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Esporte, meditação e arte contra a depressão

Esporte, meditação e arte contra a depressão

Muitos pacientes praticam as atividades como estratégia para lidar com a doença, aliando ao tratamento convencional

Publicado em 15 de setembro de 2019 às 08:00

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Kheinny Martins, 22 anos, pratica corrida e outras atividades esportivas e artísticas para lidar com a depressão. (Ricardo Medeiros)

Com um ritmo de crescimento elevado, a depressão atinge mais de 11 milhões de pessoas no país. Entre os cuidados com medicamento e terapias, muitos pacientes também estão buscando outros recursos para lidar com a doença. Prática de esportes, meditação, arte são atividades que podem ajudar a combater a depressão.

Todas são estratégias complementares, ou seja, não vão substituir o tratamento convencional. Contudo, como dão sensação de prazer, contribuem para melhorar o estado emocional de quem apresenta um quadro depressivo.

É como se sente o auxiliar administrativo Kheinny Martins que hoje, aos 22 , encontrou nas artes e nos esportes ferramentas para enfrentar a depressão. Mas foram anos de muitos conflitos, do divórcio dos pais ao isolamento. Ao comentar como se sentia com familiares, ouviu que era “um adolescente querendo aparecer.” Teve pensamentos suicidas, se mutilou, abusou de álcool e drogas.

Com 16 anos, Kheinny começou a fazer terapia por indicação de uma amiga. “Foi muito bom porque eu não me sentia tão sozinho e sabia que teria uma pessoa disposta a me ouvir”, lembra. Depois, entrou numa clínica de reabilitação e, ao deixar a internação, decidiu que se cuidaria também de outras maneiras. Faz musculação, teatro, dança de salão e hip-hop.

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Antes, não fazia nenhuma atividade. Também gosto de correr na beira da praia. Isso tudo me ajuda

Kheinny Martins, auxiliar administrativo
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Para Amauri Domingos, os primeiros sinais da depressão surgiram após duas situações intensas na sua vida: a perda de um namorado que, aos 18 anos, teve um mal súbito, e a mudança de Recife (PE) para Vitória. “Num primeiro momento, achei que fosse apenas estresse por estar vivendo em uma nova cidade.”

Amauri Domingos pensou em tirar a própria vida por duas vezes. (Arquivo Pessoal)

Mas Amauri vivia cansado, triste, preocupado e decidiu buscar tratamento. Ainda assim, tentou tirar a vida por duas vezes. Somente após um período passou a se sentir mais equilibrado. Além da terapia, ele começou a fotografar.

Foi na fotografia que a universitária Ana Carolina Rangel, 20, também reconheceu um caminho para lidar com a depressão, quadro que desenvolveu a partir de um período muito estressante de preparação para o Enem. 

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Eram 16 horas de estudos para passar no vestibular. Vivia a base de café, de remédio para dormir, outro para acordar. Na minha formatura, estava pesando 39 quilos; era só osso

Ana Carolina Rangel, universitária
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Ana Carolina Rangel: "a fotografia é minha válvula de escape". (Carlos Alberto Silva)

Já na Ufes, precisou lidar com problemas familiares que a abalaram profundamente e foi diagnosticada com a doença. Durante um tempo, omitiu a condição da família porque não queria que ninguém tivesse pena dela. Até que teve uma crise perto do pai. Hoje, faz acompanhamento com psiquiatra e psicólogo e descobriu que a fotografia também pode ser uma terapia. Ela faz ensaios intimistas de mulheres.

“A ideia é valorizar a autoestima delas, mostrar o quanto são bonitas de várias formas. Então, eu fico feliz vendo a felicidade delas. Ali, há uma troca de experiências. A fotografia é minha válvula de escape”.

Até bebês podem ter sintoma da doença

Antônio Geraldo da Silva diz que irritabilidade é um dos sinais de depressão em bebês. (Divulgação/ABP)

Diversas faixas etárias estão predispostas ao aparecimento da depressão, de bebês a idosos. A prevalência e incidência é maior em jovens de 18 a 29 anos do que em pessoas acima dos 60, por exemplo, mas isso não significa que pessoas de outras idades não estejam sujeitas ao desenvolvimento da doença.

É o que afirma Antônio Geraldo da Silva, presidente da Associação Psiquiátrica da América Latina (Apal) e diretor e superintendente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).

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Nas crianças, especialmente em bebês, a irritabilidade é um dos sintomas que precisam ser observados pelos pais. Em crianças maiores, alguns dos sintomas são: baixo desempenho escolar, pouca vontade de se divertir, excesso ou falta de sono, mudança na alimentação, e também há a presença da irritabilidade

Antônio Geraldo da Silva, presidente da Associação Psiquiátrica da América Latina (Apal)
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 A manifestação de doenças, esclarece Antônio Geraldo, se deve a dois fatores: predisposição genética e aspectos ambientais. As duas características combinadas determinam se a pessoa vai ter ou não qualquer tipo de doença, como é caso da depressão.

No caso dos bebês, embora a carga genética tenha influência, o ambiente não é um fator desconsiderado. O psicólogo clínico Jairo Tadeu Guerra explica que bebês que são afastados da mãe prematuramente estão sujeitos a vivenciar momentos depressivos porque têm uma sensação de perda, de abandono.

ESTRESSE

Na sua experiência clínica, Jairo Tadeu diz que, atualmente, a condição mais frequente de depressão está relacionada ao estresse. Pelo menos 90% dos casos atendidos em seu consultório referem-se a pessoas que vivem um estado de exaustão, de desânimo profundo, vontade de ficar isolado.

“Não é depressão pela perda de alguém querido, um luto não elaborado. São estudantes, adultos no auge de sua força de trabalho, que passam por altas exigências no seu dia a dia, a cobrança por ser bem-sucedido”, conta.

Na terapia, o psicólogo revela que, muitas vezes, precisa ensinar os pacientes a diminuir o ritmo, a relaxar em contraponto ao mundo externo que propaga que é preciso acelerar.

A depressão é uma doença mental que precisa ser tratada, assim como são tratados os males do corpo, considerando que é um dos principais gatilhos do suicídio. “Ainda há muito preconceito em relação à doença, e falta de cuidado no tratamento. Quando há indicação de remédio, muitos param no primeiro sinal de melhora por conta própria. Mas pergunto: se fosse hipertensão, diabetes, alguém iria parar?”, questiona o psiquiatra Fausto Amarante.

 ENTENDA A DEPRESSÃO

O que é

 Transtorno mental e a principal causa de incapacidade no mundo. Mulheres são mais afetadas do que homens, e a prevalência maior é entre os jovens. Mas até bebês podem ser diagnosticados. Nos casos mais severos, pode levar ao suicídio.

Fatores

 A doença é resultado de fatores sociais, psicológicos e biológicos. Pessoas que passam por situações adversas como luto e desemprego são mais propensas a desenvolvê-la.

Alguns fatores da atualidade contribuem para o desenvolvimento de doenças mentais, tais como o estresse, o tipo de relações de trabalho, o uso excessivo de redes sociais, o consumo de drogas.

Tratamento

 Os quadros mais leves de depressão podem ser tratados somente com psicoterapia, e as linhas cognitivo comportamental e interpessoal apresentam bons resultados. Para casos moderados a graves, é imprescindível o uso de medicamentos, que são administrados em combinação com a psicoterapia.

Também pode-se indicar ao paciente mudança no estilo de vida, tendo em vista os fatores ambientais. Exercício físico e alimentação saudável são aliados no tratamento, assim como atividades de relaxamento e meditação.

Mitos

 Muitos ainda consideram a depressão como um estado passageiro de espírito, relacionado à falta de espiritualidade, ao desânimo, à falta de coragem. Não é isso. A depressão é um processo complexo e com implicações químicas e hormonais no cérebro do paciente. Falar que é "falta de religião", pedir para a pessoa "ter ânimo", ou "acordar para a vida" são atitudes que apenas reforçam o estereótipo negativo da doença, aumentando o preconceito e o estigma.

Família

 Familiares e amigos devem encaminhar a pessoa ao tratamento adequado. Se oferecer para acompanhá-lo ao psiquiatra pode ser uma das primeiras iniciativas.

Canal de ajuda

O Centro de Valorização à Vida (CVV), é um dos principais canais que prestam apoio emocional para as pessoas que estão passando por um momento de crise. São feitos atendimentos de todo o território nacional e eles prezam pelo sigilo e o anonimato. O atendimento pode ser feito pelo telefone 188. 

Fonte: Organização Mundial de Saúde (OMS) e especialistas consultados

 

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