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Mais riscos aos desistir de comprar imóveis na planta

Mais riscos aos desistir de comprar imóveis na planta

No Brasil, 26% dos contratos imobiliários são rompidos

Publicado em 22 de novembro de 2018 às 03:03

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(Gildo Loyola)

Apelidada de lei dos distratos, proposta aprovada no Senado promete mudar a conflituosa relação entre clientes e construtoras e dificultar a desistência da aquisição de imóveis na planta. Mas, para especialistas em defesa do consumidor, o projeto, que agora volta para análise da Câmara, criará um cenário de condições desiguais, com punições mais severas para os clientes do que para as empresas que deixam de respeitar os contratos.

Um dos pontos de discórdia é a multa prevista para ser aplicada em quem não quer mais ficar com a unidade ou que não paga as prestações. A incorporadora poderá reter até 50% do valor investido.

Essa penalidade máxima valerá para as obras do regime de patrimônio de afetação, quando o negócio tem CNPJ próprio e a empresa não é a verdadeira dona do empreendimento, atuando apenas como uma administradora dos interesses de um grupo de compradores. Para os outros casos, as multas poderão ser de até 25%.

Dados da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) e da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) mostram que no país 26% dos contratos imobiliários são rompidos.

Segundo a promotora de Justiça, Sandra Lengruber, presidente da Associação do Ministério Público do Consumidor (MPCON), além de trazer prejuízo para o comprador, a punição é desigual em relação ao que será cobrado em caso de inadimplência da construtora por causa do atraso das obras, por exemplo.

Se mantiver o contrato mesmo com o prazo de entrega do imóvel postergado, o consumidor terá direito de receber uma multa de apenas 1% do valor pago. “É muito pouco e, na maioria das vezes, não significa nem mesmo o preço de um aluguel de imóvel semelhante ao adquirido. Entende-se que a multa a favor do consumidor deveria ter como parâmetro o valor do contrato”, analisa.

Outra crítica feita pela promotora é referente ao tempo de espera para que o comprador receba o dinheiro de volta em caso de distrato que será de 60 a 180 dias.

“Eventuais prejuízos em decorrência da crise econômica não podem ser resolvidos com perdas ao consumidor. É preciso ponderar ainda se essas regras são realmente benéficas ao mercado ante a possibilidade de redução no número de contratações”, afirma Sandra ao acrescentar: “Entendo ser temerário aprovar mudanças nesta fase de transição nos Poderes Legislativo e Executivo na esfera nacional”, conclui.

Hoje, não existe nenhuma legislação que estabelece limites de multas às empresas e aos compradores, mas os percentuais têm sido definidos em decisões judiciais. O Superior Tribunal de Justiça tem determinado às incorporadoras a retenção de 10% a 25% do valor pago em situações de rescisão.

Na visão da Associação de Consumidores, Proteste, as alterações levam em conta apenas os interesses das companhias e prejudicam o consumidor que se vê obrigado a desistir da tão sonhada casa própria, neste período de recessão, ainda com risco de perder metade do que investiu.

TOLERÂNCIA

Para quem adquiri o imóvel em construção, a nova lei ainda altera outro ponto importante o período em que o consumidor passa ter direito à indenização se a construtora não entregar as chaves na data fixada em contrato.

Os órgãos de defesa do consumidor entendiam que a tolerância, de 180 dias, só poderia ser usada em casos excepcionais, em obras afetadas por greves e chuvas intensas.

O entendimento não era pacificado pela Justiça, cabendo a cada magistrado decidir se as construtoras poderiam usar esses seis meses sem a necessidade de pagar o consumidor pela demora.

Segundo o Projeto de Lei Complementar 68/2018, o atraso é computado apenas após os 180 dias. Somente depois que esse período acabar, é que o cliente pode desfazer o negócio com direito de receber todo o dinheiro que destinou para o imóvel.

EMPRESÁRIOS COMEMORAM NOVA LEI

Considerado um marco para o setor da construção civil, a lei do distrato, segundo as empresas, tem a intenção de dar segurança jurídica às negociações de compra de imóveis.

As companhias do ramo reclamam que a devolução causa desequilíbrio financeiro para a empreiteira e tem impacto ainda mais negativo no caso dos empreendimentos em regime de patrimônio de afetação.

O presidente do Sindicato da Construção Civil do Estado, Paulo Baraona, explica que a compra de um imóvel não é como adquirir um eletrodoméstico. “O imóvel é fabricado especialmente para aquela pessoa que assinou o contrato. A maior parte das obras só começa quando há um número mínimo de unidades compradas. Assim, é estabelecido um compromisso financeiro. Quando alguém desiste, há uma quebra de toda essa cadeia”, explica.

Baraona explica que apesar do projeto de lei propor a multa de até 50%, o percentual poderá ser negociado com a construtora. “As negociações vão existir, mas a proposta vai apenas deixar as regras claras. Entendemos que algumas pessoas desistem do imóvel porque perderam o emprego, mas a empresa não pode assumir um ônus para o qual ela não estava preparada”.

Sem citar números, Baraona disse que 2017, no Estado, foi um ano de muitos distratos. “A situação melhorou em 2018”, disse ao concluir ainda: “A lei não agrada a todos. Nem as empresas nem aos consumidores. Mas é uma regra clara que traça os devedores dos dois lados.”

CONFIRA COMO VAI FUNCIONAR A LEGISLAÇÃO

As regras para as empresas 

Prazo de tolerância: o atraso de até 180 dias para a entrega do imóvel vendido na planta não gerará ônus para a construtora.

Multa por atraso: se o atraso na entrega das chaves for maior que 180 dias, o comprador poderá desfazer o negócio e terá direito a receber tudo o que pagou de volta, além da multa prevista em contrato, em até 60 dias.

Indenização: em caso de atraso da construtora, o comprador poderá optar por manter o contrato no caso de atraso com direito a indenização de 1% do valor já pago.

Acúmulo de indenizações: a lei veda que as empresas paguem tanto multa moratória quanto compensatória em favor do comprador.

As regras para os consumidores

Distrato ou inadimplência: a lei prevê multa compensatória de 25% do valor pago contra o consumidor ou se houver patrimônio de afetação, com multa de até 50%.

Corretagem: o comprador perderá integralmente os valores pagos a título de comissão de corretagem em caso de distrato.

Despesa: o comprador inadimplente terá de arcar com despesas de fruição do imóvel, se já tiver sido disponibilizado.

Arrependimento: o consumidor terá sete dias, a partir da assinatura do contrato, para se arrepender.

Reembolso: a rescisão do contrato permitirá que o comprador só reaverá o valor pago, decrescido dos encargos decorrentes da inadimplência, após 180 dias do distrato ou, se houver patrimônio de afetação, após 30 dias da obtenção do “habite-se” da construção.

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Fonte: Agência Senado

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