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Morada da Barra: entenda a polêmica da reintegração de posse em terreno

Morada da Barra: entenda a polêmica da reintegração de posse em terreno

Briga na Justiça entre o grupo de proprietários e os moradores do local se arrasta desde 2014

Publicado em 29 de setembro de 2018 às 01:37

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Francisco diz que deixou de comer para construir. (Raquel Lopes)

A casa própria foi construída aos poucos pelo aposentado Francisco Mariano da Silva, de 57 anos, em Morada da Barra, em Vila Velha. Assim que cada parede subia, uma parte do sonho se concretizava. Em muitos dias da obra o almoço foi trocado por um saco de cimento para que a casa ficasse pronta rapidamente.

Mas desde o dia 18 de setembro o aposentado viu o sorriso ser transformado em lágrimas. Uma decisão judicial determinou a reintegração de posse do terreno, em uma ação que tramitava desde 2014. Assim como ele, 75 famílias foram obrigadas a sair da área de 24 mil metros quadrados.

“Triste ver um sonho destruído, era a única coisa que tinha para o futuro. Eu nunca poderia imaginar que a terra não pertencia a quem me vendeu. Gastei R$ 7 mil para o terreno e R$ 50 mil para a construção da casa.”

Assim como ele, muitos moradores asseguram que não invadiram a propriedade, mas sim pagaram até R$ 7 mil por um lote nela. Eles possuem um papel que foi apresentado a eles como recibo de compra e venda. Apenas um deles tem reconhecimento de firma em cartório.

DONOS DO TERRENO

De um lado o drama das famílias, de outro uma decisão da Justiça pelo direito de propriedade. A advogada Marilene Nicolau, que atua no processo e está entre os 24 proprietários do terreno, afirmou que a propriedade foi comprada em 2012.

O grupo de investidores de Cariacica, Vila Velha, Vitória e Pancas pagou R$ 350 mil pelas terras. Nem todos se conhecem e possuem profissões diferentes: advogados, nutricionista, engenheiro, comerciante e agente portuário.

Marilene explicou que os proprietários ficaram sabendo da invasão em 2013 após adquirirem o terreno. Diante disso, 10 pessoas do grupo de proprietários entraram na Justiça em 2014. Eles obtiveram uma liminar para a retirada das pessoas que lá se encontravam.

O juiz, porém, determinou a nomeação de um defensor público para representar os moradores. O defensor ingressou com recurso e conseguiu suspender a primeira decisão. Assim, ao longo de quatro anos, o processo foi transcorrendo e, este ano, saiu a sentença pela reintegração de posse.

Na época, a área foi adquirida com o objetivo de viabilizar a construção de habitações populares. No entanto, a execução seria realizada quando o terreno estivesse todo regularizado. A escritura foi feita em 2013 e os donos aguardavam a inscrição imobiliária na Prefeitura de Vila Velha para individualizar o IPTU.

“Acredito que as pessoas possam ter sido vítimas de um golpe, mas não temos culpa. Havia um projeto de investir em casas populares , não conseguimos realizar por conta da ocupação. O início das obras estava programado para quando houvesse toda a regulamentação. Vamos ter que começar tudo do zero”, disse.

Um engenheiro de 55 anos, que preferiu não se identificar, possui 7% da propriedade. Ele disse que passou por problemas financeiros após a compra do terreno. “Eu comprei o terreno com o intuito de ter retorno financeiro o que foi inviabilizado após a invasão. As pessoas precisam ter uma moradia, mas os projetos sociais devem ser feitos pelo Estado”, comenta.

DRAMA

A cobradora de ônibus Roseane Costa Pires, de 32 anos, comprou o terreno de uma mulher que morava em seu bairro. Ela recebeu um recibo de compra e venda assinado por ela e acreditava ser dona do pedaço de terra. “Eu não sei o que vou fazer, a situação está complicada”, disse.

Independentemente disso, homens e mulheres, crianças e idosos foram transferidos para a escola Darcy Ribeiro, no mesmo bairro. Na próxima terça-feira, elas serão encaminhadas para o prédio do Centro de Referência de Assistência Social (Cras) de Morada da Barra, segundo a Prefeitura de Vila Velha.

Eles ficarão alojados provisoriamente em um anexo que foi dividido por cômodos, cozinha comunitária, banheiros e deverá contar com um playground para as crianças. No entanto, a prefeitura não informou se todas as 25 famílias que estão na escola irão para o Cras.

As famílias reclamam que está muito difícil viver na escola. Móveis, eletrodomésticos, colchões e os pertences pessoais se misturam no espaço. Todos dormem juntos em uma sala e, durante a noite, é difícil descansar. Uma das moradoras, que não se identificou, também afirma que há temor na mudança para o Cras, que fica próximo do bairro Jabaeté pela rivalidade entre criminosos dos bairros.

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Sobre a ocupação do terreno, a prefeitura disse que não houve licença para a construção das casas. “A área em Morada da Barra é particular, foi ocupada e reintegrada aos proprietários por decisão judicial. Durante o processo de licenciamento de qualquer obra no município, a prefeitura solicita documentos de posse do imóvel”, disse em nota.

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