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Prefeituras relaxam nos gastos e reduzem os investimentos

Prefeituras relaxam nos gastos e reduzem os investimentos

Reportagem mostra cenário das prefeituras entre 2016 e 2017

Publicado em 22 de janeiro de 2018 às 11:15

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Serra teve um aumento de 17% de gasto com custeio em comparação a 2016 . (Guilherme Ferrari )

A crise financeira nacional e a queda na arrecadação dos municípios impuseram desafios extras às administrações das cidades. Elas precisam, com menos dinheiro, atender a uma demanda que, ao passo que cresce, torna-se cada vez mais exigente. Assim, prefeitos e equipes são forçados a aprimorar a gestão para que bons serviços sejam prestados e para que o dinheiro público seja bem gasto.

Nesse contexto, cabe observar os gastos com custeio – aqueles que dizem respeito, por exemplo, a contratos de manutenção, a serviços de terceiros, compra de bens e de materiais de consumo. Nas quatro prefeituras da Grande Vitória, de 2016 para 2017, último ano das gestões passadas e primeiro das atuais, essas despesas com custeio cresceram ou foram timidamente cortadas.

A gestão passada do prefeito da Serra, Audifax Barcelos (Rede), terminou em 2016 alcançando um gasto de R$ 289,1 milhões com custeio. Ele foi reeleito no final daquele ano e o primeiro ano do novo mandato chegou ao fim totalizando uma despesa de R$ 338 milhões, um aumento de 17% de um ano a outro. Em Vitória, o aumento foi de 15%: de R$ 314 milhões para R$ 362 milhões.

Em Vila Velha e Cariacica, o gasto com custeio caiu no período, mas de maneira tímida. No município canela-verde, o prefeito Max Filho (PSDB) chegou ao final de seu primeiro ano de mandato usando R$ 265,2 milhões dos munícipes para custear a máquina pública. No último ano da gestão passada, o custeio havia alcançado R$ 274,4 milhões. A redução foi de 3,3%.

O prefeito Juninho (PPS) praticamente manteve o nível de custeio em Cariacica. Em 2016, foram R$ 83,8 milhões. No ano seguinte, R$ 82,9 milhões. Ou seja, 1% menor.

Foi pouco, mas os custeios caíram. No entanto, a tesoura que passou pela rubrica de investimentos nas duas cidades era mais afiada. O volume de dinheiro que Cariacica destinou para obras e entregas à população caiu 43%. Em Vila Velha, os investimentos foram reduzidos em 32,7%.

Na Serra, além do custeio, os investimentos também caíram de um ano a outro. Foram 73% menor, pois somaram R$ 63 milhões em 2016 e R$ 17 milhões em 2017.

Os dados foram enviados pela próprias prefeituras e dizem respeito apenas aos recursos próprios das administrações, aqueles que elas mesmas produziram.

Aumento

Apesar de aumentar o volume de dinheiro que gasta com custeio, Luciano Rezende (PPS) foi o único que aumentou o investimento. Após um resultado baixo em 2016, quando investiu R$ 1,9 milhão, a gestão da Capital destinou R$ 8,2 milhões para investimentos com recursos próprios em 2017. Significa um crescimento de 331%.

Rigidez

Para o economista Eduardo Araújo, o orçamento da administração pública é engessado, o que dificulta cortes de despesas e faz com que os gestores tenham pouca margem para redirecionar recursos.

“Para mudar o quadro, vamos precisar promover mudanças constitucionais que deem condições de criar despesas rígidas mais flexíveis. Uma alternativa é buscar maior eficiência na arrecadação municipal. Às vezes, temos municípios pouco estruturados que não conseguem fazer a arrecadação”, comentou o economista.

O especialista em contas públicas João Eudes Bezerra Filho, professor da Fucape, salientou que administrações públicas costumam ser pouco criativas e pouco inovadoras.

“A gestão pública tem que se reinventar. A cultura da administração pública é sempre paternalista. Acaba enfrentando situações de crise, como a que enfrenta agora, sem coragem de tomar algumas decisões necessárias. O investimento é o primeiro item ou área que é atingido”, explicou.

Análise

É necessário fazer reformas

Em tempos de crise e de arrecadação escassa, a tendência é a de os governos utilizarem para custeio os recursos que deveriam ser canalizados para investimentos. Na situação em que estamos, a arrecadação não aumenta facilmente e também não é possível aumentar mais os impostos. O custeio vai aumentando e acaba reduzindo matematicamente os investimentos. Mas os gestores também não têm feito o dever de casa, muitas vezes. Eles têm que racionalizar os serviços, levantar as áreas que não estão produzindo e fazer reformas administrativas.

João Eudes Especialista em contas públicas e professor da Fucape

Prefeituras afirmam que estão atentas ao equilíbrio das contas

As prefeituras não admitem a leitura de que as quedas bruscas nos investimentos ou elevações nas despesas de custeio sejam sinônimo de falta de habilidade das gestões para promover entregas para a coletividade ou falta de interesse político em enxugar despesas. Alegam que a maneira como alteram as rubricas seguem critérios técnicos para que a população tenha bons serviços à disposição.

O secretário da Fazenda de Vitória, Davi Diniz, afirmou que, desde 2013, a gestão adota uma política austera de contenção de despesas e que, de lá para 2016, o custeio caiu cerca de 29%.

Sobre o crescimento do custeio em 2017, ele disse que chegou o “momento em que a prefeitura não consegue mais sentar com empresários para reduzir contratos”.

“Vínhamos por três anos sem reajustar contratos. Todos têm previsão de reajuste. A gente renegocia. Tem alguns que nem consigo renegociar porque têm por base as convenções coletivas, como os de porteiros, merendeiras e de vigilantes de unidades de saúde. Tem um grupo, principalmente das terceirizadas, que entendemos ser de extrema necessidade para manter uma ordem, uma segurança”, explicou.

Diniz também disse que “o problema do município de Vitória é que em 2013 acabou o Fundap e em 2015 veio a crise. Temos ainda uma máquina grande, e recursos foram destinados à manutenção dos serviços e não para novos investimentos. Essa foi a prioridade. A gente compara nosso Orçamento de 2016 ao de 2007. É melhor ter um carro velho e não ter dívida do que ter um carro novo e ficar todo endividado.”

A subsecretária de Finanças de Cariacica, Shymenne Benevicto Castro, também afirmou que o recuo nos investimentos feitos pelo município seguiu a lógica da manutenção da qualidade e da quantidade dos serviços que já são oferecidos. Novos investimentos demandam novas despesas de custeio.

Ela destacou que a crise nacional tem feito a população migrar dos serviços privados para os públicos, sobrecarregando educação e saúde da esfera pública.

“Está havendo uma demanda grande para o município e temos que aumentar gastos, por exemplo, com educação. Por isso o custeio cresce. Temos que abrir novas unidades de ensino, contratar professor, oferecer merenda”, relatou.

O custeio de Cariacica caiu de 2016 para 2017. Segundo a subsecretária, a redução se deu em função de cortes de combustível, energia e em contratos de locação de veículos e de prédios.

“Estamos num momento de extrema crise. Em 2017, estávamos com a mesma receita de 2011. Apesar de todas as dificuldades, o município consegue manter os serviços. A retomada econômica nacional ainda não é visível nos municípios.”

Ritmo

O secretário de governo de Vila Velha, Saturnino de Freitas Mauro, usou um argumento diferente para explicar o freio nos investimentos feitos pelo município em 2017. Segundo ele, a gestão, que entrou em 2017, precisou, primeiro, lançar as bases para as realizações.

“Uma coisa é um investimento no último ano de um governo. Já estavam com a máquina desenvolvida, funcionando, com as obras em andamento. Até que você faça novos projetos e se estruture para fazer novos projetos e novas licitações, tem um retardo que é uma coisa normal. Isso na parte dos recursos próprios”, frisou.

O secretário destacou a queda no custeio da cidade, embora a receita de 2017 tenha “empatado” com a de 2016. “Houve redução de custeio em vista de revisão de contratos. Tivemos contenção de despesa grande. Renegociamos vários contratos de serviços continuados, reduzindo os valores. São despesas que envolvem contratos de coleta de lixo, limpeza pública, custeio da saúde e da educação”, disse.

Ajuste

Em nota, a Prefeitura da Serra informou que a atual gestão de Audifax Barcelos (Rede) começou mantendo-se “conservadora” nos investimentos para “manter o equilíbrio das contas públicas”.

Destacou que em 2017 realizou obras e que fez o “ajuste das contas, efetuando, por exemplo, pagamentos das despesas de exercícios anteriores”.

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“A prefeitura prevê para os próximos anos novos investimentos que atendam as necessidades dos moradores, mantendo a oferta de serviços de qualidade. Vale ressaltar que, em 2016, a Serra foi o município do Espírito Santo que mais realizou investimentos, de acordo com o anuário Finanças dos Municípios Capixabas”, informou, em nota.

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