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Guerra EUA-China é oportunidade para o Brasil, diz Doria

Guerra EUA-China é oportunidade para o Brasil, diz Doria

Doria respondia a uma questão sobre o impacto das recentes declarações de Bolsonaro colocando seu governo como alinhado ao de Donald Trump nos EUA

Publicado em 5 de agosto de 2019 às 20:02

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O governador de São Paulo, João Doria. (Agência Brasil | Arquivo)

Em mais um movimento para tentar se descolar de Jair Bolsonaro (PSL), o governador João Doria (PSDB-SP) disse que a guerra comercial entre China e EUA é uma "grande oportunidade para o Brasil".

"Os chineses já estão ampliando a diversificação de seus parceiros comerciais, visando diminuir a dependência do mercado americano. É uma boa hora para o Brasil, já que a China decidiu que o Brasil foi definido como prioridade", disse.

"São Paulo tem uma visão de que nós temos de aproveitar essa oportunidade, e não afastá-la. É a grande oportunidade para o Brasil", disse.

Doria respondia a uma questão da Folha de S.Paulo sobre o impacto das recentes declarações de Bolsonaro colocando seu governo como alinhado ao de Donald Trump nos EUA.

O tucano está em Pequim liderando uma missão comercial justamente para tentar atrair investimentos para o seu estado. "O presidente tem uma viagem prevista para a China em outubro. Materializada essa viagem, deixa de haver esse alinhamento que pode ser prejudicial. Espero que o governo federal aproveite a oportunidade", disse.

A tensão do embate entre Washington e Pequim não transpareceu nas conversas entre executivos chineses e membros da comitiva brasileira, que conta com 31 empresas e 5 secretários de estado.

Mas uma apresentação feita por Zhou Jingtong, economista sênior do Banco da China, mostra que o tema está no centro das preocupações locais.

"A fricção desacelerou nosso crescimento de exportações. Era 9% por trimestre no ano passado, neste ano está em zero", disse, enquanto o slide que ele mostrava falava de "fatores geopolíticos" a atrapalhar o amadurecimento do crescimento chinês.

Em relação ao Brasil, contudo, o tucano resumiu a preocupação de seus anfitriões: "Olha, aqui ninguém perguntou sobre reforma da Previdência ou tributária".

O pragmatismo chinês, notório quando se fala de uma ditadura comunista que adotou a economia de mercado agressiva, não encontrou eco no governador tucano.

"Eu espero que tudo esteja resolvido até setembro, e creio que o Senado irá reincluir os estados e municípios no texto final. Haverá reunião amanhã (terça, 6) entre o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e o ministro Paulo Guedes (Economia). Eu vejo o ministro muito focado", disse.

Já o presidente Jair Bolsonaro, de quem Doria vem tentando manter distância regulamentar, não foi citado no mesmo grupo. Questionado, Doria apenas deu risadas.

Após ter sido eleito no segundo turno da disputa eleição para governador em 2018 contra Márcio França (PSB) pegando carona na onda conservadora que levou Bolsonaro ao poder, Doria tem tentado afastar-se do presidente.

Não é tarefa das mais fáceis. No segundo turno do ano passado, já com o ex-mentor Geraldo Alckmin (PSDB) abatido na disputa federal, o tucano incentivou o movimento BolsoDoria, que contava com material de campanha próprio.

Nesta segunda (5), em Pequim, o governador também alfinetou o presidente ao comparar seu trabalho de promoção comercial -na sexta (9) será inaugurado um escritório paulista de negócios em Xangai, no qual apenas o chefe da unidade será remunerado, deixando todas as outras contas para empresas brasileiras, chinesas e o governo chinês.

"Queremos algo sem interferência de condições políticas. A Apex (agência federal de exportações) sofreu com as duas alterações na sua presidência este ano (devido a embates internos no governo). Não faço juízo, mas isso faz diferença", disse.

A dificuldade para Doria é o fato de que ele transita numa mesma faixa de eleitorado que Bolsonaro. Há também um complicador, medido por pesquisas internas de partidos: a pecha de que traiu Alckmin ao tentar a vaga de presidenciável do então governador paulista, que havia bancado sua candidatura vitoriosa a prefeito paulistano em 2016.

O momento mais marcado desse movimento de Doria foi quando Bolsonaro questionou o papel da ditadura na morte do pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil. Doria, cujo pai foi um deputado cassado obrigado a se exilar após o golpe de 1964, criticou duramente o mandatário.

A viagem à China é mais uma oportunidade para Doria mostrar-se "presidencial", por assim dizer. Falou em inglês em todas suas intervenções públicas durante o primeiro dia e comandou, ao estilo do organizador de eventos que foi no passado, sessões de interação entre empresários da comitiva e executivos chineses no Banco da China.

Em seu discurso e vídeo de apresentação, São Paulo é apresentada como motor do país e seu resumo, com mistura de raças e origens. Até o logotipo do governo paulista ganha uma bandeira do Brasil ao fim.

A missão de Doria é a maior já enviada pelo estado ao país asiático. "Sem ideologia ou partidarismo", disse Doria.

Além de buscar estimular negócios privados, a viagem procura investimentos externos em São Paulo. O estado tem pouco espaço de manobra fiscal, tendo herdado um rombo de R$ 10 bilhões em suas contas de 2018, e o Brasil vive seu momento de menor taxa de investimento público da história -no primeiro trimestre, equivaleu a apenas 15,8% do Produto Interno Bruto.

Assim, o governo elaborou um programa de 15 concessões e 6 PPPs (Parcerias Público-Privada) que almeja um investimento mínimo de R$ 37,6 bilhões em dois anos. Mas os números na cabeça de sua equipe são maiores.

"Só em transportes temos R$ 55 bilhões em potencial", afirma o secretário de Transportes Metropolitanos, Alexandre Baldy.

Uma das meninas dos olhos do projeto é o trem intercidades, que ligaria a capital paulista a Americana, trajeto com potencial de 470 mil passageiros por dia. Segundo Baldy, cada trecho da obra poderá ter um tipo de tratamento diferente, como concessões ou PPPs.

Nesta segunda, Doria encontrou-se com um dos maiores grupos chineses da área de infraestrutura, o CRCC, e na quarta (7) estará em Xian para reunir-se com outro gigante ferroviário, o CR20.

Fora do pacote inicial está a Sabesp, avaliada em R$ 20 bilhões, mas não fora das conversas. Seu presidente, Benedito Braga, está na comitiva e encontrou-se com duas empresas interessadas em negociar participação na estatal de saneamento.

Não houve, contudo, avanço prático, até porque o governo paulista depende do encaminhamento do marco regulatório do saneamento no Congresso para decidir se vende a Sabesp ou pouco menos de 50% de suas ações.

"Se demorar no Congresso, podemos capitalizar inicialmente e depois vermos se vale a pena privatizar", disse o secretário Henrique Meirelles (Fazenda). Braga ressaltou a possibilidade de negócios diversos ocorrem, como sociedades para fins específicos.

Também foi assinado um termo de cooperação para promoção de investimentos entre a InvestSP, agência do governo paulista para o setor, e o Banco da China.

"Com isso teremos instrumentos práticos à mão", disse Wilson Mello, presidente do órgão paulista que comemorou o primeiro negócio do novo escritório, uma joint-venture entre uma produtora de calçados de Birigui com uma similar chinesa.

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*O jornalista viajou a convite da InvesteSP.

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