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Quem não paga dívida agora pode ter a CNH suspensa

Quem não paga dívida agora pode ter a CNH suspensa

Justiça bloqueia documentos de quem não quita dívidas

Publicado em 7 de junho de 2018 às 00:42

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Carteira de motorista está na mira da Justiça contra devedores. (Gabriel Lordêllo )

Inadimplentes começam a ser alvo de ações que pedem até a suspensão da carteira de motorista com a intenção de forçar a quitação das dívidas em atraso. A medida extrema já é adotada por alguns magistrados e tem sido mantida por ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Em pelo menos três processos analisados nos últimos dois meses pela Corte, os endividados permaneceram com a CNH invalidada. Na maioria dos casos, a pessoa alega não ter patrimônio para honrar os compromissos com os credores, porém, apresenta uma vida de ostentação, levantando a suspeita sobre o uso de laranjas para ocultar recursos financeiros.

O bloqueio de documentos, como a carteira de motorista e mesmo o passaporte, passou a ser uma alternativa quando contas-correntes, investimentos e outras propriedades não são encontrados para a penhora.

Consumidores com dívidas com bancos, escolas e outros credores e donos de empresas com débito com fornecedores ou mesmo trabalhista podem ser punidos dessa forma. O valor do débito pode ser baixo, de R$ 1.000, por exemplo, ou até alcançar cifras milionárias.

Para tomar essas atitudes, juízes aplicam o artigo 139 do novo Código de Processo Civil. O trecho dá poder aos magistrados para adotar essas providências.

Um das situações julgadas recentemente envolve um ex-senador da República, herdeiro de um grande grupo de transporte de Brasília. A empresa faliu, mas a Justiça não encontrou bens em seu nome. Porém, ele mantinha um alto padrão de vida, usando carros de luxo em nome de terceiros.

A juíza do caso, ao decretar a suspensão, justificou que a atitude se tratava de uma medida de exceção, já que todos os meios para recuperar R$ 8 milhões tinham se esgotado. Esse entendimento foi mantido por um ministro do STJ.

O advogado Rafael Vasconcelos diz que esse tipo de decisão não deve abranger todos os inadimplentes. “É claro que os bancos, por exemplo, ao executar uma pessoa agora vão incluir essas situações nas ações. Mas esse tipo de cobrança não deve virar regra e sim ser aplicada apenas quando não é possível encontrar bens do devedor”, explica ao acrescentar que a medida é perigosa ao poder restringir os direitos de ir e vir. “Pode atrapalhar quem trabalha como taxista ou motorista de ganhar seu sustento.”

A coordenadora da Proteste Maria Inês Dolci acredita que esse tipo de determinação é exagerada, já que existem outras formas de punir sem tirar alguns direitos do cidadão. “O medo é disso virar febre. Uma decisão não pode violar a liberdade do consumidor. Não pode ser desproporcional. A apreensão de dados precisa ser bem dosada para não violar o direito de liberdade”, opina. “Para mim, é algo que só deve acontecer quando há má-fé, quando alguém oculta bens para não pagar essas dívidas.”

ENTENDA

BLOQUEIO DE DOCUMENTOS

Quem são os alvos

Devedores que não têm bens em seus nomes, mas ostentam vida de luxo, por exemplo. Ou inadimplentes que não cumprem com as determinações judiciais.

Suspensão da CNH

A Justiça entende que o bloqueio da CNH não impede o direito da pessoa de ir e vir, já que ela pode usar o transporte público. Mas a medida é tomada só em casos exepcionais, quando todos os meios para quitação do débito falharam.

BLOQUEIO DE PASSAPORTE

É usado quando a pessoa inadimplente tem bens guardados no exterior.

DÍVIDAS DO CONSUMIDOR

O que pode ser bloqueado

O inadimplente pode ter, a princípio, o CPF bloqueado, impedindo-o de fazer compras e abrir conta em banco, por exemplo. Se não pagar as dívidas, também pode ter as contas-correntes bloqueadas. Bens como imóveis podem ser penhorados caso a dívida seja de condomínio ou de financiamento imobiliário, ou se o bem foi dado em garantia em algum empréstimo. Conta salário, móveis e eletrodomésticos e o saldo da caderneta de poupança no valor de até 40 salários mínimos não podem ser tomados.

EMPRESÁRIOS

O que pode se penhorado

Bens como imóveis, se não for onde a família vive, carros, contas-correntes para pagar, por exemplo, dívidas trabalhistas ou com outros fornecedores.

TELEVISÃO PODE SER APREENDIDA POR CREDOR

Não pagar uma conta em atraso pode fazer o consumidor perder diversos bens, alguns que ele tem até dentro de casa. Produtos que não são considerados essenciais para a sobrevivência podem ser penhorados para quitar parte dos débitos. O advogado especialista em Defesa do Consumidor, Igor Britto, diz que na lista estão televisão, computadores, videogames, joias e obras de arte, por exemplo.

“O que está protegido é algo considerado bem de família, como o imóvel que a pessoa vive, o fogão e a geladeira”, destaca ao acrescentar que o carro pode ser apreendido para pagar os débitos desse devedor.

Britto explica que antes de ingressar com uma ação na Justiça, as empresas, geralmente, realizam cobranças extrajudiciais, enviando cartas, incluindo o nome do cliente nos órgãos de proteção ao crédito ou adotando protesto em cartório. Quando o cliente não paga as contas, o credor pode entrar com um processo de cobrança. Após o fim da ação, a Justiça pode definir o patrimônio a ser alcançado.

PASSAPORTE

Enquanto a Carteira de Motorista pode ser um alvo fácil das ações de cobrança, suspender o Passaporte, apesar de possível, pode ser um pouco mais complicado.

O Superior Tribunal de Justiça, em decisão da Quarta Turma na última terça-feira, 5, definiu que esse documento só pode ser bloqueado em situações específicas, quando, por exemplo, o devedor tem bens no exterior.

O caso julgado era de um consumidor com dívida de mais de R$ 16 mil om uma escola. Ele pedia ao STJ um habeas corpus para desbloquear seus documentos. O Passaporte voltou a ter validade, mas a CNH dele permaneceu suspensa.

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Em voto, o relator do processo, o ministro relator Luís Felipe Salomão, considerou que a adoção de medidas “indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias” é importante para viabilizar a execução de decisões. Mas ressaltou que essas medidas devem ser proporcionais e não ferir direitos constitucionais, como a liberdade de deslocamento.

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