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Prefeituras do ES contratam servidores por menos de um salário mínimo

Prefeituras do ES contratam servidores por menos de um salário mínimo

Valores abaixo do salário mínimo precisam ser complementados

Publicado em 13 de outubro de 2018 às 00:39

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Prefeitura de Conceição da Barra. (PMCB/Divulgação)

Prefeituras do interior do Espírito Santo estão contratando servidores efetivos e temporários com salários que estão bem abaixo da remuneração mínima vigente no Brasil, que é de R$ 954. Em alguns casos, o valor pago a esse trabalhador, conforme o que está previsto nos editais, é de R$ 215,51, R$ 788 e R$ 895, por exemplo.

Só para se ter uma ideia, em setembro deste ano a Prefeitura de Alto Rio Novo abriu processo seletivo para a contratação temporária de servidores com um salário de R$ 215,51 para o cargo de auxiliar de análises clínicas. O valor é referente à carga horária de 40 horas semanais. A escolaridade exigida para a função era a de nível fundamental.

Já a Prefeitura de Conceição da Barra está com concurso em andamento para a contratação de 131 funcionários efetivos, com remuneração a partir de R$ 788,80 para o cargo de serviços de apoio administrativo, que exige o nível médio.

É bom lembrar que, de acordo com o artigo 7º da Constituição Federal, nenhum trabalhador brasileiro pode receber uma remuneração inferior a um salário mínimo. No entanto, os municípios podem pagar salários menores desde que estejam previstos em lei, mas é preciso fazer uma complementação até atingir a remuneração mínima vigente no Brasil. Para que os valores sejam revistos, é preciso ter aprovação das Câmaras de Vereadores.

A impossibilidade de oferecer salários melhores aos trabalhadores está diretamente ligada aos limites de gastos com pessoal estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Conforme a legislação, o Poder Executivo municipal não pode gastar mais do que 54% do dinheiro em caixa para pagar servidores. Aquele que atinge 48,6% recebe um alerta do Tribunal de Contas do Estado.

Ao atingir o limite de 51,3% da receita corrente líquida, chamado de limite prudencial, o município fica limitado a criar cargos, empregos ou funções; alterar a estrutura de carreira que implique aumento de despesa; contratação de horas extras, entre outros itens.

CONSTITUIÇÃO

O procurador regional do Ministério Público do Trabalho no Espírito Santo, João Hilário Valentim, explica que o salário mínimo é definido por mês, dia e horas de trabalho. Assim, para uma jornada integral de 44 horas por semana, o contratado deverá receber, atualmente, o mínimo de R$ 954 pelo mês trabalhado.

Segundo ele, o decreto nº 9.255/2017, que estipulou o valor do salário mínimo, a partir de 1º de janeiro de 2018, estabeleceu que a remuneração mínima será de R$ 954 por mês, R$ 31,80 por dia trabalhado e R$ 4,34 por hora.

“A Constituição garante que o trabalhador receba uma remuneração de um salário mínimo. A determinação vale para o serviço público, independentemente da forma de contratação e, no caso de cargos, cuja remuneração não esteja atualizada por lei, o ente público deve assegurar o pagamento de um salário mínimo, como remuneração básica. Essa informação deve constar no edital do concurso público ou do processo seletivo”, diz.

Segundo o advogado especialista em Direito Público Thiago Carvalho de Oliveira, as prefeituras têm autonomia como ente público para fazer a criação de cargos e estabelecer os requisitos, atribuições e remuneração. Para haver qualquer mudança, é necessário ser aprovada pela Câmara de Vereadores.

Já o professor de Direito Constitucional Adriano Santana Pedra explica que a forma de contratação vai depender de cada município, podendo ser como celetista ou por regime próprio. “A lei municipal vai fixar os salários e se a lei for muito antiga, acaba sendo preciso fazer a complementação”, aponta Pedra.

SEM PREJUÍZO NA APOSENTADORIA

Um servidor que ganha menos do que um salário mínimo não terá prejuízos na hora de se aposentar. De acordo com o advogado especialista em Direito Público Thiago Carvalho de Oliveira, a quantia paga será de acordo com o valor total que ele recebe.

“O recolhimento será feito de acordo com o regime de Previdência que ele estará atrelado, ou seja, próprio (que alguns municípios possuem) ou ligados ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). O valor recolhido será o total da remuneração recebida”, destaca.

No entanto, os prejuízos maiores são para os profissionais que assinam contratos temporários. O mestre em Direito e professor universitário Rainaldo Oliveira ressalta que isso ocorre porque esse trabalhador não tem uma carreira.

“O efetivo conta outros benefícios como promoção, gratificação, férias, 13º, entre outros. Os temporários não têm direito a nada disso”, pontua.

Sobre reajuste, o mestre em Direito lembra que o percentual de aumento será em cima do vencimento básico estabelecido pela lei do cargo e não sobre o valor que este trabalhador recebe.

ANÁLISE | Reduzir gasto com pessoal é difícil

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Desde que foi implantada em 2000, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) começou a regular o dinheiro gasto com pessoal. Ao atingir o alerta máximo, a prefeitura fica impossibilitada de uma série de coisas, entre elas, a de pagar hora extra. Observamos que em muitos municípios pequenos, o emprego na prefeitura é a principal ocupação dos moradores, principalmente naqueles que a economia é pouco dinâmica. Nos últimos anos, as cidades sofreram uma grande queda na receita, motivada pela crise econômica e pela mudança nas alíquotas do ICMS. No caso do Espírito Santo, o maior impacto foi por conta do fim do Fundap. As prefeituras passaram a trabalhar com menos dinheiro, demitindo temporários e não concedendo reajuste. Diminuir gastos com pessoal é difícil

Tânia Villela, economista e diretora da Arquus Consultoria
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MUNICÍPIOS CAPIXABAS ADMITEM REVER PLANOS DE CARGOS E SALÁRIOS

A crise econômica provocou queda na arrecadação dos municípios e o impacto refletiu diretamente no salário dos servidores, pois não é possível conceder reajustes.

Os menores salários – de R$ 215,51, R$ 266,08, R$ 455,69 e R$ 568,99 – foram oferecidos no processo seletivo da Prefeitura de Alto Rio Novo. Em nota, a prefeitura informou que o município é um dos mais pobres do Espírito Santo e, em virtude da crise financeira, que atravessa o país nos últimos anos, não está sendo possível reajustar os salários.

“Dessa forma, os salários dos servidores públicos municipais encontram-se em níveis muito abaixo do salário mínimo, de quase todas as categorias, sendo necessário o complemento para se atingir o valor do salário mínimo vigente”, diz a nota.

Em Conceição da Barra, a única prefeitura que abriu concursos para preencher cargos efetivos, o secretário de Finanças, Alex Moura, destacou que o salário está abaixo do valor mínimo em virtude da defasagem salarial.

“Já formamos uma comissão para tentar elevar o valor base dessas carreiras para o salário mínimo. A ideia é de que até o final do ano, o novo plano de cargos e salários já esteja pronto para ser enviado à Câmara de Vereadores”, afirmou.

A Prefeitura de Vargem Alta destacou que o valor do salário é o mesmo de quando eles foram criados. No entanto, já estuda fazer as alterações no ano que vem, dentro das condições financeiras, orçamentárias e das responsabilidades fiscais.

Os salários em Santa Teresa também estão defasados, conforme informações da prefeitura. Ainda não há detalhes de quando o plano de cargos e salários será modificado.

Já a Prefeitura de Guaçuí informou que recentemente foi dado um reajuste aos trabalhadores e que o menor salário pago hoje pelo município é de R$ 923,01. Conforme nota enviada pela prefeitura, as carreiras que estão abaixo do salário mínimo, recebem um complemento na folha, não havendo qualquer prejuízo em seus direitos trabalhistas. “A administração municipal estuda uma maneira para que essa defasagem seja corrigida e não seja mais necessário o complemento salarial”, diz a nota.

A Prefeitura Municipal de Afonso Cláudio informou que, atualmente, o salário base dos cargos de facilitador e recreador é de R$ 1.005,89 para 40 horas semanais, e de R$ 620,19, para 25 horas semanais, valores acima do salário mínimo vigente, pois contemplam ainda o reajuste concedido pela administração municipal. Além disso, todos recebem vale-alimentação no valor de R$ 290.

Iúna e Santa Maria de Jetibá também garantem fazer a complementação até atingir o valor do salário mínimo.

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As prefeituras de Ibatiba e de Marechal Floriano foram acionadas e não responderam a reportagem até o fechamento desta edição. Já em Marataízes e São Roque do Canaã ninguém foi encontrado.

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