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Política externa de Trump reduz influência global dos EUA

Política externa de Trump reduz influência global dos EUA

Ações do presidente americano punem aliados, turbinan oponentes, e isolam cada vez mais Washington

Publicado em 15 de janeiro de 2018 às 11:52

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O presidente dos Estados Unidos Donald Trump. (Gage Skidmore | Flickr)

De perfil errante, a política externa do primeiro ano do governo de Donald Trump — a ser completado no próximo sábado — tornou o mundo mais instável, mais próximo hoje de uma guerra nuclear do que antes da posse do republicano. Muitas vezes agindo contra os preceitos históricos dos Estados Unidos, o presidente atacou o multilateralismo, deu as costas a aliados e contemporizou com ditadores e ameaças. Para especialistas, a maior potência mundial se isolou e perdeu influência.

A relação com a América Latina é marcada pelo desprezo. Trump apenas se voltou para a região para tratar de imigração e comércio, tendo o México como grande ponto de tensão. Sua gestão congelou a aproximação com Cuba e adotou uma retórica beligerante com a Venezuela, a quem ameaçou invadir militarmente e impôs sanções. No entanto, Nicolás Maduro segue mais firme que nunca.

— É verdade que muitos governos americanos tinham desinteresse pela América Latina, mas com Trump isso assumiu um outro nível, bateu recordes — afirmou Michael Shifter, presidente do Inter-American Dialogue, lembrando o fato de que nem o secretário de Estado visitou a região e segue vaga a posição de subsecretário para o Hemisfério Ocidental. — Seu governo só trata da região para assuntos de sua agenda interna, e quase sempre de forma pejorativa.

Shifter lembra que o governo americano chegou a ensaiar uma mudança na relação que os EUA têm com a Colômbia no combate às drogas, mas os laços fortes entre os dois países devem manter a cooperação. Outras nações, como Argentina e Peru, tentaram se aproximar dos EUA, mas sem muito resultado. Shifter diz que a crise política interna do Brasil evitou uma aproximação maior entre os governos Trump e Temer, que só se encontraram em grandes eventos globais, sem nunca terem realizado uma reunião bilateral.

Ainda há dúvidas sobre se Trump vai participar da reunião da Organização dos Estados Americanos (OEA), em abril, em Lima. Para Shifter, neste primeiro ano de Trump, os países da região tampouco adotaram uma postura comum estratégica junto aos EUA, exceto para criticar a proposta do muro na fronteira com o México e rechaçar a ameaça de invasão na Venezuela.

— No fim, o governo adotou sanções contra o regime de Maduro que foram copiadas por outros países, mas mesmo assim não há uma estratégia clara — disse ele.

A situação não foi diferente com o resto do mundo. As declarações e atos de Trump, muitas vezes contrariando posições de seu governo, ampliaram a segurança do mundo. O tom quase sempre foi de ameaça e depreciação, seja chamando alguns países “de merda”, prometendo invasão e uma guerra nuclear com a Coreia do Norte, retirando os EUA de organismos multilaterais ou ameaçando países para que seguissem sua decisão unilateral de reconhecer Jerusalém como capital de Israel. Ao mesmo tempo, evitou rusgas com Rússia e China —anunciada como principal ameaça econômica aos EUA na campanha — mas listou os dois países como potências rivais em sua nova Estratégia de Segurança Nacional, divulgada em dezembro.

Para analistas, o abandono de aliados como o México e a Europa é o mais grave.

— Ao trair a confiança dos aliados históricos, os EUA ficam mais fracos e isolados — disse Thomas M. Holbrook, professor da Universidade de Wisconsin-Milwaukee.

Michael Traugott, professor da Universidade de Michigan, diz que o governo Trump faz sua política externa pensando muito nas questões domésticas, sem ter uma estratégia clara. O fato de até agora ter deixado diversos postos sem embaixador demonstra a falta de prioridade com a diplomacia — refletida também em seu orçamento, que elevou os gastos militares e cortou muito os recursos de ajuda humanitária e do Departamento de Estado.

— Trump é muito mais propenso a acordos bilaterais do que multilaterais — avalia Traugott. — Não está claro quão permanente serão os danos para as relações dos Estados Unidos após o seu governo.

No Departamento de Estado, o clima é de desolação. Não apenas pelas muitas vezes em que Trump pessoalmente decide contra políticas e posicionamentos históricos, mas pela falta de prestígio. A forma como se relaciona com Rex Tillerson, seu chanceler, chega a parecer doentia: Trump já disse publicamente que não sabe até quando ele ficará no governo — informações vazadas pela imprensa indicam que essa troca de comando da diplomacia americana pode ser breve — e o desafiou a fazer um teste de Q.I, depois que jornais americanos publicaram que Tillerson teria chamado Trump de “idiota” após a decisão de tirar os EUA do Acordo climático de Paris.

Além disso, Trump atuou para reduzir as entidades multilaterais — criadas no pós-Guerra dentro da arquitetura americana. Decidiu sair da Unesco, boicota a indicação de nomes para a Organização Mundial de Comércio (OMC), critica e desacata as Nações Unidas (ONU) e reclama da injustiça da Otan — Organização do Tratado do Atlântico Norte. Está forçando uma renegociação do Nafta, tratado comercial com México e Canadá que corre o risco de ser extinto, e tirou os EUA da Parceria Transpacífica (TPP), maior tratado comercial do mundo que rivalizaria com o poder comercial da China.

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Trump ainda adotou um tom belicoso em sua primeira participação na ONU. Coleciona gafes com aliados — como nas vezes em que tentou interferir em temas europeus e no Reino Unido. Na política externa, o seu slogan “American First” (EUA em primeiro lugar) cada vez mais se aproxima de “American Alone” (EUA sozinhos).

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