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'Agressores não se sentem culpados', diz defensor público

"Agressores não se sentem culpados", diz defensor público

Defensor público que atuou em audiências de custódia durante o carnaval se surpreendeu com número de casos e com a banalidade com que os acusado tratam o crime que cometeram

Publicado em 9 de março de 2019 às 02:08

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Raphael Maia Rangel diz que agressores acreditam que "mulher mereceu". (Arquivo Pessoal)

De plantão em dois dias do feriado – segunda de carnaval e na Quarta-Feira de Cinzas – o defensor público Raphael Maia Rangel se surpreendeu com o fato da violência doméstica ser o crime na liderança do ranking de prisões em flagrante na Grande Vitória. Mas, pior do que isso, foi constatar que a maioria dos homens detidos não se arrependeu e tampouco reconhece que cometeu um crime.

Em casos de prisão em flagrante, a pessoa deve ser apresentada em frente a um juiz para ser ouvida, nas audiências de custódia. Também participam um membro do Ministério Público do Estado e um defensor público, caso a pessoa não tenha advogado. E foi nessas situações, durante o plantão, que Raphael participou e soube dos casos.

Embora a situação tenha sido vivenciada por ele durante o feriado, Raphael Rangel sustenta que essa não é uma realidade somente dos dias de folia, mas do cotidiano das mulheres. “A percepção é muito clara: os agressores acham que só estão ali porque a parceria comunicou. Agressores não se sentem culpados, não sentem que fizeram algo errado, acham que a mulher mereceu e foi quem deu causa à violência", conta.

E os motivos apontados, segundo ele, são os mais banais. Não deixou olhar o celular, não fez a comida ou estava fria, chegou atrasada...

“Um dos casos que peguei foi de um segurança particular que tascou a mão na mulher porque, quando chegou em casa, ela não estava. Era dia de carnaval, mas ela não tinha saído para isso. Ela tinha ido comprar pão. Ou seja, são motivos mínimos que levam à violência, e os homens ainda se colocam como vítimas da situação”, destaca Raphael Rangel.

O defensor aponta que esse não é um problema das classes sociais mais baixas e menciona que, no caso do segurança, a renda dele é da faixa de R$ 4 mil. “A violência está em todo lugar!”

CRIMINOSOS

 

Outra observação de Raphael Rangel é sobre o fato dos agressores não acharem que são criminosos. “Uma pessoa que furta no supermercado, reconhece o crime. O traficante, o assassino, o assaltante também. Quem bate na mulher, não. Mas é sim um criminoso e deve ser tratado como tal”, defende.

Para o defensor, a estigmatização dos agressores como criminosos pode mudar um pouco o panorama de violência. Ele acredita que a legislação atual demonstra um avanço na proteção à mulher, mas os homens não se sentem intimidados justamente porque não acham que cometeram crime. “Muitos já entram na prisão com o seguinte pensamento: ‘tão logo eu saia daqui, vou atrás dela’. Ao passo que, se a sociedade começar a tratá-lo como criminoso, além da punição judicial, podemos ver uma mudança. Isso é cultural”, avalia.

COMISSÃO

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Os abusos são uma preocupação da Defensoria Pública que, nesta sexta-feira (8), anunciou a criação de uma comissão especial de estudos sobre violência contra a mulher, que dará subsídios ao defensor-público geral. “Será um órgão de planejamento, com objetivo de deixar a Defensoria melhor preparada para fazer a promoção dos direitos da mulher, além do que se faz nos processos individuais ou coletivos”, afirma Hugo Fernandes Matias, Coordenador dos Direitos Humanos do órgão.

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