de passar no concurso para juiz), ele não pode julgar tal caso".

3 - Uma das partes no processo é parente do juiz: "Quando a parte (réu) ou a parte diretamente interessada (vítima) é parente de até 3º grau do juiz, ele também é impedido de julgar o caso".

Motivos de suspeição do juiz

1 - Juiz amigo ou inimigo de uma das partes: "No caso de suspeição, as questões são um pouco diferentes. Se o juiz for amigo íntimo ou inimigo capital de uma das partes, ele não tem isenção para julgar o caso", explica Miranda.

2 - Parente responde na Justiça por caso parecido: "Se o juiz, o cônjuge ou um parente de até 3º estiver respondendo a processo por um fato parecido (nesse caso, um acidente de trânsito) fica uma situação controvérsia, o juiz não tem condições de julgar com isenção".

3 - Se aconselhou uma das partes: "Se em algum momento, antes de ser chamado para julgar o caso, o juiz aconselhou uma das partes envolvidas no processo (um advogado ou familiar de uma das parte, por exemplo), também não pode esse julgar tal causa".

4 - Dívida com uma das partes ou sociedade interessada no processo: "Se o juiz é credor ou vendedor, tutor ou curador de qualquer das parte, tem dívida com a parte a ser julgada, ou se for sócio, acionista ou administrador de sociedade interessada no processo não pode julgar o caso".

5 - Foro íntimo: "Admite-se colocar a suspeição por foro íntimo. Se o juiz, por qualquer motivo, se sentir impedido de presidir o processo ele pode alegar suspeição de foro íntimo para se afastar. Existe essa possibilidade. Nesse caso, não vale questionar. É uma questão da própria consciência do julgador, que a lei permite que isso seja possível", esclarece o professor de direito.

A alegação de "suspeição por motivo de foro íntimo" foi utilizada por sete dos oito juízes de Viana que se declararam impedidos de julgar o caso Dondoni.

 ENTENDA

Ronaldo, único sobrevivente do Fiat Uno, durante velório dos filhos. (Nestor Müller | Arquivo | A Gazeta)

O acidente

A caminhonete S10 guiada por Wagner Dondoni e o Fiat Uno dirigido por Ronaldo Andrade colidiram por volta das 7 horas do dia 20 de abril de 2008, no km 304 da BR 101, próximo ao posto Flecha, em Viana.

As vítimas

A família de Ronaldo seguia para Guaçuí, no Sul do Estado. Seu filho, Rafael Scalfone Andrade, de 13 anos, morreu no local. O caçula, Ronald, 3 anos, morreu horas depois. A mulher do cabeleireiro, Maria Sueli Costa Miranda, 29, ainda ficou internada por três dias, mas não resistiu aos ferimentos.

Reprodução da foto da esposa e dos filhos de Ronaldo Andrade, que os perdeu em um acidente na BR 101, provocado por um motorista embriagado. (Arquivo A Gazeta)

Embriaguez

A embriaguez do empresário foi comprovada por meio de um exame feito com a coleta de sangue: o resultado foi 6,7 decigramas de álcool por litro de sangue. O teste foi realizado 10 horas após a colisão. Na hora do acidente, esse índice deveria ser ainda maior, já que estudos mostram que o corpo humano começa a eliminar o álcool depois de seis horas do consumo.

A prisão

Dondoni foi detido após o acidente e foi levado para o DPJ de Cariacica, mas foi liberado após pagar fiança de R$ 2,1 mil.

Liberdade

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Em setembro de 2008, Dondoni saiu da cadeia. Meses depois, sem carteira de motorista, tentou retirar uma nova habilitação, em Minas Gerais, mas foi descoberto.

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