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Quatro em cada dez moradores da Grande Vitória lançam esgoto no mar

Quatro em cada dez moradores da Grande Vitória lançam esgoto no mar

Todos os dias é jogado o equivalente a 57 piscinas olímpicas

Publicado em 4 de maio de 2019 às 22:15

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Jackelina com uma de suas filhas: a família dela vive às margens de um valão. (Marcelo Prest)

Na Grande Vitória, quatro em cada dez moradores ainda dispensam esgoto de forma irregular, um total de 684.219 habitantes. Para se ter uma ideia do tamanho do estrago, todos os dias essas pessoas despejam 136.843,8 m3 de esgoto nos cursos de água. Quantidade que encheria 57 piscinas olímpicas. Todos os dias.

Os dados são da Companhia Espírito Santense de Saneamento (Cesan). Essa mistura de urina, fezes, sabão e outros rejeitos escorre no meio das ruas, por valões, córregos, rios, ou clandestinamente pela rede pluvial e vai parar, invariavelmente, na Baía de Vitória.

Desses quatro moradores que lançam esgoto irregularmente, três o fazem por não terem acesso à rede de coleta e tratamento - o último, tem rede mas não faz a ligação.

Uma das que sofre com a falta de acesso é a dona de casa Girlene Vieira da Foneca, 42 anos, que mora na Avenida Beira Rio, às margens do Rio Formate no bairro Operário, em Cariacica. “Não tem nada de avenida, muito menos de rio”, constata. Além de não ter rede de esgoto, a via não é asfaltada.

Quatro em cada dez moradores da Grande Vitória lançam esgoto no mar

De fato, basta uma olhada rápida para perceber que a água densa e escura que corre pela calha do Rio Formate há muito tempo já matou os peixes. “Os antigos falam que lavavam roupas nessa água. Hoje em dia é esgoto puro. O máximo que você vê nadando é algum rato que caiu no rio”, conta.

Quando chove, o rio transborda e a água suja invade a casa. “Como não tem rede, a gente sabe que é água podre que está entrando”, diz. As duas crianças que moram na casa, netos de Girlene, de 1 e 2 anos, ficam frequentemente doentes e ela desconfia que tenha relação com isso. “É muita febre e dor de barriga”, diz.

Quem também tem grande preocupação com a saúde das crianças é a jovem Jackelina Hammer, 28 anos. Ela mora em uma casa em Barramares, Vila Velha, a poucos metros de um valão. Na casa, além de Jackelina, moram sete pessoas, sendo quatro crianças. “Quando chove, esse valão transborda e se mistura com a água limpa. Logo depois, os meninos sempre acabam tendo dor de barriga”, conta.

Jackelina está desempregada e aguarda o quinto bebê, que deve chegar em poucas semanas. A família não tem como sair dali. A esperança dela é de que um dia as autoridades consigam construir rede no bairro ou, pelo menos, tapar o valão. “A gente tem esperança. Mas não sabe quando vai acontecer.”

SAÚDE

A especialista em Direito à Saúde e professora da FDV Elda Bussinguer afirma que a ausência de saneamento é determinante nas condições de saúde. “Não há o que se falar sobre direito à saúde se não tivermos condições básicas que permitam que o sujeito viva em um lugar salubre”, explica.

Ela ressalta que, no Brasil, durante o ano de 2013, foram registradas 400 mil internações relacionadas a diarreias , que atingem principalmente crianças menores de 5 anos. “Estima-se que 80% delas estão relacionadas à falta de esgoto tratado. Os custos para o SUS são estratosféricos”, diz.

A especialista atesta que as condições de saneamento refletem as condições de desigualdade. “Nós, que vivemos em bolhas, em bairros altamente saneados, não conseguimos entender o que é isso.”

Segundo o presidente executivo da ONG Trata Brasil, Édison Carlos, um dos fatores que explicam a demora na ampliação da oferta de coleta e tratamento de esgoto está ligada ao valor das obras (muito caras) e ao tempo gasto para conclusão. Por isso, muitos municípios perdem interesse em investir na área. “É uma obra invisível que não dá para inaugurar rapidamente, às vezes tem que quebrar a cidade, o prefeito fica com medo de a população ficar incomodada. Mas é o básico do básico. Sem isso, a cidade não se desenvolve nunca”, diz.

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Ele afirma que o Espírito Santo tem avançado na ampliação do serviço, principalmente por conta das Parcerias Público-Privadas (PPP) que hoje existem em Vila Velha e na Serra. Cariacica também estuda implantar o modelo. “O setor púbico muitas vezes não tem recursos para dar vazão a essa demanda.”

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