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Vice-presidente do CRM é investigado por conceder diplomas irregulares

Vice-presidente do CRM é investigado por conceder diplomas irregulares

Médico Aloízio Faria de Souza é sócio de instituto de especialização denunciado

Publicado em 2 de agosto de 2018 às 00:41

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Instituto BWS, de São Paulo, é acusado de fornecer diplomas com mais horas do que as realmente cursadas. (Bws/divulgação)

Um título de especialista em Dermatologia foi concedido de forma irregular pelo Conselho Regional de Medicina do Espírito Santo (CRM-ES). O médico que recebeu a titulação – que já foi cancelada – é sócio do atual vice-presidente da instituição. Os dois possuem uma empresa que está sendo investigada por concessão de diplomas com irregularidades.

As informações vieram à tona após a divulgação de uma reportagem pela Rádio CBN de São Paulo, que aponta que duas instituições paulistas – Instituto BWS e o Instituto Superior de Medicina (ISMD) – fornecem diplomas com horas infladas. Elas são maiores do que as efetivamente cursadas pelo alunos. As denúncias foram encaminhadas para a Polícia Federal, Conselho Federal de Medicina e Sociedade Brasileira de Dermatologia.

Dentre os sócios do Instituto BWS está o médico Aloízio Faria de Souza, atual vice-presidente do CRM-ES. Na época em que foi presidente do conselho, entre os anos de 2008 e 2013, ele registrou o título de especialista em Dermatologia do seu sócio, o médico paulista Valcinir Bedin.

Ocorre que esta titulação, cujo processo foi iniciado em 2011, foi considerada irregular pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). Após a realização de um procedimento administrativo a instituição decidiu pelo cancelamento da titulação de Bedin.

O fato foi confirmado em ofício interno do CRM-ES, a que A GAZETA teve acesso, enviado para o Conselho Federal em abril deste ano. No documento é dito: “O registro de qualificação de especialista em Dermatologia concedido ao Dr. Valcinir Bedin, em gestão anterior, após decisão desse Conselho Federal de Medicina, foi devidamente cancelado”, diz o texto assinado pelo atual presidente do conselho capixaba, Carlos Magno Pretti Dalapícola.

Ele explicou que uma Resolução do CFM, de abril de 1989, estabeleceu as regras para a concessão do título de especialização. A partir desta data é necessário ser feito residência médica em curso credenciado pelo MEC ou uma prova em uma sociedade de especialização, como por exemplo a Sociedade Brasileira de Dermatologia. Após a conclusão, o médico faz o registro de sua especialização.

Antes de 1989, bastava reunir documentos que comprovassem a atuação na área, como declarações de concurso público, registros de prontuários, currículo, dentro entre outros documentos. “Era a situação de Bedin, que apresentou os documentos comprovando atuação na área. Eles foram analisados e feito o registro da especialidade dele. Mas ele foi questionado pelo CFM, que fez outra análise”, relatou Dalapícola.

O fato foi comunicado ao CRM-ES que enviou os documentos para a Comissão de Título de Especialistas. “Em nova análise, o título foi mantido, com base nos documentos constantes no processo”, explicou Dalapícola, acrescentando que novamente o CFM entendeu que os documentos não eram suficientes e determinou o cancelamento do registro.

De acordo Dalapícola, este vai e vem entre os conselhos federal e regional é natural. “O CFM é uma instância de recursos e pode mudar as decisões do regional. Não é algo incomum o que aconteceu”, disse.

Valcinir Bedin teve o registro de especialista feito pelo vice-presidente do CRM-ES, Aloízio Faria de Souza (à direita). (Reprodução YouTube/Canal BWS | Vitor Jubini/Arquivo)

OUTRO

Além de Bedin e Aloízio, o BWS também tem como sócio outro médico, Wilmar Jorge Accursio. Os três figuram como sócios-administradores, segundo o Cadastro Nacional da pessoa Jurídica, e respondem pelo instituto.

A instituição nega a venda de cursos com menos horas do que o previsto nos diplomas, conforme as denúncias.

MÉDICO DIZ QUE CURSOS CUMPREM CARGA HORÁRIA

O atual vice-presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado (CRM-ES), Aloízio Faria de Souza, afirma que a denúncia contra o Instituto BWS, de São Paulo, sobre a concessão de diplomas de pós-graduação com irregularidade, não procede. Ele é sócio da instituição.

Aloízio diz que todos os cursos de graduação e pós-graduação oferecidos cumprem as exigências do Ministério da Educação (MEC). E que o curso de pós-graduação em dermatologia, apresenta carga horária de 2.980 horas entre atividades práticas e teóricas e no mínimo dois anos de duração, acima das 360 horas mínimas exigidas pelo MEC e das 2.800 horas exigidas pela Sociedade Brasileira de Dermatologia.

Em relação ao registro do título de especialista em Dermatologia concedido para o médico paulista Valcinir Bedin, Aloízio afirma que o que fez foi “de forma equivocada, mas não errada”.

Segundo ele, na mesma época, em 2011, foi feito o registro de outra médica de Colatina, também com a apresentação de documentos que comprovassem a atuação na área. “Para os dois casos olhei a documentação e entendi que havia o direito adquirido por eles e mandei fazer o registro.”

Mas o Conselho Federal de Medicina, após receber denúncias (CFM), discordou da decisão, avaliando que não havia comprovação suficiente de que Bedin tinha atuado na área. “Disseram que eu havia pulado etapas, que não tinha submetido o processo à Comissão de Título de Especialista. Determinei que eles fizessem a avaliação dos dois casos e eles entenderam que os médicos tinham o direito ao registro”, relatou Aloízio.

Entrada do CRM-ES: vice-presidente do conselho diz que concedeu título de especialista de forma equivocada . (Fernando Madeira/arquivo)

Ao final, segundo o vice-presidente do CRM-ES, o registro da especialização da médica foi mantido pelo CFM, mas o mesmo não aconteceu com Bedin. “A análise é feita de forma subjetiva. Tenho convicção de que ele (Bedin) tem o direito, mas o Conselho Federal entendeu de forma diferente e mandou cancelar o título, o que foi cumprido”, relatou.

Aloízio diz que conhece o médico Bedin há mais de 20 anos e que após o fato, o paulista acabou optando apenas por ensinar. “Ele tem uma produção científica enorme, é uma referência em dermatologia”, ponderou.

Ele explicou ainda que a opção por fazer obter o registro de especialização no Espírito Santo decorreu das circunstâncias. Na época, em 2011, a BWS, da qual Bedin é sócio junto com Aloízio, realizava um curso de pós-graduação em Vitória, em parceira com a Univix.

Aspas de citação

Olhei a documentação e entendi que havia o direito adquirido por eles e mandei fazer o registro

Aloízio Faria de Souza - vice-presidente do CRM-ES
Aspas de citação

O atendimento prático era oferecido no Centro Saúde de Jardim América. “O Bedin vinha para fazer esta parte de ensino teórico e prático, e não poderia exercê-los sem o registro secundário de especialização. Por isso, os documentos foram apresentados ao CRM-ES”, explicou Aloízio.

Ele avalia ainda que sua inexperiência na presidência do conselho, na época, pode ter sido a responsável. “Cometi um equívoco na condução do caso, talvez pela própria inexperiência. Mas depois do que aconteceu, me julguei por impedido e passei a função de registro de títulos na época para o vice-presidente, até por discordar da forma como é feito. Há casos em que o CFM concede os títulos, em outros não”, assinalou.

OUTRO LADO

O médico Bedin não foi localizado pela reportagem. A informação é de que ele viajou de férias para os Estados Unidos.

SOCIEDADE DE DERMATOLOGIA: SITUAÇÃO GRAVE

A Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) considera graves as denúncias referentes a concessão de diplomas de forma irregular. O vice-presidente da instituição, Sergio Palma, destaca que “a SBD tem o total interesse em que os fatos sejam apurados”.

Relata que as denúncias recebidas pela SBD foram encaminhadas ao Ministério Público e o Ministério da Educação. “A SBD está acompanhando e colaborando com todos os entes competentes para que os fatos citados nas denúncias sejam efetivamente investigados com a devida conclusão e providências”, destaca Palma.

Sobre o título de especialização concedido ao médico paulista Valcinir Bedin, a SBD informa que teve conhecimento apenas de que ele foi cancelado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM).

De acordo com Palma, não há limitação ao exercício da profissão por médicos regularmente inscritos no CRMs locais. Mas ele pondera que considerando a realidade e os desafios relacionados às recomendações de segurança nos procedimentos médicos, visando a proteção dos pacientes, a titulação é importante. “O exercício de especialidades médicas reconhecidas pela complexidade se faz com efetiva capacidade técnica e científica pelos portadores de título de especialista e/ou área de atuação”.

O CFM não respondeu à demanda da reportagem.

PROFISSIONAL QUER SER CONGELADO APÓS MORTE

Denunciado por ter recebido indevidamente a titulação de dermatologista, o médico Valcinir Bedin é conhecido por um fato curioso. Há mais de duas décadas, o mantém uma contribuição para uma empresa que irá realizar seu último desejo: o de ser congelado logo após sua morte e, depois, ressuscitado.

Foi o que ele relatou em entrevista concedida para a Revista Istoé, em 2010, e que foi atualizada em 2016. Na matéria, relatou que assim que falecer, a indenização de seu seguro será entregue ao beneficiário da sua apólice, a empresa americana de criogenia Alcor, em Scottsdalle, Arizona.

“Eles receberão US$ 150 mil para manter meu corpo congelado até que se descubra a cura para a enfermidade que me vitimou. Pedi para ser descongelado, revivido e tratado”, explicou à revista.

Contou ainda que anseia por uma segunda chance. “Não dá para fazer tudo o que eu quero em uma vida só. Viver é muito bom”, diz.

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