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Estado gastou R$ 37 milhões a mais para comprar leitos particulares

Estado gastou R$ 37 milhões a mais para comprar leitos particulares

Aumento foi de 40,26%, bem superior ao índice de 24,28% nas internações

Publicado em 16 de junho de 2019 às 22:11

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Debora Gomes, 33, precisou recorrer a Justiça para que sua mãe conseguisse um leito após sofrer AVC. (Carlos Alberto Silva)

A falta de leitos na rede pública tem se mostrado um problema crônico ao longo do tempo. Sem capacidade para atender a demanda, o governo recorre à iniciativa privada e, a cada ano, paga mais pelo serviço. O gasto com compra de leitos em 2017 foi de pouco mais de R$ 93 milhões e, no ano passado, saltou para R$ 130,6 milhões. Um aumento de 40,26%, índice bem superior ao número de internações, cujo crescimento foi de 24,28%.

Os dados, obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), são referentes a leitos de enfermaria e UTI em hospitais gerais, e ainda de clínicas voltadas ao atendimento de saúde mental. E é neste segmento, de doenças psíquicas em que se enquadram também os dependentes químicos, a maior despesa do Estado por paciente.

Enquanto o custo médio de cada internação foi de R$ 14,5 mil nos hospitais gerais em 2018, no mesmo período as unidades de saúde mental e dependência química recebiam, em média, R$ 49,9 mil por paciente internado. Embora o valor da diária nas clínicas seja mais baixo – R$ 398 – o tempo prolongado de internação torna o custo elevado.

Em 2017, 852 internações em clínicas custaram aos cofres públicos

R$ 26,8 milhões. No ano passado, houve menos pessoas internadas – 846 – e o valor da despesa atingiu os R$ 42,2 milhões.

Sem pacientes

Mesmo quando não há novas internações, como foi o caso do Instituto Amanhecer, que não recebeu um paciente sequer em 2018, o governo desembolsou mais de R$ 1,33 milhão para pagar por leito comprado na clínica no ano anterior.

Professora do departamento de Serviço Social da Ufes, Fabíola Xavier Leal avalia que o crescimento dos gastos com internação de dependências químicas e de pessoas que demandam cuidados mentais pode estar sendo influenciado por uma estratégia equivocada de manter esses pacientes internados por mais tempo. Coordenadora do núcleo de pesquisa Fênix, que produz conhecimento sobre a área, Fabíola defende a existência de uma estrutura estatal que ofereça leitos para passagens breves em hospitais gerais, e não em psiquiátricos. O restante do tratamento deve ser realizado ambulatorialmente.

“Os resultados seriam mais eficazes. A internação é necessária no período de desintoxicação, por um ou dois meses. O tratamento não acaba depois. Ele prossegue, em ambulatórios, sem o indivíduo ser excluído do convívio. Está provado que, individualmente, não resolve. Nas clínicas, a internação dura nove, 12 meses”, diz.

Judicialização

Tadeu Marino, subsecretário estadual da Saúde, diz que a legislação vigente prevê, nesses casos, internação por até 90 dias, porém alguns pacientes conseguem estender esse prazo porque a família recorre à Justiça.

A judicialização, segundo ele, é uma das razões para o Estado comprar leitos em hospitais privados quando a rede própria não dispõe de mais vagas. Mas, para quem depende do SUS, muitas vezes é a Justiça quem garante o acesso à saúde. Foi o que aconteceu com Maria da Penha Cazaroto Vieira, 66, que teve um AVC e ficou por 15 dias em uma unidade de pronto-atendimento, em dezembro passado, porque não tinha leito em hospital para ser avaliada por neurologista e receber assistência especializada.

“A avaliação deveria acontecer em 72 horas, e nada. Com cinco dias, procurei a defensoria e entrei na Justiça. Aí mandaram transferir a minha mãe. O atendimento lá foi bom, e em dois dias resolveu. Na rede pública, tem coisas que precisam ser imediatas e a gente não tem”, lamenta a filha, Debora Cazaroto Gomes, 33, acrescentando que a mãe ficou com sequelas.

Para o defensor público Phelipe França Vieira, a judicialização é também reflexo de problema de gestão pública. “As necessidades na saúde são grandes e é preciso melhorar o serviço.”

(Com colaboração de Vinícius Valfré)

Tempo de internação e complexidade eleva gasto

A explicação para o crescimento do gasto do governo do Estado com leitos em hospitais gerais da rede privada passa pela realização de mais atendidos de alta complexidade e também por necessidade de ampliação dos períodos das internações.

A análise é do superintendente do Sindicato dos Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Espírito Santo (Sindhes), Manoel Gonçalves Carneiro.

“Sem analisar os números não posso comentar muito. O que pode ter sido é o aumento de complexidade do atendimento e aumento de duração das internações. Teríamos que analisar o perfil dessas internações”, disse.

O superintendente explicou que além de suplementar a rede pública, nas unidades privadas (com ou sem fins lucrativos) há situações nas quais os hospitais particulares são os principais oferecedores dos serviços para a população que não pode pagar. E aí o Estado paga por isso.

“Em algumas ações, a rede não apenas suplementa, mas é a principal. Acontece, por exemplo, em transplantes hepáticos, de pâncreas, de coração. Esses não têm na rede estadual”, comentou.

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Entre os serviços oferecidos ao Estado pela rede privada, via contratos, estão pediatria, internação clínica e terapia intensiva.

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