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Bailarino acredita no sonho e supera infância pobre no ES

Bailarino acredita no sonho e supera infância pobre no ES

Gustavo Ribeiro, de 24 anos, morava em Rosa da Penha, em Cariacica, quando descobriu o balé. Ele vive há sete anos nos Estados Unidos e dança no Miami City Ballet.

Publicado em 17 de julho de 2019 às 21:18

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Bailarino Gustavo Ribeiro aposta em sonho e brilha em companhia de balé americana . (Ricardo Medeiros/ A Gazeta )

“Fui desacreditado por muitas pessoas, mas eu sempre acreditei e digo que se você lutar, se trabalhar pelo seu sonho, vai conseguir. Às vezes a oportunidade não bate na sua porta, temos que criá-las. Precisamos de coragem para se expor, pedir patrocínio, pedir ajuda. Nunca desista porque o mundo tem espaço para todo mundo e cada um tem sua hora de brilhar”.

A positividade é do jovem bailarino Gustavo Ribeiro, de 24 anos, que está há sete anos nos Estados Unidos. De família humilde, o dançarino criado pela avó no bairro Rosa da Penha, em Cariacica, superou a infância pobre e o preconceito para seguir seu sonho. Hoje, ele dança no Miami City Ballet, uma das cinco melhores empresas de dança dos Estados Unidos e tem objetivo de ser o protagonista da companhia. Nos planos dele ainda está ajudar outras crianças que tiveram a mesma realidade que a dele.

Em visita ao Brasil, Gustavo contou que teve o primeiro contato com o balé aos 12 anos, quando uma vizinha percebeu a paixão do menino pelo mundo das artes e perguntou por que não fazia a dança. “Eu não sabia o que era. Ela me explicou e me interessei”, relata. Por causa dos poucos meninos que se interessavam pelas aulas, a dona da escola de dança Expressão e Arte ofereceu uma bolsa para ele.

O menino conheceu cedo a dificuldade e o preconceito para seguir o sonho. “Cariacica ainda não estava preparada para ver meninos dançando. Foi difícil, porque viam o balé como uma coisa de meninas. Eu quis sair, quis desistir. A minha avó não era a favor nem contra. Se tinha uma apresentação, ela me levava, mas não ficava”, conta.

A dona da escola e primeira professora de Gustavo, Helen Moreira, contou que o aluno chegou a desistir de frequentar as aulas de dança por causa do bullying que sofria dos colegas de classe.

“O Gustavo foi o nosso primeiro aluno menino. Ele entrou na escola de forma muito curiosa, queria participar de todas as aulas. Logo nos primeiros dias, ele sumiu. Fomos atrás por causa do talento dele e tinha desistido porque estava sofrendo bullying”, diz a professora.

O bailarino revela que no primeiro contato com a dança não tinha dimensão onde poderia chegar e nem que isso se tornaria uma profissão. Durante a adolescência, ele estudava pela manhã, trabalhava em uma loja de peça de veículos a tarde e ensaiava a noite. “As pessoas me questionavam por que eu fazia balé, diziam que sonhava demais, que tinha que colocar meus pés no chão”.

DESTAQUE 

Foi com anos de treinamento e ensaio que Gustavo começou a participar de competições estaduais e nacionais até que chegar a final do Youth America Grand Prix, maior competição de estudantes de balé do mundo, aos 16 anos. Nessa competição, Gustavo recebeu o convite para ser bolsista em duas escolas de dança: uma nos Estado Unidos (EUA) e outra na Alemanha.

“Me deparei com vários bailarinos do mundo inteiro disputando uma vaga de emprego, uma bolsa de estudo. Quando eu recebi a proposta estava em uma sala com outras 250 crianças. Optei em ir para os Estados Unidos”, contou o bailarino, que mesmo sem saber falar inglês decidiu se arriscar. Para isso, ele contou com o apoio financeiro de colaboradores da escola, que conseguiram o dinheiro para a passagem dele.

DIVISOR DE ÁGUAS 

A escola que ofereceu a bolsa de estudo para ele foi a “The Washington Ballet”, onde concluiu os estudos de balé em dois anos. Gustavo iniciou a vida profissional aos 19 anos, na “Kansas City Ballet”, onde ficou por três anos. Agora ele dança no Miami City Ballet uma das 10 melhores companhias do mundo e está entre as cinco principais empresas estadunidenses.

“É gratificante ver as pessoas que achavam que eu não ia chegar a lugar nenhum, saberem que eu estou fora do País, que estou sendo reconhecido por isso. Hoje, o balé minha profissão, é minha carreira”, afirma Gustavo.

Além de carreira, o bailarino considera a dança como um divisor de águas que transformou sua realidade. Por isso, ele quer amplificar isso para outras crianças no futuro com um projeto social.

“Foi realmente um divisor de águas. Como eu venho de uma família muito humilde e nunca poderia viver o que eu vivo hoje se não fosse pela dança. Sinto que eu tenho uma obrigação de dizer para as pessoas que independente de onde você veio, isso não te define. Você que define o futuro que quer traçar. Mesmo que não tivesse asas para voar, eu tenho meus pés e sabia que a dança ia me levar em algum lugar”, completa.

ENTREVISTA

Gustavo, como você descobriu o balé?

“Desde criança eu sempre gostei muito de arte. Participava das festas juninas no colégio, de peças de teatro e eu sempre tive esse espírito de gostar de dança, de musical. Uma vizinha minha estava assistindo a minha apresentação na escola e disse que eu deveria fazer balé. Eu não sabia o que era e ela me disse que era um tipo de dança. A dona da escola, Helen, me ofereceu uma bolsa e foi minha primeira professora. Comecei quando eu tinha 12 anos.

E quando decidiu que faria da dança a sua profissão? Sofreu preconceito?

“Quando eu entrei não tinha dimensão de onde a vida poderia me levar. Que isso se tornaria uma profissão para mim. Foi aqui dentro da escola, com horas e horas de ensaio que a gente começou a participar dos campeonatos estaduais, depois dos nacionais, até que eu recebi a oportunidade para participar das finais da Youth America Grand Prix, em Nova Iorque. Nessa época eu tinha 16, quase 17 anos. Chegando lá, me deparei com vários bailarinos do mundo inteiro disputando uma vaga de emprego, uma bolsa de estudo, e eles me ofereceram uma proposta de estudo para Alemanha e outra nos Estados Unidos.

Cariacica ainda não estava preparada para ver meninos dançando, tanto que eu fui um dos primeiros meninos a fazer balé no município. Foi difícil, porque todo mundo via o balé como uma coisa só para meninas. Eu quis sair, eu quis desistir. Eu tive apoio da minha avó, ela nunca foi contra nem a favor. Se eu precisasse ir em uma apresentação, ela me deixava e ia embora e sempre foi assim.

E como foi esses anos no exterior? Sabia falar inglês?

“Eu fui para lá como estudante, concluí os estudos em dois anos e depois ingressei na carreira profissional. Normalmente, a gente estuda oito anos de balé para que possa tentar a oportunidade de ser um profissional. Recebi meu primeiro contrato com 19 anos. A empresa que estou hoje, o Miami City Ballet, está entre as 10 melhores companhias do mundo e entre as cinco melhores dos Estados Unidos”.

Nessa época eu não sabia falar inglês. Eu fiquei nos Estados Unidos muito tempo assim. O interessante do balé é que, independente do idioma que o país fale, ele usa uma linguagem universal. Os passos são sempre os mesmos. Desde que me mudei eu sabia que teria que aprender um outro idioma e outra cultura. Eu tive muitos amigos hispânicos e quando eu aprendi inglês, eu ensinava para eles. Acabei aprendendo espanhol assim também”.

O que o balé mudou na sua vida?

“Eu já conheci vários países, várias culturas, consegui trabalhar com várias pessoas renomadas no mundo da dança. Se não fosse pelo balé, eu não teria vivido isso. Foi realmente um divisor de águas e me proporcionou qualidade de vida. Como eu venho de uma família muito humilde, sei que para a minha realidade eu nunca poderia viver o que eu vivo hoje se não fosse pela dança. Eu tenho muita facilidade em saltar e vejo o mundo dessa forma: mesmo que não tivesse asas para voar, eu tenho meus pés e sabia que a dança ia me levar em algum lugar”.

Como é sua relação com o Brasil? Pretende voltar?

“Eu sempre volto para o Brasil porque é aqui que eu recarrego minhas energias e eu tenho amigos muito queridos aqui. Parte da minha família já se foi, eu só tenho um meio irmão, mas eu tenho amigos que se tornaram família. A Helen se tornou minha família.

Eu volto como bailarino profissional que pode ensinar outras pessoas e passo meus conhecimentos. Eu quero crescer na companhia que estou hoje e chegar a ser o principal, que é o cargo máximo. Ainda quero conhecer o mundo e adquirir mais conhecimento para que um dia eu possa continuar passando meu conhecimento.

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Sinto que eu tenho uma obrigação de dizer para as pessoas que, independente de onde você veio, isso não te define. Você que define o futuro que quer traçar. Basta você se dedicar muito e saber reconhecer as oportunidades que batem na sua porta. Meu objetivo de vida é fazer história”.

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