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Anistia acusa México de deportar ilegalmente fugitivos da violência

Anistia acusa México de deportar ilegalmente fugitivos da violência

Milhares de centro-americanos que pedem asilo para escapar de ameaças são expulsos

Publicado em 23 de janeiro de 2018 às 12:49

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Onda de violência assola o México . (Reprodução/Web)

Emília fugiu de El Salvador após ter dois filhos e um irmão mortos por uma gangue. Com a família toda em risco, fugiu para o México e pediu asilo junto a sua filha, prestes a dar à luz. Quando ela entrou em trabalho de parto, no estado de Chiapas, Emília foi providenciar os documentos para o bebê. Acabou detida pelas autoridades com seu outro filho e foi deportada a seu país, mesmo tendo indicado que pedira asilo e que sua vida estava em risco. Sua sorte apenas mudou quando conseguiu voltar clandestinamente ao México e esperou escondida para que seu mesmo pedido de asilo fosse aprovado sem que ela passasse pelo risco de ser expulsa de novo. Acabou conseguindo, e hoje vive segura com a família.

A história de Emília (nome fictício, por razões de segurança) é uma das bases de um novo relatório da Anistia Internacional, que denuncia violações sistemáticas das autoridades migratórias mexicanas contra imigrantes centro-americanos. Segundo a ONG pró-direitos humanos, autoridades têm deportado quase automaticamente milhares de cidadãos de Honduras, El Salvador e Guatemala que buscam asilo para fugir da violência que assola a região. Na maior parte dos casos, violando os direitos internacional e interno e também cometendo crimes como roubos.

A ONG fez uma pesquisa levando em conta 500 experiências de centro-americanos viajando rumo ao México. Segundo a Anistia, o Instituto Nacional de Migração (INM) descumpre sistematicamente o princípio de não-devolução, um dos pilares do direito internacional e também do mexicano. Esta base legal proíbe a devolução de pessoas a situações em que correm risco real de sofrer perseguição e outras violações graves a seus direitos humanos.

Potencialmente, isto pode custar a vida das pessoas reenviadas aos países de onde fugiram — afinal, 54% dos entrevistados citam a violência como motivo para a saída, e 35% alegam terem tido sua vida ameaçada.

“São trágicas histórias de famílias, crianças, homens e mulheres fugindo da violência extrema para salvar suas vidas. Em lugar de oferecer-lhes proteção a que têm direito, o México está dando as costas a essa gente em necessidade de maneira ilegal,” afirmou em comunicado Erika Guevara-Rosas, Diretora da Anistia Internacional para as Américas.

A estimativa do Alto Comissariado da ONU para os Refugiados é de que mais de 500 mil pessoas atravessem a fronteira sul do México de forma irregular todos os anos. E o direito internacional obriga o país norte-americano a oferecer proteção contra os riscos que os cidadãos destes (e de quaisquer outros) países correriam em seus países de origem.

EPIDEMIA DE VIOLÊNCIA E ASSASSINATOS

Em comunicado, a ONG relembra Guatemala, El Salvador e Honduras (países do chamado "Triângulo Norte") estão assolados há anos por uma violência generalizada, com taxas de homicídios entre quatro e oito vezes maior do que a Organização Mundial da Saúde considera como "níveis epidêmicos". Neste contexto, seus cidadãos não só buscam oportunidades de emprego, mas cada vez mais fogem para escapar de situações em que suas vidas correm perigo.

As deportações ilegais afetam inclusive a vida de pessoas comuns, como um motorista de ônibus entrevistado pela Anistia Internacional após ter tido seu pedido de proteção negado e ser deportado do México para Honduras. Ali, foi assassinado dias depois. Outro hondurenho requerente de asilo relatou à Anistia Internacional que quando explicou ao funcionário do INM que fugia por temer pela própria vida, recebeu a resposta: “Uma vez detido, já era, vai voltar para o seu país”. Outras pessoas disseram à Anistia Internacional que haviam sido coagidas ou pressionadas a aceitar a deportação contra sua vontade.

Em levantamento com 297 pessoas que haviam sido detidas pelo INM, a Anistia Internacional observou que 84% não queriam voltar a seus países de origem; 40% das respostas de agentes citados por elas carregavam fortes indícios de uma devolução; e que 69% apontaram que o agente local nunca perguntou por que tinham deixado seu país.

Cerca de 68% das 116 respostas que descreveram uma detenção policial descreviam um tratamento "ruim" ou "muito ruim". A polícia federal e a municipal foram as mais mencionadas na descrição de apreensões que muitas vezes envolvem roubo e extorsão de migrantes por policiais.

A ONG ainda constatou que 75% das pessoas detidas pelo INM não haviam sido informadas de que tinham direito a solicitar asilo no México, embora a legislação mexicana decrete expressamente isto e pressione as autoridades a avisar . Já as autoridades mexicanas relataram à ONG que o INM raras vezes levava a cabo as devoluções.

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Por sua vez, Emília e sua família tiveram proteção internacional concedida no México em abril de 2017. Depois de alguns meses, a família rumou ao Norte do país, onde vive atualmente em segurança. As crianças de Emília agora estão frequentando a escola, e a neta já anda. Sua filha mais velha está trabalhando em uma loja local.

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