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Entenda a origem e os desdobramentos da crise global de 2008

Entenda a origem e os desdobramentos da crise global de 2008

Quebra do Lehman Brothers foi o estopim de uma recessão econômica não vista desde a Grande Depressão

Publicado em 14 de setembro de 2018 às 12:47

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Quebra do Lehman Brothers deu início à crise de 2008. (Thanassis Stavrakis/AE)

Em 15 de setembro de 2008, o banco de investimentos americano Lehman Brothers, um gigante do mercado financeiro global, foi à lona, arrastado por uma bolha imobiliária que começou no início dos anos 2000 e estourou em 2007. A quebra do Lehman foi o estopim para uma crise financeira sem precedentes, que mergulhou o mundo numa recessão econômica não vista desde a Grande Depressão, dos anos 1930. O período iniciado com a falência do Lehman ficou posteriormente conhecido como a Grande Recessão.

Tudo começou após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, quando o governo americano decidiu reduzir drasticamente os juros da praticados no país para evitar um colapso nos mercados financeiros e estimular o crescimento econômico do país. Após anos de juros muito baixos, bancos americanos começaram a oferecer hipotecas para clientes com pouca capacidade de pagamento, os subprime. O incentivo aos americanos para comprar imóveis com financiamento a juros baixos era tão forte que muitas famílias passaram a fazer hipotecas de várias casas, não só de suas moradias. A partir de 2006, quando os juros voltaram a subir e os preços dos imóveis estagnaram, aumentou o calote nas hipotecas. A bolha imobiliária estourou em 2007.

O problema é que muitos bancos venderam a investidores, inclusive no exterior, fundos lastreados nas hipotecas subprime, gerando uma efeito cascata. Para evitar uma crise bancária, ao longo de vários meses, o governo americano resgatou grandes bancos ou coordenou operações de venda de algumas instituições. O mesmo ocorreu em alguns países europeus. Mas, no caso do Lehman, não houve resgate possível e o banco quebrou em setembro de 2008.

Confira, a seguir, uma retrospectiva dos eventos que precipitaram a quebra do Lehman e que marcaram as consequências da crise.

SETEMBRO DE 2001

Ataque as Torres Gêmeas. (Reprodução/YouTube)

Após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, os mercados financeiros globais sofreram um baque e o Federal Reserve, o banco central americano, começou a reduzir com força a taxa básica de juros do país, para patamares muito baixos, de forma a estimular o crescimento econômico. A taxa de juros nos EUA, que estava em 3,5% antes dos atentados, caiu até atingir a mínima de 1% ao ano em 2003 e 2004. No período em que a economia americana crescia com juros muito baixos, os bancos começaram a conceder empréstimos imobiliários até para clientes com pouca capacidade de pagamento (os subprime).

MAIO DE 2006

Em junho de 2004, o BC americano volta a subir juros, até a taxa básica atingir o pico de 5,25% em maio de 2006. Com os juros mais altos, as prestações das hipotecas dos clientes de baixa renda começam a disparar e muitos começam a dar calote.

FEVEREIRO E MARÇO DE 2007

A crise do subprime começa a estourar. Bancos americanos especializados em hipotecas deste tipo vão à falência. No mercado, estima-se que há US$ 1,3 trilhão de empréstimos subprime nos EUA. O problema é que os bancos americanos venderam para investidores e para outros bancos, até no exterior, títulos lastreados nessas hipotecas, ou seja, investimentos que ofereciam um rendimento atrelado ao pagamento desses financiamentos habitacionais. Foi criado, assim, um efeito em cascata.

JULHO A AGOSTO DE 2007

O banco de investimentos Bear Stearns, com sede em Nova York, anuncia que seus fundos de investimentos lastreados em hipotecas subprime estão com problemas. Ele é o primeiro grande banco a sofrer o baque da bolha imobiliária. A turbulência se intensifica em julho e em agosto, e os mercados mundiais são abalados quando bancos como o BNP Paribas, da França, revelam que também investiram em títulos lastreados nos subprimes. Há uma crise de confiança e uma súbita interrupção no crédito interbancário global. Bancos centrais do mundo inteiro intervêm nos mercados, para injetar recursos no sistema e evitar um colapso. O BC americano injeta US$ 100 bilhões no mercado.

JANEIRO A MARÇO DE 2008

Em 22 de janeiro de 2008, diante da queda dos mercados mundiais, numa reunião extraordinária, o BC americano reduz as taxas de juros para 3,5% ao ano. Uma semana depois, faz novo corte, para 3%. Em fevereiro, no Reino Unido, o governo intervém no mercado e nacionaliza o Northern Rock, o quinto maior banco do país, então em crise. Em março, o JP Morgan Chase compra o Bear Stearns por um valor simbólico, em operação que teve nos bastidores a coordenação do governo americano.

7 DE SETEMBRO DE 2008

Em 7 de setembro de 2008, o governo dos EUA anuncia o resgate das gigantes das hipotecas Fannie Mae e Freddie Mac, evitando assim o colapso do mercado imobiliário americano. No dia seguinte, as ações do Lehman Brothers, o quarto maior banco de investimentos dos EUA, registram queda de 45% e especula-se no mercado financeiro que o governo teria de resgatá-lo ou coordenar uma operação para que a instituição fosse vendida.

15 DE SETEMBRO DE 2008

Numa segunda-feira, após um final de semana de muita tensão, o Lehman Brothers pede concordata, sendo o primeiro grande banco a quebrar em decorrência da crise. O evento marca o auge da tensão global com a crise financeira iniciada no sistema de hipotecas. As imagens dos funcionários dos bancos guardando os objetos pessoais de seus locais de trabalho são divulgadas ao redor do mundo. No mesmo dia, o Merrill Lynch, outro grande banco americano, é comprado pelo Bank of America por US$ 50 bilhões.

16 DE SETEMBRO DE 2008

A quebra do Lehman arrasta outros gigantes do mercado financeiro, num efeito em cascata. A AIG —empresa americana de seguros e previdência que, no Brasil, atuava junto com o Unibanco — é resgatada pelo governo americano por US$ 85 bilhões (valor que depois subiria para US$ 180 bilhões). A AIG contava com 30 milhões de segurados nos EUA, atividades em 130 países e apólices para mais de 100 mil empresas e outras entidades. Poucos dias depois, Morgan Stanley e Goldman Sachs mudam seu status de banco de investimentos para holdings, marcando o fim da era dos bancos de investimentos em Wall Street. No fim do mês, o Washington Mutual, do setor de hipotecas e com ativos avaliados em US$ 307 bilhões, é fechado por agências reguladoras e vendido ao JP Morgan Chase.

19 DE SETEMBRO DE 2008

O secretário do Tesouro americano, Henry Paulson, faz um pedido para o Congresso americano aprovar um pacote de emergência de US$ 700 bilhões. Batizado de Tarp (Trouble AssetsRelief Program, ou programa de alívio para ativos problemáticos numa tradução livre), o plano previa a capitalização de bancos e instituições financeiras através da compra de ativos podres dessas empresas ou mesmo via compra de parte do capital dessas companhias pelo Tesouro americano. Foi algo inédito na história americana.

OUTUBRO DE 2008

No início do mês, também o governo brasileiro autoriza o Banco Central do Brasil a comprar carteiras de créditos e bancos em dificuldades no país. Uma medida provisória permite ainda que bancos públicos comprem participações em outras instituições sem necessidade de licitação. No dia 12, é a vez dos países da zona do euro anunciarem seu pacote de resgate. A Alemanha aprova um resgate de 500 bilhões de euros (US$ 683 bilhões), a França se compromete com 350 bilhões de euros (US$ 500 bilhões) e a Espanha aloca 100 bilhões de euros (US$ 143 bilhões). Os principais bancos centrais do mundo afirmam que irão oferecer às instituições financeiras um valor ilimitado em empréstimos de curto-prazo em dólares para ajudar a aliviar a crise.

NOVEMBRO DE 2008

O sistema bancário brasileiro, que havia passado por uma reestruturação na década anterior, resistiu bem à crise desencadeada pela quebra do Lehman Brothers. O único grande banco do país alvo de especulações por suspeita de problemas de liquidez foi o Unibanco. Isso porque a instituição era responsável pelas operações no Brasil da seguradora AIG, uma das protagonistas da crise de Wall Street. Embora não houvesse evidência de contágio, a imagem do Unibanco foi afetada por essa ligação. Isso acabaou acelerando as conversas sobre uma fusão entre o Unibanco e o Itaú, que segundo seus dirigentes já duravam mais de um ano em segredo. Em 4 de novembro de 2008, as duas instituições anucniaram a formação do Itaú Unibanco, que se tornaria então o maior banco privado do país, superando o Bradesco, e a quarta maior empresa da América Latina.

ABRIL DE 2009

Em abril de 2009, a montadora Crysler recebeu um resgate do governo americano após pedir concordata. Foi a primeira das grandes montadoras a sucumbir aos efeitos da crise financeira global. O total desembolsado pelos governo americano, através do seu programa Tarp, e pelo Canadá foi de US$ 7,6 bilhões, também em 2009. No acordo, 20% da empresa ficou com o grupo Fiat, 55% com uma associação de aposentados, 8% com o governo americano e 2%, com o canadense. A dívida foi paga em 2011 e em 2014 a italiana ficou com o controle da fabricante de veículos.

JUNHO DE 2009

Maior fabricante de automóveis dos EUA durante sete décadas, a General Motors não resistiu aos efeitos da crise. Endividada, não conseguiu renegociar débitos e pediu falência em junho de 2009. Para evitar desempregos em uma economia já combalida, o governo americano injetou, através do Tarp, mais de US$ 50 bilhões na fabricante de veículos em troca de 60% da empresa. O governo do Canadá ficou com outros 12% por ter cedido outros US$ 9,5 bilhões.

As ações em posse dos governos foram vendidas de forma gradual e desde o final de 2013 a empresa voltou a ser privada. A empresa saiu de 243 mil funcionários em 2008 para cerca de 180 mil atualmente. Ao lado da Crysler, foi mais uma das “Três Grandes” montadoras americanas quebrar — a Ford não chegou a pedir falência, mas sofreu grandes prejuízos.

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