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Produção familiar leva café capixaba para o mundo

Produção familiar leva café capixaba para o mundo

Pequenos produtores ganham destaque com grãos de qualidade

Publicado em 28 de janeiro de 2018 às 00:45

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Café de José Carlos Velten tem qualidade e sabor especial. (Marcelo Prest)

As grandes fazendas capixabas fizeram do Espírito Santo um dos maiores produtores de café do Brasil, mas agora são os pequenos produtores que têm projetado o Estado no seleto grupo dos grãos especiais que têm conquistado reconhecimento internacional pela qualidade da bebida.

Um desses produtores é José Carlos Velten, 41 anos. Fruto do esforço e trabalho do meeiro em uma terra da qual ele não é o dono, saiu um dos melhores grãos do Estado em 2017.

A lavoura que ele e a família cuidam, localizada no distrito de Alto Nova Almeida, em Marechal Floriano, Região das Montanhas capixabas, ultrapassou as barreiras do país por causa da sua qualidade e sabor especial, despertando a atenção até de compradores de países como Japão e Jamaica.

Estevão Denizar (à direita) e o filho produzem cafés especiais para exporta. (Marcelo Prest)

A colheira é entorno de 150 sacas de café por ano, sendo que de 40% a 50% desse total são compostos por grãos especiais. “É um orgulho ver que o que eu produzi foi premiado e pode ganhar o mundo. Cresci nesse meio e, hoje, meus três filhos me ajudam. O mais velho, que tem 18 anos, quer fazer agronomia e ficar por aqui”, revelou José Carlos.

A família dele é uma das 131 mil que produzem café no Estado. Segundo dados do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), o número representa 73% da agricultura familiar capixaba.

Assim como o café do José Carlos está conquistando espaço no mercado externo, segundo o Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), há uma procura crescente pelos grãos brasileiros de alta qualidade.

Os cafés diferenciados, aqueles que têm qualidade superior ou algum tipo de certificado de práticas sustentáveis, foram responsáveis por 5,1 milhões de sacas de 60 quilos vendidas ao mercado externo, o que representou 16,7% do total de grãos exportados pelo Brasil em todo o ano passado.

Dentro dessa categoria estão os cafés especiais, cujo valor de mercado é mais elevado. Em 2017, o país exportou 105,5 mil sacas de arábica tipo especial, que foram vendidas, em média, a US$ 221,75 cada. Já o do tipo bebida mole, como é chamado o café com nota mais elevada entre os grãos especiais, foram exportados 7,8 mil sacas a US$ 277,63 cada, em média.

DE PAI PARA FILHO

A família Douro cultiva café arábica há gerações. O Estado virou a casa dos bisavós do produtor Estevão Denizar Douro, 55 anos, quando eles chegaram da Itália e da Alemanha, há mais de um século e meio. Hoje, o cafeicultor exporta a cultura da família para Japão, Holanda e Inglaterra. Como ele mesmo disse: “plantar é uma tradição da família”.

A propriedade de 42 hectares fica na região de Victor Hugo, em Marechal Floriano. Dessa área, dez hectares são destinados ao plantio dos grãos e, por ano, ele, dois filhos e a esposa produzem 250 sacas de café.

Em média, a saca da bebida Rio - de qualidade inferior - é comercializada na região por, no máximo, R$ 400 a saca. Já os especiais são mais valorizados. Devido às boas colocações em prêmios municipais e estaduais que o produto teve, um dos lotes chegou a ser vendido por R$ 1,3 mil cada saca.

Para agregar valor ao que produz, em 2014, começou a comprar alguns equipamentos para torrar e moer os grãos. Hoje, além de comercializar a saca, vende direto para o consumidor final em embalagens de 250 e 500 gramas.

UNIÃO

Vender a produção por um bom preço garante ao produtor lucro para que ele possa investir no ano seguinte. O cafeicultor Edmar Busato, 42, sabe disso e busca um valor melhor para a vender o que ele e a família produzem. Ele faz parte da Cooperativa Agropecuária Centro Serrana (Coopeavi) e, dependendo da oferta que recebe, vende para a cooperativa ou para uma corretora de café.

“Teve um café especial que cheguei a vender um lote por R$ 1,7 mil a saca no ano passado porque ele conquistou 91 pontos (em uma escala de 0 a 100) na qualificação. Um outro lote vendi a R$ 1,5 mil para a cooperativa”, revelou.

De acordo com Giliarde Cardoso, gerente do Negócio Café da Coopeavi, cerca de 7,8 mil produtores de café fazem parte do grupo. “O nosso trabalho é de padronização do café conforme as exigências do mercado internacional, levando o café do produtor para o exterior”, disse. O café é exportado para Itália, Alemanha, Rússia, Estados Unidos, Holanda, China, Suíça e Singapura.

Ainda segundo Cardoso, os cafés exportados são vendidos com rastreabilidade, “uma vez que o público consumidor de cafés especiais deseja saber a procedência e a história dos produtores por trás da embalagem”.

CAPARAÓ

Não é só o café das montanhas que são premiados e conquistam os cinco continentes. Em Dores do Rio Preto, na Região do Caparaó, um café sem agrotóxicos vem conquistando seu espaço. Em dez hectares de plantação no Espírito Santo e 20 em Minas Gerais, o cafeicultor Afonso Lacerda, 45, produz 750 sacas do grão de conilon por ano.

Ele já ganhou cerca de 40 prêmios, entre nacionais, estaduais e municipais, em oito anos. “As premiações têm uma credibilidade muito boa. Isso facilita conquistar o mercado. O mundo do café está todo ali olhando e, quando tenho destaque, a procura é maior”, diz o produtor Afonso Lacerda, 45.

Cafés especiais têm mais valor

Um café com aroma e sabor agradáveis, brando e doce naturalmente. Essas são algumas características do café especial. Mas, entre ele e o produto comum, aquele que todo mundo compra no supermercado e faz em casa, além da qualidade, há outra grande diferença: o preço. Uma saca do café conilon especial, por exemplo, chega a custar até 34% a mais que a do grão tradicional.

Café especial possui aroma e sabores diferenciados. (Marcelo Prest)

O preço de venda dos grãos corresponde à qualidade da bebida e reforçam a valorização que esses grãos possuem no mercado. Segundo os dados do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil, em 2017, enquanto o conilon tradicional foi vendido, em média, a US$ 152,44 a saca, o café especial foi comercializado a US$ 231,97, em média, a saca, uma diferença de quase US$ 80 entre os dois tipos.

Já no caso do arábica, a diferença é um pouco menor, mas ainda assim mais valorizado que o produto comum. Em 2017, a saca do café tradicional foi exportada, em média, a US$ 159,62, enquanto a saca do grão especial foi vendido, em média, a US$ 221,75.

CONSUMO

Segundo o presidente do Centro de Comércio de Café de Vitória (CCCV), Jorge Luiz Nicchio, o aumento na procura por cafés especiais é uma forte tendência em função das grandes cafeterias do mundo inteiro, que optam por cafés diferenciados. Para ele, esse é um caminho sem volta, já que “cada vez mais o consumidor comum também tem procurado esses cafés diferenciados”.

Segundo Nicchio, o café especial, por ser vendido a um preço maior que o normal, gera mais receita para produtores e o país.

Para se ter uma ideia do aumento na procura pela bebida de qualidade, enquanto o mercado de exportação do grão comum cresce entre 1,5% e 1,8% ao ano, o de cafés especiais está crescendo acima de 15% ao ano, explicou Silvio Leite, consultor de qualidade de cafés especiais.

“Os grãos de qualidade e premiados são mais visados e ganham o exterior. Quando um comprador leva esse café especial e outros países reagem bem ao produto, é natural que a demanda por ele aumente”, explica.

SABOR CAPIXABA

E de café de qualidade o Espírito Santo entende, tanto que um produto arábica do Estado figura entre os mais caros do mundo. Ele foi produzido em Domingos Martins e, em 2017, foi leiloado a R$ 39 mil a saca.

Segundo Silvio Leite, os grãos capixabas são um pouco mais adocicados e têm uma acidez mais marcante. “Os melhores lotes capixabas são de colheita tardia. Quanto mais tempo leva entre a floração até o fruto ficar em ponto de colheita, significa que a maturação vai demorar mais porque a fruta vai amadurecer mais devagar. Essa maturação mais lenta provoca doçura e acidez no grão. Com isso, cada produto tem sua característica específica”, explica.

SAIBA MAIS

O que é um café especial?

Edmar Busato já chegou a vender uma saca de café especial por R$ 1,7 mil. (Marcelo Prest)

Café com elevada qualidade de bebida. Para ser considerado especial, um café precisa ter classificação mínima de 80 pontos, de acordo com a metodologia SCAA criada pela Specialty Coffee Association of America (Associação Americana de Café Especiais - SCAA). Em alguns casos, ele também é chamado de gourmet.

Como ele é avaliado?

Por meio da prova. Nela, dez diferentes atributos do café são verificados e recebem uma nota individual de zero a dez pontos cada um, como: fragrância e aroma, uniformidade, ausência de defeitos, doçura, sabor, acidez, corpo e geral.

Quanto já chegou a custar?

No final do ano passado, uma saca de 60 quilos de café arábica natural produzido região de Pedra Azul, em Domingos Martins, foi vendido a R$ 39 mil em um leilão. Foi o maior preço pago no mundo.

Os preços dos café são diferentes?

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Quanto maior for a nota do grão, segundo a metodologia SCAA, mais caro ele vai ser. Uma bebida Rio, como é chamado os grãos tradicionais, vai custar menos que a feita de grãos especiais. Ou seja, quanto mais refinado for a bebida, mais caro vai ser o café.

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