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Condenados por tortura, diretores de presídios são afastados pela Sejus

Condenados por tortura, diretores de presídios são afastados pela Sejus

Apesar da condenação, Silvano Alvarenga da Silva, Mário José da Paixão e Waldoece Apolori Costa Junior continuavam exercendo as suas atividades na direção de duas unidades prisionais: Penitenciária Estadual de Vila Velha I e a Penitenciária de Segurança Média II, em Viana

Publicado em 13 de março de 2019 às 10:49

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Fatos ocorreram na Penitenciária Estadual de Vila Velha I (PEVV I), em Xuri, Vila Velha, em 1° de agosto de 2013. (Edson Chagas/Arquivo)

Três diretores de presídios capixabas foram afastados de suas funções na noite desta terça-feira (12). Silvano Alvarenga da Silva, Mário José da Paixão e Waldoece Apolori Costa Junior haviam sido condenados em 2016 pela prática de tortura contra detentos, e ainda assim continuavam exercendo as suas atividades na direção de duas unidades prisionais: Penitenciária Estadual de Vila Velha I e a Penitenciária de Segurança Média II, em Viana.

A decisão do afastamento foi tomada pelo secretário de Estado da Justiça (Sejus), Luiz Carlos Cruz. Por nota, ele informou que, "ao tomar conhecimento dos fatos, determinou o imediato afastamento dos servidores", acrescentando que "não comunga com práticas de tortura de qualquer natureza e que tem como princípio o respeito aos Direitos Humanos."

A informação sobre os servidores foi divulgada com exclusividade nesta terça-feira (12) pela coluna de Leonel Ximenes, após depoimento do subsecretário de Estado de Ações Prisionais, Alessandro Ferreira de Souza, à reunião da Comissão de Segurança da Assembleia Legislativa. Na ocasião, ele explicou que os servidores continuavam atuando, mesmo após condenação em segunda instância, porque a Sejus ainda não havia sido intimada pela Justiça estadual sobre o assunto.

A Sejus informou ainda que, se houver decisão de prisão para os diretores, eles serão alojados na Penitenciária de Segurança Média I, em Viana, "por questões de segurança". A reportagem apurou que este presídio é destinado a autoridades, policiais, servidores e até agentes penitenciários que cumprem penas.

TORTURA

Os fatos ocorreram na Penitenciária Estadual de Vila Velha I (PEVV I), em Xuri, Vila Velha, em 1° de agosto de 2013. Segundo o relato da denúncia apresentada pelo Ministério Público Estadual (MPE), em 2015, os servidores retiraram um detento de sua cela "mediante emprego de violência, como forma de aplicar castigo, causando a este, intenso sofrimento físico", diz o texto. Um outro detento que viu a cena e também reclamou, foi retirado da cela e foi "exposto à violência".

As acusações recaíram sobre Silvano Alvarenga da Silva e Mário José da Paixão, denunciados por prática de crimes de tortura, em sua forma comissiva (com atuação dos acusados), e ainda sobre Waldoece Apolori Costa Junior, por prática de tortura, em sua forma omissiva, este por se omitir diante de prática de tortura, quando tinha o dever de evitá-la.

Em novembro de 2016, a juíza Vânia Massad Campos, da 6ª Vara Criminal de Vila Velha, condenou os três servidores. Em sua decisão, ela destacou que "a tortura mostra-se como um crime especial e se traduz num comportamento abusivo de poder, por parte de um funcionário público, em detrimento de garantias constitucionais ou legais de um particular". Disse ainda que, em resumo, ela é um grave ataque aos direitos fundamentais do cidadão e, ao mesmo tempo, representa para o corpo social um sentimento de frustração em relação à expectativa de cada cidadão, “de que aqueles que estão a seu serviço se comportem de acordo com a norma constitucional vigente”, diz o texto da sentença.

É revelado ainda na sentença que o detento, vítima da tortura, teria sido submetido a espancamentos (golpes nas pernas que fizeram com que caísse de joelhos, chutes nas costas e cabeça batida contra os portões de segurança), bem como permaneceu algemado com os braços para trás, por cerca de 4 (quatro horas), em um corrimão de uma sala vazia (chamada de “barbearia”).

Tudo confirmado em imagens de videomonitoramento. "Visualizando as imagens, é possível constatar que os acusados conduziram a vítima e seu colega de forma rude. É possível perceber, também, que não foram agredidos durante o tempo em que permaneceram na “barbearia”. Todavia, há um momento no vídeo – e este momento é confirmado tanto pela vítima, quanto pelas testemunhas, quanto pelo próprio acusado Mário –, em que a vítima cai e o ângulo da câmera permite visualizar em parte o que aconteceu. Vê-se o inverso do que diz o acusado Mário, de que “[...] a vítima tentou se jogar ao chão e como o interrogando estava apenas com uma das mãos livres, tentou contê-lo para que o mesmo não se atirasse ao chão; que nesse momento, por estar com uma das mãos ocupadas, o denunciado Silvano pega o interno e o conduz até a barbearia”, é descrito na decisão.

Os três diretores recorreram contra a sentença junto ao Tribunal de Justiça do Estado, onde os vários recursos foram avaliados pela Primeira Câmara Criminal, pelas Câmaras Criminais Reunidas e pela vice-presidência. Em todos foi mantida a condenação dos servidores. Eles agora estão fazendo um recurso para que o processo siga para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília.

Ao recusar os recursos, os desembargadores determinaram que o processo retorne para a 6ª Vara Criminal de Vila Velha, onde caberá à juíza decidir se determina a prisão dos acusados com a condenação de segunda instância. O processo, segundo o andamento constante no site do TJES, ainda não chegou ao Juizado de Vila Velha.

O OUTRO LADO

O advogado Henrique Herkenhoff, que faz a defesa do servidor Waldoece, assinalou que "não houve nenhum excesso por parte dos réus em relação aos detentos". Relatou, ainda, que o seu cliente, que era diretor da unidade PEVV I, na ocasião, só tomou conhecimento dos fatos após o ocorrido e determinou que fosse instaurado um Procedimento Administrativo para apurar os fatos, onde o preso também foi ouvido.

Ele explica que os procedimentos adotados estão previstos nos procedimentos da Sejus e que teve a finalidade de isolar o interno, naquele momento, para caráter punitivo. "O réu ficou sentado em uma cadeira durante curto espaço, não sofreu nenhum mal trato ou nada. Os procedimentos estão de acordo com a lei e o manual da Sejus". Ele acrescentou que, nos procedimentos de imobilização, é frequente o preso se debater porque nem sempre aceita ser imobilizado.

Quanto às lesões, relata que isto não foi presenciado e nem eram visíveis. Todas estavam ocultas pelo cabelo, e eram escoriações leves, compatíveis no processo de imobilização. "Não houve violação, foi incidente da mobilização provocado pela resistência do preso. O que parece é que não se compreende a realidade e as dificuldades da lida com presos. Há protocolos internacionais. Tudo é feito como recomendado até pelas organizações internacionais de Direitos Humanos. O que foi feito foi atuação imediata para evitar o que poderia se transformar até em uma rebelião. Foi incidente menor porque se teve a providencia de tirar o preso de perto dos outros", relatou Herkenhoff.

A defesa dos acusados Silvano e Mário não foi localizada pela reportagem.

SAIBA

Silvano Alvarenga da Silva

Era subdiretor da PEVV I na época dos fatos. Atualmente era diretor adjunto da Penitenciária de Segurança Média II, em Viana. Foi condenado a 02 anos e 11 meses de reclusão em regime fechado. Foi ainda condenado à perda do cargo público, e teve decretada a sua interdição para o exercício do referido cargo pelo prazo de 5 anos e 10 meses.

Mário José da Paixão

Era chefe de segurança da PEVV I na época dos fatos. Atualmente era diretor adjunto da Penitenciária Estadual de Vila Velha I. Foi condenado a 2 anos e 11 meses de reclusão em regime fechado. Foi ainda condenado à perda do cargo público, e teve interditado o seu exercício pelo prazo de 5 anos e 10 meses.

Waldoece Apolori Costa Junior

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Na época era diretor da PEVV I e permaneceu no mesmo cargo. Ele acompanhou a condução das vítimas, e segundo a decisão judicial foi ele quem deu a ordem para que as vítimas ficassem algemadas na sala até o outro dia pela manhã. Foi condenado a 1 ano e 9 (nove) meses de reclusão em regime aberto. Não poderá exercer o mesmo cargo pelo prazo de 3 três anos e 6 meses.

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