> >
Após o ataque à Síria, pode eclodir uma guerra de grandes proporções?

Após o ataque à Síria, pode eclodir uma guerra de grandes proporções?

Especialistas afirmam que possibilidades continuam abertas, mas que cautela marca desdobramentos

Publicado em 14 de abril de 2018 às 19:17

Ícone - Tempo de Leitura 0min de leitura
Bombardeio na Síria. (@radioamericahn | Twitter)

A forma como o presidente americano, Donald Trump, afirmou na manhã deste sábado que o ataque conjunto entre Estados Unidos, Reino Unido e França na Síria “foi concluído com êxito”, pode ajudar a reduzir a tensão na região. Mas não elimina a possibilidade de que o conflito ganhe uma nova dimensão, envolvendo, além de americanos e europeus, russos e iranianos, que dão suporte ao regime de Bashar al-Assad em Damasco.

— Uma escalada de tensão não está descartada, todo o cenário está muito aberto — afirmou ao GLOBO Maxime Larive, diretor do Centro União Europeia na Universidade de Illinois em Urbana-Champaign (EUA). — Mas o fato de ter sido um ataque pontual pode indicar uma cautela que tende a marcar a reação de todos os envolvidos.

Assim, apesar do tom belicoso de Washington e Moscou, os desdobramentos estão sendo muito mais calculados. O especialista lembra que o Pentágono tomou o cuidado de evitar matar russos na operação, tendo coordenado com Moscou o ataque às bases químicas — a ataque era praticamente obrigatório para o governo americano manter a palavra de Trump depois da série ameaças que ele fez ao regime sírio por causa do suposto ataque químico no fim de semana passado na cidade de Douma.

Analistas ouvidos pela imprensa americana alertam que os próximos passos podem ser dimensionados nas reuniões do Conselho de Segurança da ONU, palco do embate verbal entre as potências que têm o potencial de evitar mais ataques reais. A chave está no tom da resposta de Vladimir Putin.

— Cada país tem objetivos diferentes neste caso — explica Larive. — E o importante é que todos os atores parecem entender a complexidade da situação.

O que está em jogo em para cada país:

ESTADOS UNIDOS

Trump se colocou em uma sinuca ao anunciar em seu Twitter, antes de consultar sua equipe, que os supostos ataques químicos na Síria não ficariam sem resposta. Isso sugeriu uma ação militar imediata que o governo não tinha planejado. O ataque também acabou sendo mais focalizado do que Trump, que em seu discurso de sexta-feira à noite falou em "ação sustentada", havia sugerido. Por outro lado, a ação militar americana foi bem-sucedida em tirar o foco dos graves problemas internos de Trump, que passam por investigação com o FBI, apreensão de documentos de seus advogados, denúncia de obstrução de Justiça, pagagamento a uma ex-amante para manter seu silêncio. E com um bônus para o presidente: o discurso de que está falando grosso com Putin, ou seja, que não está mancomunado com Moscou.

EUROPA

Desde 2011, os europeus sofrem a consequência do conflito sírio, que gerou uma legião única de refugiados para o continente, e desde então sua atuação no caso têm sido tíbia. Para Larive, é claro que os franceses não querem se envolver em uma guerra de grandes proporções, mas a atuação coordenada no caso indica que esta pode ser mais uma possibilidade para Emmanuel Macron reforçar sua posição global, ainda mais em um momento em que Angela Merkel, após uma eleição complicada, se mostra mais frágil que no passado. Theresa May também pode ter se beneficiado do ataque na política externa, onde está enfrentando desafios por causa do Brexit e do caso do suposto envenenamento de um ex-espião russo na Inglaterra supostamente por parte do governo russo. Mas, tirando estas questões pontuais, os europeus deverão manter a posição dos últimos sete anos de conflito e tendem a usar a Otan como palco para debater os próximos passos.

RÚSSIA

A bola agora está com Vladimir Putin. Depois de ser reeleito para o terceiro mandato consecutivo, seu poder foi reforçado internamente, mas no cenário global está acuado por causa das denúncias de atuação nas eleições americanas e pelas acusações de envenenamento de um ex-agente duplo russo na Inglaterra, que levou o Ocidente a coordenar uma expulsão em massa de diplomatas do país. Assim como Trump, o líder russo deverá ter um discurso forte, mas seus generais podem ter uma atuação mais moderada. Ele possui estratégia de longo prazo e sabe que qualquer passo em falso pode representar um risco. Assim, poderia abandonar sua lealdade a Assad em troca de seu futuro.

IRÃ

Outro grande fiador de Assad, Teerã está mais preocupado com o futuro de seu acordo nuclear, que pode ser abandonado pelos americanos em meados de maio. As mudanças na Casa Branca, com John Bolton no cargo de conselheiro de Segurança Nacional e Mike Pompeo no Departamento de Estado, eram praticamente uma sentença de morte para o acordo. Agora, o país tem a possibilidade, ainda que remota, de negociar a manutenção do tratado em troca do abandono de Assad. Não será uma manobra fácil.

SÍRIA

Este vídeo pode te interessar

A guerra que entrou em seu oitavo ano e com incontáveis cenas de barbárie, que parecia se encaminhar para um final tendendo a manter Assad no controle do país, pode ficar reaberta. Europeus e americanos foram pragmáticos e engoliram a retomada de força do ditador, pois ele se mostrou eficiente em controlar o Estado Islâmico: este é seu maior trunfo. Há a possibilidade, contudo, que seu nome tenha voltado a parecer insustentável devido aos supostos ataques químicos ou que Rússia e Irã venham a rifar seu apoio. Um fortalecimento do Estado Islâmico seria seu maior escudo.

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta

A Gazeta integra o

The Trust Project
Saiba mais