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Prender 'ladrão de galinha' não contribui para a segurança pública

Prender "ladrão de galinha" não contribui para a segurança pública

O especialista em violência e conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública defende uma política baseada em informação qualificada e inteligência

Publicado em 26 de março de 2019 às 23:22

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As pequenas apreensões de drogas que ocorrem nas ruas e levam para a cadeia muitos jovens e adolescentes do baixo escalão do crime não contribuem em nada para a Segurança Pública. A avaliação é do economista Daniel Cerqueira, especialista em violência e conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Segundo o pesquisador, basear estratégias polícias no sufocamento do “varejo” da droga gasta dinheiro público e ainda contribui para a ampliação do poder das facções criminosas.

Diariamente vemos resultados de ações da polícia que terminaram na apreensão de algumas buchas de maconha e alguns papelotes de cocaína. Quando há presos, muitos são adolescentes. Qual o impacto dessas ações?

Isso não contribui em nada para a segurança pública. É orientar recursos da segurança pública para prender ladrão de galinha. Esse garoto que estava lá e que foi pego com alguns papelotes, ele vai entrar na cadeia, vai fazer escola do crime lá dentro, vai fazer relações com outros criminosos e vai sair muito pior do que entrou. O foco das forças de segurança não pode ser o pequeno bandido mas os criminosos mais perigosos.

Como o senhor propõe que as ações sejam orientadas?

Hoje, se você olha nos países desenvolvidos há um modelo de trabalho de polícia chamado de polícia orientada pela inteligência. Chegou-se a conclusão que não dá para prender todo mundo que comete crime. Nos Estados Unidos, o número de crimes aumentou seis vezes mais que o efetivo policial. Cada vez que você prende um cara desse, é trabalho de cartório policial, é policial parado, há todo um trabalho de persecução criminal… Ou seja, você envolve recursos escasso do Estado para lidar com ladrão de galinha.

Como não conseguimos prender todo mundo, temos que fazer trabalho de inteligência a partir de visão de médio e longo prazo. Não pode ser de apagar incêndio, ir ai na esquina e prender o traficante. É preciso identificar quem são os cabeças. Aí, prendendo esses cabeças, você dá uma sinalização para o crime que o Estado não aceita mais o uso da violência. Não adianta focar só em sufocar o varejo.

Esse modelo de “sufocar o varejo”, utilizado há tantos anos, fracassou?

Como exemplo do fracasso dessa política de guerra às drogas de eliminar tanto o atacado como o varejo: os Estados Unidos, em 40 anos, gastou mais de um trilhão de dólares. O que aconteceu com o preço da droga no varejo? Ele diminuiu. Isso significa que essa política teve um fracasso total. Mas vamos imaginar que tivesse conseguido ter apreensão grande, fazer a oferta diminuir, e elevar o preço no varejo. Como efeito disso, você sempre iria atrair algum empresário do narcotráfico disposto a correr o risco para ter aquela renda a mais. Os seja, a política de guerra às drogas nasce fracassada.

Então é melhor não prender?

É óbvio que um policial vendo um traficante, tem que prender, levar à justiça, porque afinal ele estará cometendo um crime se não fizer isso. A política que não pode ser orientada para sufocar o varejo mas sim em planejamento estratégico a partir de informação qualificada, baseado em inteligência policial de um lado e, de outro, inteligência baseada nas dinâmicas sociais locais.

Como as dinâmicas sociais influenciam?

Se você for olhar de onde essas pessoas saem, onde esses crimes acontecem, é muito concentrado no território. Tudo parte de um planejamento para identificar os focos do problemas fazer um diagnóstico local para saber quem são os meninos que estão fora da escola, o que precisa ser feito. Ou seja, um trabalho social forte e ao mesmo tempo um trabalho policial de inteligência. A inteligência é tudo na polícia moderna e não a prisão em flagrante. Hoje, 70% dos presos no Brasil são em flagrante. São os meninos presos com papelote e que vão dinamizar as facções criminosas no futuro.

Nós temos recursos tecnológicos e pessoais atualmente para ter essa polícia inteligente?

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Ao contrário dos mercadores do medo que pregam a extinção dos outros , o aumento do aprisionamento, dar tiro na cabeça, temos bons exemplos no Brasil de políticas qualificadas e o Espírito Santo é exemplo disso. Com o Estado Presente acredito que há uma luz no fim do túnel.

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