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Moradores da Serra são vigiados por traficantes até na internet

Moradores da Serra são vigiados por traficantes até na internet

Em Carapina Grande, moradores têm os celulares vasculhados pelos criminosos e são vigiados nas redes sociais

Publicado em 5 de agosto de 2018 às 20:34

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Bandidos vasculham os celulares de moradores na Serra. (Arabson)

No bairro Carapina Grande, na Serra, o controle de traficantes sobre o cotidiano da comunidade ultrapassa a barreira física. Pela internet, através das redes sociais, criminosos fiscalizam o dia a dia de moradores alterando dois fundamentos do Estado democrático: o direito de ir e vir e o conceito de justiça.

O controle paralelo instaurado pelo “PF”, facção criminosa intitulada Ponto Final, comandada por Josimar da Conceição Rodrigues, o Nicota, 24 anos, preso no dia 28 de julho, em uma casa de shows, em Vitória, inclue - entre outras práticas criminosas - monitorar as conversas e mensagens trocadas pelos moradores do bairro, através do WhatsApp.

“Colocam os meninos na pracinha e se desconfiarem do morador, param e obrigam a entregar o celular para ver se estão passando alguma informação para a polícia ou para algum rival. Vigiam tudo, até o que a gente curte, posta ou compartilha no Facebook, por exemplo”, revela um morador, que aceitou falar desde que garantido o anonimato.

Quem mora na região tenta conviver com a rotina de ver amigos, conhecidos e familiares, serem expulsos de casa, espancados em via pública, revistados, recolhidos e aos poucos, se percebem no completo isolamento.

Entre os crimes mais cruéis cometidos pelos traficantes estão os chamados tribunais do tráfico, nos quais sentenças de morte são decretadas e executadas de acordo com determinações impostas pelo medo.

E a “lei” é clara: morador que não colaborar pode ser condenado a três destinos: ser expulso do bairro, surrado como exemplo ou terminar morto.

Moradora do bairro desde que nasceu, uma mulher conta que deixou o bairro por um tempo, por medo de ter o filho aliciado pelo tráfico. “Os meninos são obrigados a ficar na entrada do bairro e avisar quando a polícia chega. E tem que falar a verdade. Senão, eles batem e fazem para todo mundo ver, para mostrar força, dar o ‘exemplo’”, relata.

REFUGIADOS

Moradores relatam que desde que o PF assumiu o comando do tráfico de drogas no bairro, o acesso ao lazer e a uma vida minimamente razoável dentro da comunidade, tiveram que ser abandonados.

Com os tiroteios constantes e a ameaças de morte, até o campo de futebol e a praça do bairro viraram zona perigosa. “Tínhamos até campeonatos de futebol no bairro, mas acabaram porque eles tomaram o campo pra eles. Eles podem jogar, mas a gente não. Acabou o prazer de viver lá”, conta um morador que, por medo da violência, deixou o bairro com a família.

A reportagem procurou a Polícia Civil após as denúncias dos moradores, mas a assessoria de imprensa informou que não haveria fonte para falar sobre o assunto.

ONZE INTEGRANTES DO BANDO JÁ FORAM PRESOS

Onze integrantes da facção do Ponto Final já foram presos pela Delegacia de Crimes Contra a Vida (DCCV) da Serra, em pouco mais de um ano. A prisão mais recente feita pela delegacia foi do líder da gangue, Josimar da Conceição Rodrigues, o Nicota.

De acordo com a polícia e com relato de moradores, Nicota atuava como uma espécie de xerife ordenando a execução de rivais e comandando o tráfico de drogas em Carapina Grande.

“Ele era o alvo número um da nossa delegacia. Era o Josimar quem ordenava as execuções no bairro e também quem determinava a expulsão de moradores que não compactuavam com o tráfico na região”, ressaltou o delegado Rodrigo Sandi Mori, na época da prisão.

Em um ano, foram registrados 12 homicídios no bairro, a maioria deles atribuídos à Gangue do Ponto Final, de acordo com informações da DCCV. Nove casos ocorreram em 2017 e três neste ano. “Dez deles já foram solucionados. Os outros dois estão muito próximos disso”, garante o delegado.

Entre os presos da gangue do PF, está Jhonatan dos Santos Alcântara, o Piu Piu, 27 anos. Ele foi pego no dia 18 de junho deste ano, no Aeroporto de Vitória, tentando embarcar para Londres, na Inglaterra.

“Saber que essas prisões aconteceram já traz um alívio para quem mora no bairro. Agora podemos respirar aliviados e com esperança de dias melhores”, declara um morador, que por medo preferiu não se identificar.

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A polícia caça agora, o último integrante com cargo de confiança do bando, Farley Haroldo Souza Lima. Contra ele já existe um mandado de prisão em aberto por homicídio.

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