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Estado tem 1.594 casas populares prontas, mas sem nenhum morador

Estado tem 1.594 casas populares prontas, mas sem nenhum morador

Realidade atinge famílias da faixa mais carente atendida pelo Minha Casa Minha Vida. Outras 4,5 mil unidades estão atrasadas ou foram abandonadas

Publicado em 12 de março de 2018 às 09:36

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João e Mariane Campos e as filhas Ana Júlia e Ana Lívia esperam por novo lar. (Ricardo Medeiros)

O dia é 8 de março, quinta-feira da semana passada, por volta de 18h. A chuva forte que caía amedrontava a dona de casa Mariane Campos Teodoro, 25 anos, que mora em uma casa simples à beira de um barranco no bairro Operário, Cariacica, com o marido, João Paulo, 24 anos, que é ajudante de pedreiro, e as filhas Ana Júlia e Ana Lívia, de 7 e 5 anos. No entanto, a situação deveria ser outra. A família tem um apartamento prontinho do Programa Minha Casa Minha Vida (MCMV), há menos de um quilômetro dali, mas que não foi liberado para os moradores.

Eles foram contemplados com uma unidade do Residencial Apolônio Carvalho, que fica no mesmo bairro. O empreendimento, que irá receber 120 famílias, começou a ser construído em 2012, e foi concluído no ano passado, no entanto, não é entregue. “O que adianta fazer e ficar lá abandonado enquanto a gente fica aqui passando dificuldade?”, questiona Mariane.

“A gente vive em situação de risco, sem segurança, chovendo dentro de casa. É um barraco só com um quarto, onde a gente se espreme para dormir, e uma cozinha. Nem banheiro tem. Quando precisa usar, tem que ir no vizinho. O apartamento está pronto faz tempo mas não liberam para a gente mudar, é uma demora angustiante”, desabafa a dona de casa.

A família de Mariane é uma das 1.594 que possuem renda mensal até R$ 1,8 mil no Espírito Santo ganharam uma unidade do programa habitacional, estão com a casa pronta, mas não podem morar. São residenciais concluídos mas que não foram entregues para as famílias por irregularidades apontadas nas construções.

Outras 4.524 unidades ainda estão em fase de obras, no entanto todas estão com o cronograma atrasado ou até mesmo paralisados e abandonados. Ao todo, uma em cada três das 17.857 casas contratadas desde 2009 pelo governo federal se enquadram nessas situações.

ESPERA

Maria Helena e o neto Vitor em frente ao novo lar. (Ricardo Medeiros)

Da porta de sua pequena casa, a doméstica Maria Helena dos Santos, 55 anos, no bairro Operário, Cariacica, consegue ver o conjunto Apolônio Carvalho, onde espera um dia morar. Ela se mudou para lá há três meses com filho e o neto Vitor, justamente para ficar mais perto do futuro lar e se acostumar com a região. No entanto, o plano era ficar apenas um mês no imóvel, já que a casa nova estava prometida para fevereiro. Só que até agora nada aconteceu.

“A gente veio em janeiro porque eles diziam que mudaríamos em fevereiro. Mas ficou para abril. Tem mais de um ano que está pronto e não deixam a gente morar, enquanto isso está abandonado, começando a ter rachaduras dos lados, cheio de mato. E eu vou pagando aluguel com um dinheiro que não tenho”, comenta.

O programa do Ministério das Cidades contratou nos últimos nove anos 38 conjuntos residenciais no Estado, investindo R$ 745,2 milhões em unidades da faixa 1, que é destinada às pessoas mais pobres e que vivem em situação de risco e vulnerabilidade social.

Nessa situação também se enquadra a faxineira Helena Loureiro Rocha, 57 anos, que teve que sair da sua casa que estava em risco de desabar em Cariacica. Há cinco anos ela espera pelo novo apartamento, que já está pronto, mas enquanto não é entregue ela tem que pagar aluguel.

Helena Loureiro teve que sair de casa que corria risco de desabar e paga aluguel. (Ricardo Medeiros)

“Tem que tirar dinheiro de onde não tem para pagar a casa, onde moram eu e meus quatro netos. Preciso recorrer ao dinheiro do Bolsa Família deles. Estamos todos ansiosos para receber nossa casa nova, que é nosso maior sonho”, conta.

O tempo de espera pela tão sonhada vida nova prometida pelo programa só aumenta. Em Cachoeiro de Itapemirim, no Sul do Estado, 1.248 famílias aguardam há pelo menos nove anos a entrega do Residencial Otílio Roncete, no bairro Gilson Carone. Segundo o Ministério das Cidades o conjunto está pronto, mas também não foi entregue.

Com esperança de ter a casa própria, a cozinheira Júlia Maria de Oliveira, 57, se inscreveu para conseguir uma unidade no programa em 2009. Ela morou a vida toda em casas alugadas e sonha em poder ter um lar para chamar de seu.

Júlia Maria de Oliveira tem direito a uma unidade do Residencial Otílio Roncete . (Geisy Gomes)

“Quando me inscrevi para conseguir o apartamento meus filhos não eram nem casados. Hoje eles casaram e já tenho neto de seis anos. Tem muito tempo isso. Agora disseram que vão chamar a gente para ver a unidade e estou muito ansiosa para entrar na casa que vai ser minha”, diz.

OUTRO LADO

A reportagem questionou o Ministério das Cidades, a Caixa Econômica Federal, e as prefeituras dos municípios citados sobre a demora na entrega das unidades.

Segundo o ministério, na maioria dos casos, essa demora entre a conclusão e entrega das unidades “está relacionado à legalização do empreendimento e à assinatura dos contratos com os beneficiários, para os quais não há como determinar uma previsibilidade de prazo”, informou.

A Caixa, que atua como agente financeira do programa, ressaltou que foram entregues 74% das unidades contratadas no Estado e que as obras que estão paradas estão em fase de retomada.

Quanto à entrega das unidades do Residencial Apolônio de Carvalho, a Prefeitura de Cariacica explicou que as obras foram concluídas há cerca de um ano e que passaram por uma vistoria do Corpo de Bombeiros no início desse ano, que apontou irregularidades e a empresa responsável pela obra está realizando as adequações. A previsão da prefeitura é que os beneficiários recebam as chaves dos 120 apartamentos em abril.

Já sobre o Residencial Otílio Roncete, a Prefeitura de Cachoeiro disse que convocou 100 candidatos na última semana para atualização do cadastro. Segundo a administração, somente a Caixa poderá informar a data de entrega das moradias. (Com informações de Geizy Gomes).

GOVERNO ADMITE PROBLEMAS

Acionado por A GAZETA, o Ministério das Cidades, gestor do Minha Casa Minha Vida, admitiu problemas em alguns empreendimentos. Em todo país, foram identificadas 89 mil unidades paralisadas, tendo sido autorizada a retomada das obras de 56 mil.

Segundo o ministério, tanto nos casos de atraso nas obras ou de demora de entrega para beneficiários, não se trata de falta de pagamentos às empresas executoras das obras, pois, de acordo com a nota “não tem havido restrições para disponibilização de recursos para obras contratadas”.

O ministério ressalta que, desde a construção até a entrega, a responsabilidade da obra é da construtora contratada, bem como da instituição financeira, a quem compete acompanhar.

PROGRAMA NO ES

Conjuntos prontos, mas não entregues

Residencial Apolônio de Carvalho

120 unidades no bairro Operário, em Cariacica.

Residencial Otílio Roncete

1.248 apartamentos no bairro Gilson Carone, em Cachoeiro de Itapemirim.

Outros

Outras 226 casas prontas que foram contratadas de forma isolada não foram entregues.

Obras atrasadas

Residencial Vista Linda

448 apartamentos com obras em atraso em Ulisses Guimarães, Vila Velha.

Obra do Residencial Vista Linda, em Ulisses Guimarães, Vila Velha, está atrasada. (Ricardo Medeiros)

Residencial Barra do Riacho

537 unidades em obras em Barra do Riacho, Aracruz.

Residencial Alegre

431 casas em Sooretama.

Residencial Mata do Cacau

992 unidades com obras paralisadas em Linhares.

Condomínio Solar de São Mateus

500 apartamentos com entrega em atraso em São Mateus.

Entregues

17.857 unidades em Vitória, Guarapari, Linhares, Vila Velha, Colatina, Cachoeiro, Aracruz, São Mateus, Jaguaré e Serra.

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Fonte: Ministério das Cidades

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