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Duas mulheres são ordenadas pastoras na Igreja Batista de Goiabeiras

Duas mulheres são ordenadas pastoras na Igreja Batista de Goiabeiras

Pastoras foram reconhecidas após anos de dedicação e trabalho na Igreja

Publicado em 19 de outubro de 2018 às 22:44

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Pastoras Anna Eliza, 36 anos e Rosilene Rodrigues Vieira, 56 anos da Igreja Batista de Goiabeiras. (Marcelo Prest)

Na Igreja Batista de Goiabeiras, em Vitória, as vozes que se ouvem do púlpito durante o culto se misturam. O passado de predomínio da fala masculina foi rompido, após duas mulheres serem ordenadas pastoras na comunidade. Um ato de reconhecimento depois de anos de trabalho e dedicação.

As pastoras Anna Eliza Simonetti Polastri de Oliveira Francisco, de 36 anos, e Rosilene Rodrigues Vieira, 56, foram ordenadas no dia 30 de setembro. A escolha das duas foi feita democraticamente pela comunidade por meio de uma assembleia.

Após a indicação, as pastoras foram sabatinadas em um concílio formado por 37 pastores do Espírito Santo e de fora do Estado. Lá, foram apresentadas questões teológicas, de eclesiologia e da história dos Batistas. Aqui no Estado 14 mulheres foram ordenadas pela Igreja Batista. Anna Eliza e Rosilene são as primeiras com atuação na Igreja Batista de Goiabeiras, uma das mais antigas de Vitória.

“Eu me senti, enfim, fechando um ciclo em minha vida, porque, embora já viesse exercendo a função pastoral na prática, receber o reconhecimento que esse lugar é legítimo é uma paz que vem ao meu coração”, destaca a pastora Anna Eliza.

A ordenação das pastoras acabou reavivando a discussão de que o Espírito Santo é um dos estados mais fechados para a ordenação de mulheres. “A história leva essa mudança. A igreja, a comunidade em si sempre reconheceram o ministério feminino, só que agora começam a querer algo mais e a perceber que as mulheres têm os mesmos direitos que os homens”, disse a pastora Rosilene.

Segundo a professora de Teologia da Faculdade Unida de Vitória Claudete Beise Ulrich, a ordenação de mulheres se fortaleceu após a declaração da Década das Mulheres pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 1975. Também está baseada nas reflexões sobre o papel das mulheres nas igrejas protestantes e nos movimentos dos primeiros encontros entre estudantes de teologia, teólogas e pastoras nas décadas de 80 e 90 que propuseram novas formas de ler e interpretar os textos bíblicos.

“Havia a suspeita de que a igreja era fortalecida por um patriarcado e esse movimento de releitura da Bíblia mostra que isso não se sustenta”, disse a professora. Ela cita ainda o texto bíblico de Joel capítulo 2, versículo 28: “Derramarei o meu Espírito sobre toda carne, e vossos filhos e vossas filhas profetizarão”.

O não reconhecimento das funções que as mulheres já exercem nas igrejas provocava inquietação. Rosilene teve seu reconhecimento após 30 anos de atuação ministerial. Trabalhou até como ‘plantadora’ de igrejas no Sertão.

“Apesar de ter a função pastoral pelo preconceito eu não era reconhecida como pastora. Acabei muitas vezes sendo ridicularizada porque eu estava sempre no meio dos pastores exercendo essa função”, relembra.

PRECONCEITO

Quando adolescente, Anna Eliza se sentia vocacionada para ser pastora, mas quando falava disso era reprimida. Diziam que a função não era para mulheres e que para exercer papel de liderança na igreja ela deveria se casar com um pastor.

Mas foi com a indicação para participar do concílio que o preconceito se mostrou ainda mais explícito. Líderes religiosos, inclusive batistas veicularam cartazes e postagens nas redes sociais que, segundo ela, a agrediram emocionalmente e moralmente.

“O governo batista é democrático e as igrejas são autônomas, mas infelizmente líderes e pastores de outras igrejas se sentiram no direito de nos violentar por texto, por rede social, e isso foi bastante negativo. Essas violências machucaram a nós e nossas famílias”, disse Anna Eliza.

VÍDEO

MINISTÉRIO

A pastora auxiliar Anna Eliza questiona a existência de tão poucas pastoras entre os Batistas sendo que quase 60% dos membros da igreja são mulheres. Ela acredita que isso se deu por falta de espelhos para o reconhecimento das vocações.

 

Porque a ordenação de vocês é um marco para a história dos Batistas no Estado?

Nossa ordenação acabou reavivando essa discussão porque o Espírito Santo é um dos Estados mais fechados para a ordenação de mulheres. Há um bom tempo uma mulher não era ordenada para um ministério pastoral aqui.

Esse processo foi fácil?

Havia a dificuldade, que não é só na Igreja Batista, mas na sociedade em geral, de reconhecer alguns lugares para mulheres, especialmente lugares de liderança. Esse processo começou há quatro anos quando fomos convidadas a ingressar no time pastoral pelo nosso pastor e culminou na indicação da igreja para que este lugar que já estávamos ocupando extraoficialmente fosse, enfim, oficializado por meio da convocação de um concílio de exame.

Esse processo no concílio desde a indicação viveram algum tipo de preconceito?

Muito preconceito, mas não de nossa comunidade de fé. Teve o preconceito de outros líderes religiosos, inclusive de nossa denominação. Esse preconceito suscitou inclusive ações violentas como cartas que foram publicadas e veiculadas em rede social, nos dando adjetivos bastante negativos. Fomos violentadas emocionalmente, moralmente por homens que na sua grande maioria acreditam que o lugar da mulher é à margem da sociedade e portanto elas não poderiam ocupar o mesmo lugar que eles.

Por que existem poucas pastoras entre os Batistas?

Penso que nós temos poucos espelhos, para que eu possa me reconhecer em uma vocação, um lugar social. É preciso que eu veja outras pessoas ocupando esses lugares, dizendo e percebendo que este também pode ser o meu lugar. Infelizmente muitas mulheres cristãs evangélicas estão nas comunidades atuando sem serem reconhecidas.

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