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'Fecho os olhos e vejo ele debaixo da lama', diz esposa de capixaba

"Fecho os olhos e vejo ele debaixo da lama", diz esposa de capixaba

O mecânico Uberlândio Antonio da Silva, 54, trabalhava no local onde barragem rompeu e está desaparecido. A esposa, Rosemar Pinheiro, 38, está desesperada

Publicado em 30 de janeiro de 2019 às 22:31

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Rosemar Pinheiro, 38, lamenta o desaparecimento do marido, o capixaba Uberlândio Antonio Silva, desaparecido na tragédia de Brumadinho, em Minas. (Fernando Madeira)

Devastada. Essa é a palavra que define a representante de vendas Rosemar Pinheiro, 38, que aguarda notícias do marido desaparecido na tragédia em Brumadinho, Minas Gerais. O mecânico Uberlândio Antonio da Silva, 54, trabalhava em uma empresa terceirizada da Vale na região no momento em que uma barragem de rejeitos de minério se rompeu, há uma semana. "Eu não consigo dormir. Fecho os olhos e vejo o meu marido cheio de lama", relata chorando na casa onde mora em Parque Residencial Tubarão, na Serra.

O mecânico, que nasceu em Linhares, no Norte do Estado, está entre os 259 desaparecidos. A esposa diz que soube da tragédia por meio do chefe de Uberlândio. Juntos há 11 anos, Rosemar não se conforma em estar sem o marido. "Ele era minha estrutura. Não deixava faltar nada em casa. Era um homem bom, engraçado e trabalhador", contou.

Ele a ajudou a criar os quatro filhos dela. Embora não sejam biológicos, o mecânico tinha "o maior amor do mundo" com eles, relata a esposa. "Começamos a morar juntos quando eles eram pequenos. Meu filho mais novo, de 12 anos, não dorme há três dias."

Agoniada e sem notícias do marido, Rosemar não consegue acreditar na tragédia. "Meu marido não merecia morrer na lama, não. Por que não fazem as coisas direitinho? A pessoa vai com tanto amor para o trabalho", diz aos prantos.

A cada 15 dias, Uberlândio tinha folga do trabalho em Minas e sempre dava um jeito de voltar para casa. "Nós vivíamos conversando. Ele mandava fotos de lá." Recentemente, o casal oficializou a união. "Ele brincou, dizendo: 'Lindinha, é pra ter certeza que você é minha'. Ele só me chamava assim", diz emocionada. 

ÚLTIMA VEZ

No dia da tragédia, Rosemar enviou um bom dia no WhatsApp. O marido visualizou, mas não respondeu por estar no trabalho. "Ele não podia usar o celular sempre." Próximo da hora do almoço, a esposa enviou outra mensagem. No celular, nem sinal de recebimento. No coração, uma esperança: "Senti que ele estava vindo para casa. Falei com minha filha: ele vai nos pegar de surpresa". Uberlândio não retornou e a família, desde então, não tem mais notícias.

A última reunião da família foi no último Natal, em dezembro de 2018. Na casa, Rosemar vive com os quatro filhos, de 21, 16, 14 e 12 anos. "Meu marido fez um churrasco aqui. Estava super alegre e amava estar em família", aponta a mulher, para o quintal. Hoje, o único desejo é poder ter uma despedida digna para o marido. "Deus tem que me dar pelo menos o corpo dele", desabafa.

MÃE AINDA NÃO SABE

A família do capixaba já não espera encontrá-lo com vida. “Temos que encarar a situação. Se fosse para achar com vida, já teria achado. Ele era brincalhão e muito gente boa”, relata o empresário Fernando Lima, 29, sobrinho de Uberlândio.

A mãe do capixaba, uma idosa de quase 90 anos, não sabe da tragédia envolvendo o local de trabalho do filho, nem que ele está desaparecido. O sobrinho diz que a avó tem muitos problemas de saúde.“Minha avó tem Alzheimer e pressão alta. Tem a saúde fragilizada. Por enquanto estamos poupando-a, para não ocorrer algo pior”, explica Fernando.

A família teme que a notícia faça a saúde da idosa piorar e tem esperanças de achar o corpo para então comunicar a mãe. “Minha tia está pensando em inventar uma desculpa para trazê-la ao Estado (ela vive na Bahia), para o velório. Com todos unidos, é melhor para dar apoio.”

O primo de Uberlândio, Joseval da Silva, também está abalado com a tragédia. Os dois trabalharam juntos e eram bem amigos. “Ele sempre vinha aqui. De repente, não posso ver mais. Não vou apertar mais a mão dele. Isso fere a gente”, diz emocionado.

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A espera por notícias do primo também está tirando as noites de Joseval, que o viu pela última vez no Natal, quando a família se reuniu. “É como saber que se foi e não vai voltar mais. Não ouvir a palavra. Se pelo menos viesse o corpo, a emoção era diferente. Encerrava. Vamos estar sempre achando que vai voltar um dia, que está chegando”, relata.

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