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Estatística do caos: violência no Rio é a que mais aumenta

Estatística do caos: violência no Rio é a que mais aumenta

Levantamento mostra que homicídios tiveram alta de 24%; assaltos, de 40%

Publicado em 27 de fevereiro de 2018 às 09:32

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(Pixabay)

Cenas de arrastões, saques e agressões filmadas por cariocas e turistas durante o carnaval foram o estopim para a decisão do presidente Michel Temer de decretar uma intervenção federal na segurança do Rio, mas o pavio que fez a violência explodir estava aceso há três anos, quando índices de criminalidade começaram a expor a perda de controle da situação. Segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o Rio foi o estado do país que apresentou maior aumento da taxa de roubos por cem mil habitantes na comparação entre 2015 e 2016: ela subiu de 893,9 para 1.255, o que corresponde a um crescimento de 40,4% (o segundo lugar ficou com Pernambuco, que registrou 34,6%).

No mesmo período, a taxa de homicídios por cem mil habitantes do Rio subiu 24,3%, passando de 30,3 para 37,6. O aumento percentual só foi superado por Acre e Amapá, que têm populações e números de mortes violentas muito menores que o estado.

TERRITÓRIOS DO TRÁFICO E TIROTEIOS COM FUZIS

Enquanto a taxa de homicídios do Rio — que tem o quinto Produto Interno Bruto (PIB) per capita do país — explodiu nos últimos anos, alguns estados que também ocupam posições no topo do ranking de renda seguem no sentido oposto. São Paulo, Minas Gerais e Distrito Federal reduziram a letalidade na comparação de 2015 com 2016. O Fórum Brasileiro de Segurança Pública ainda não compilou as estatísticas de 2017, mas há dados indicando que a violência continua a avançar no Rio.

De acordo com estatísticas do Instituto de Segurança Pública (ISP), nas quais o Fórum se baseia, a taxa de homicídios do Rio no ano passado voltou as crescer, registrando 40 casos para cada cem mil habitantes. Já o número de roubos total também aumentou 10,3% em relação a 2016: foram 230.450 em 2017, o que corresponde a 1.378 ocorrências para cada cem mil habitantes.

Segundo Arthur Trindade, conselheiro do Fórum e ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, embora outros estados tenham altos índices de homicídios, a violência no Rio apresenta características que não são encontradas em outros locais do país e que justificariam a intervenção federal:

— Em todas as regiões do Brasil, grupos criminosos são organizados dentro de uma lógica geográfica, em que bandidos ocupam espaços. No entanto, o Rio de Janeiro é o único estado em que a polícia precisa de caveirões (veículos blindados) para entrar nos territórios onde o tráfico está presente. São áreas realmente controladas pelo poder paralelo. Além disso, qualquer tiroteio no Rio tem uso de fuzis. Isso não acontece em Brasília, Belo Horizonte ou Cuiabá, por exemplo. E é preciso destacar que, em termos de poder de letalidade, um fuzil está muito distante de uma pistola. É uma diferença tão grande quanto a de uma pistola para uma arma branca.

Trindade observa, ainda, que, mesmo em áreas nobres do Rio, a sensação de insegurança é muito grande. Ele relaciona isso a uma falta de confiança da população nas polícias Civil e Militar:

— Enquanto pesquisas mostram que, no Distrito Federal, 80% da população confiam na polícia, esse indicador, no Rio, raramente passa de 15%.

MAIOR NÚMERO DE POLICIAIS ASSASSINADOS

César Muñoz, pesquisador da ONG internacional Human Rights Watch, também vê na falta de confiança nas polícias um agravante para a violência no Rio:

— É uma característica muito forte do estado, algo que não se vê na mesma proporção em outros lugares. Tem sido um fator que agrava muito a situação, e que inclusive coloca os bons policiais em risco.

Um outro indicador da violência fluminense que chama a a atenção numa comparação entre estados é a quantidade de assassinatos de agentes da lei. Em 2015, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o Rio teve o mais alto número de policiais assassinados no país: 98. São Paulo ficou em segundo lugar, com 66, e Pernambuco em terceiro, com 27. No ano seguinte, a estatística fluminense subiu para 132; e a paulista, para 80. O Ceará veio em seguida, com 26. O levantamento nacional de 2017 ainda não foi fechado, mas estima-se que o Rio teve outro aumento, com pelo 134 casos.

Ignacio Cano, coordenador do Laboratório de Análises da Violência da Uerj, afirma que os números do Fórum comprovam que não é de hoje que uma onda de violência castiga o Rio. Ele afirma que autoridades erraram ao acreditar que a política de segurança pública executada até 2012, baseada no projeto das Unidades de Polícia Pacificadora, continuaria funcionando sem alterações nos anos seguintes. O especialista avalia que não há um único fator responsável pela deterioração do quadro, porém aponta a crise econômica do estado como uma das principais causas:

— O número de roubos, por exemplo, começou a crescer em 2013, e, desde então, aumenta num ritmo muito alto. Vale lembrar que, por conta da crise, o Estado do Rio, nos últimos anos, começou a ter dificuldade para pagar os adicionais de policiais e investir em segurança pública, sobretudo nos setores de inteligência.

Para a antropóloga e professora do Departamento de Segurança Pública da Universidade Federal Fluminense (UFF) Jacqueline Muniz, a violência do Rio tem uma característica que a torna mais chamativa que a de outros estados brasileiros: a repercussão internacional.

— O Rio é uma espécie de tambor do país. Tudo que acontece aqui sempre vira reportagem lá fora. O que ocorre de bom ou ruim impacta estratégias políticas — diz Jacqueline, que é contrária à intervenção federal na segurança pública. — Se o interesse do governo federal é mesmo combater o crime organizado, como foi dito, o melhor alvo seria São Paulo, porque lá existe um monopólio da gestão criminosa, por meio da facção Primeiro Comando da Capital (PCC).

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