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A experiência de três argentinas com o aborto

A experiência de três argentinas com o aborto

Mulheres contam suas histórias sobre a gravidez e o aborto clandestino; culpa, abandono e dificuldades econômicas fazem parte da sua trajetória

Publicado em 15 de junho de 2018 às 12:42

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Manifestantes pró-aborto alegam que proibição provoca a morte de mulheres que buscam cirurgias clandestinas . (Reprodução/Twitter)

Vindas de gerações, classes sociais e trajetórias diferentes, três mulheres marcadas por suas experiências com o dilema do aborto sentiram na pele o drama do debate parlamentar sobre a legalização da prática na Argentina. O projeto que torna legal o aborto eletivo foi aprovado nesta quinta-feira, 14, pela Câmara de Deputados no país. Agora, o projeto segue para o Senado. O presidente Mauricio Macri já afirmou que sancionará a lei se a Casa aprovar.

Nas ruas que cercam o Congresso, milhares de jovens se manifestaram sobre a votação - a maioria a favor -, e foi ali onde as três mulheres contaram suas histórias para a agência France Press.

"A culpa pesava em mim"

"Era num lugar longe, horrível, sem nenhuma assepsia. Fui de ônibus. Eu chorava. Meu parceiro me acompanhou, mas ficou do lado de fora. Quando acordei, eu tinha que sair imediatamente. Pegamos outro ônibus. Eu estava descontente e a culpa pesava em mim, mas não pude fazer mais nada. Em 30 anos quase não contei a ninguém", disse Margarita, de 62 anos.

Com um xale verde em volta do pescoço, na cor que identifica o movimento a favor do aborto legal, a memória ainda a comove. Profissional de classe média, ela admite que teve sorte por ter sobrevivido e poder contar a história hoje. "Eu tinha 30 anos de idade, um bebê de um ano. Estava recém-separada e tinha um parceiro casual. Eu tive que conseguir o dinheiro", recorda.

"Ir embora, uma maneira de abortar"

"Eu nasci na aldeia 21/24 (bairro pobre). Todos na vizinhança sabemos de alguém: uma prima, uma tia, uma avó, uma amiga que passou por um aborto clandestino", disse Naty Molina, de 41 anos, ativista do Movimento Dignidade Popular.

Mãe aos 16 anos, Naty admite que pensou em abordar, mas foi adiante com a gravidez, o que a obrigou a sair da escola. "Eu chorei muito. Estava acompanhada, mas muitas das minhas colegas ficaram grávidas e foram abandonadas. Nos culpam por tomar a decisão de abortar, mas também por engravidar e ter filhos. Os homens nos engravidam e vão embora. Essa também é uma forma de abortar", denunciou Naty. Além do primeiro filho, hoje com 27 anos, ela teve outros dois, hoje com 25 e 10 anos, com seu "companheiro de vida e luta".

"É a luz dos meus olhos"

 

Melisa, de 25 anos, mora em José León Suárez, periferia noroeste de Buenos Aires, e é mãe de duas meninas. Uma de 8 e outra de 4 anos, de dois pais diferentes, dos quais é separada. Sua filha mais velha tem deficiência física, já passou por duas cirurgias no quadril e aguarda o terceiro procedimento. A menina precisa de um andador para conseguir caminhar.

"Quando soube que estava grávida, fiquei muito irritada e pensei em abortar, mas fiquei encantada com a ultrassonografia da bebê. Ela tinha o direito de viver. Me disseram que seria síndrome de Down, mas não foi".

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Melisa conta que a deficiência da criança é sua responsabilidade. "Não cuidei de mim. Deus me castigou porque pensei em abortar. Na verdade, não me castigou, foi justo. Hoje, minha filha com deficiência é a luz dos meus olhos. Deus me recompensou com a segunda. Elas se adoram", diz a jovem de pouca renda, que vive do dinheiro dado pelos pais das crianças.

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