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A vida aos 18: os desafios da nova fase

A vida aos 18: os desafios da nova fase

Transição traz liberdade e direitos, mas também muitas responsabilidades

Publicado em 15 de setembro de 2018 às 23:04

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A turma que nasceu no início dos anos 2000 está completando a maioridade e, com ela, chega a sonhada liberdade para fazer o que quiser: beber, entrar na festa mais badalada, assistir a um filme adulto, dirigir. Mas será que a vida aos 18 anos é só curtição? No pacote, também vêm responsabilidades e desrespeitar regras pode render bem mais do que um sermão dos pais. Afinal, nessa idade, o jovem também pode ser preso.

“Todo jovem espera chegar aos 18 anos para deixar de fazer algumas coisas escondido, vive a expectativa de fazer o que antes não podia, como dirigir, comprar bebida, ou seja, ele conquista determinadas liberdades. Porém, ele também passa a ter deveres que precisam ser cumpridos em seu cotidiano”, observa o psicólogo Pedro Luiz Ferro. 

 FAMÍLIA 

 Para ele, a família tem um papel fundamental nesse processo de transição, pois ajuda a regular até onde o jovem pode ir. “Essa mudança de adolescente para a vida adulta não acontece de uma hora para outra. E não só a família, mas a escola também pode e deve colaborar. É preciso exigir seriedade, responsabilidade, mas não como uma forma de pressão”, recomenda Pedro Luiz.

Adriana Müller, psicóloga e comentarista da CBN Vitória, destaca que, aos 18 anos, via de regra, a maioria dos jovens adquiriu maturidade cognitiva e também um amadurecimento afetivo, pelas experiências positivas e negativas da vida, que resultam em um desenvolvimento moral mais elaborado.

“Então, ele conhece as leis, já tem claro o que deve e o que não deve ser feito. Não é o que pode, nem o que quer. Ele já tem a maturidade para pensar nessas consequências e assumir a responsabilidade de suas ações”, aponta.

Adriana acrescenta que, entre 18 e 20 anos, é de fato um marco do desenvolvimento humano, embora algumas pessoas fujam a esse padrão.

“A pessoa morre de velhice e não adquire maturidade. Mas, do ponto de vista físico e psicológico, o normal é que o amadurecimento nessa faixa dos 18 já propicie que a pessoa seja responsável por suas ações e, por essa capacidade, já pode pegar um carro, trabalhar, morar sozinha”, afirma.

Uma conquista de Vinícius Borlot Sarmento ao completar a maioridade no início deste ano foi a possibilidade de trabalhar. Ele faz curso técnico de Química na unidade de Vila Velha do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes) e, nos finais de semana, dá expediente como garçom em um bar. “Comecei a ter meu próprio dinheiro e parei um pouco de pegar com minha mãe. Assim, posso comprar minhas próprias coisas e, às vezes, até ajudo em casa”, conta o jovem, orgulhoso.

 CONTEXTO

A maturidade também é reflexo do contexto socioeconômico em que vive o jovem, bem como das relações familiares. Pedro Luiz Ferro diz que eventuais dificuldades fazem com que alguns precisem amadurecer mais cedo, assumindo responsabilidades de uma vida adulta, como a maternidade precoce ou a necessidade de trabalhar em detrimento dos estudos.

Já a professora Marcia Smarzaro Siqueira, do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), sustenta que a juventude não pode ser classificada como uma fase passageira, mas um momento de formação, de desenvolvimento integral do indivíduo, confirmando sua identidade.

“Vários autores apontam que não existe uma juventude só; são várias. E algo que influencia é a classe social: depende de onde esse jovem está na sociedade para dizer se ele vai viver de uma forma ou outra, o que a ele é permitido ou não”, ressalta Marcia Siqueira.

GERAÇÃO

Mas, de maneira geral, o que está sendo muito relevante para esta geração, avalia Adriana Müller, é a ideia de poder pensar e decidir o rumo da própria vida e esse é um aspecto que precisa ser conversado em casa, com as famílias.

“Essa conversa é importante para que os pais possam apoiar e validar esse projeto dos filhos. Muitos se ressentem de os pais não reconhecerem no desejo deles algo significativo, de valor. A frase que os filhos mais querem ouvir dos pais é que ‘vai dar certo!’”, pontua Adriana Müller.

Limite e frustração ajudam desenvolvimento do jovem

Se de um lado estão os jovens querendo alcançar novos horizontes, de outro precisa estar a família para que essa trajetória seja percorrida sem muitos percalços. As frustrações vão acontecer – e são até necessárias – mas o apoio em casa é fundamental para favorecer o processo de amadurecimento no início da vida adulta. E, nessa tarefa, estabelecer limites é primordial.

“Sempre que um limite é colocado, tentamos nos capacitar para chegar a ele e nos tornar merecedores do que buscamos”, aponta a psicóloga Adriana Müller.

Saulo Ribeiro, ele fez 18 anos e conquistou o direito de ficar uma hora a mais nas baladas. (Ricardo Medeiros)

O universitário Saulo Aurélio Ribeiro Miranda, 18, sabe bem o que isso significa. Um de seus desejos, antes de chegar à maioridade, era poder ficar nas festas que frequenta até a meia-noite. Seu horário-limite, até então, era 21 horas. “Eu queria voltar mais tarde e achava que, com 18, teria essa liberdade. Mas ganhei só uma horinha”, comenta.

“Há uma ilusão de que, quando fazemos 18 anos, podemos tudo. Tive esse baque ao ouvir que, enquanto estiver sob o teto dos meus pais, preciso seguir as ordens deles”, acrescenta Saulo. E a mãe, Maria Auxiliadora Ribeiro Miranda, 64, completa: “Ele continua obedecendo as regras de casa. Quero que acabe de estudar e, então, vai fazer a vida dele.”

Para Adriana Müller, esse é um processo natural. “À medida que ele mostrar à mãe que é merecedor de confiança, voltar na hora combinada, vai crescendo esse limite de horário. A maioridade também implica na construção conjunta de significados”, observa.

As mesmas regras valem na casa da universitária Haira Beatriz Amorim Motta que, quando estava na expectativa pelos 18 anos, imaginou que teria liberdade para entrar em lugares onde não podia. “Mas continuo morando com meus pais e entendo que preciso respeitá-los.”

A universitária Haira Beatriz Motta, 18, está juntando dinheiro de seu trabalho como vendedora para tirar a habilitação, um desejo da maioridade. (Vitor Jubini)

A madrasta Geisilane Motta, 34, reforça que a jovem foi criada para ser responsável e é obediente. “Ela pode frequentar qualquer ambiente por conta da idade, mas vai aonde a gente permite”, afirma.

Terapeuta comportamental e coordenador do curso de Psicologia da Faesa, Luciano Cunha ressalta que, para uma transição saudável à vida adulta, o trabalho começa muito antes dos 18 anos, ainda na infância.

“Alguns pais me perguntam se o filho gostar de um jogo violento no videogame o tornará violento também. Respondo que, quando delegamos a educação à tevê, internet, videogames, é um problema muito maior do que o jogo em si”, explica.

Outro problema, segundo ele, é evitar que os filhos se decepcionem. Assim, muitos jovens não têm desenvolvido uma habilidade fundamental para o amadurecimento: lidar com as frustrações.

Luciano destaca ainda que os pais devem adotar estilos parentais positivos para contribuir no desenvolvimento dos filhos. Um deles é a monitoria positiva, uma forma de interagir perguntando sobre o que foi feito de bom ao longo do dia, em vez de ser uma fiscalização do errado. “É mais vantajoso criar relação baseada na valorização do que está sendo feito certo”.

O terapeuta recomenda também ensinar o jovem a ter noção de que todas as escolhas vão produzir consequência. A ideia é fazê-lo tornar-se sensível ao outro e é importante que os pais deem parâmetro a partir do próprio comportamento.

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Entre os estilos negativos, estão os abusos físicos e psicológicos, que impedem o fortalecimento da autoestima, da confiança e da responsabilidade; e a disciplina relaxada, quando as regras ora são observadas pelos pais, ora não. “Tudo isso é base e, quando chegar aos 18 anos, terá o produto do que foi construído”, conclui Luciano Cunha.

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