O Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) regulamentou a nomeação de advogados dativos - acionados para defender quem não pode pagar por um advogado quando não há defensor público disponível. A resolução que impõe as regras foi publicada nesta segunda-feira (05). Quem quiser ser apontado como dativo terá que se inscrever e, ao ser nomeado uma vez, irá para o fim da fila. A relação será atualizada semestralmente. A ideia é que, assim, não haja mais os curiosos casos de advogados que, sem critério aparente, eram designados frequentemente para atuar como dativos, embolsando uma quantia significativa, em detrimento dos demais.
A Ordem dos Advogados do Brasil - seccional Espírito Santo (OAB-ES) chegou a apresentar uma representação à Corregedoria do TJES, em outubro do ano passado, questionando o direcionamento e o favorecimento de alguns advogados - filhos de juízes - no processo de nomeação. "Mostramos ao então corregedor-geral que havia favorecimento claro para alguns dativos, como para filhos de magistrados e parentes de assessores de juízes", afirmou o presidente da OAB-ES, Homero Mafra. "Era assim: eu sou juiz e nomeio para o processo o advogado A, para o próximo, o advogado A, para o outro processo, ainda o advogado A. Só lá no quinto processo, de menor valor, eu escolho o advogado B", exemplificou.
A nomeação dos dativos cabia aos próprios juízes das comarcas. Alguns, como em Iúna e Barra de São Francisco, chegaram a impor regras. "Mas antes isso dependia do juiz. Agora, com a resolução, há regras obrigatórias", comemorou Homero, ao ressaltar que a regulamentação é um pedido antigo da Ordem. Ele avalia que a edição da norma acaba com a possibilidade de privilégios a um ou outro advogado.
A denúncia feita pela OAB-ES mostrou que, dos 716 advogados nomeados como dativos entre janeiro de 2016 e junho de 2017, 40 receberam mais da metade dos R$ 4.380.495,52 que foram pagos a todos esses profissionais. Essa minoria de advogados recebeu valores entre R$ 27 mil e R$ 97 mil.
A representação feita à Corregedoria-Geral, no entanto, foi arquivada. Quanto a isso, a OAB-ES pretende recorrer ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ). "Nós apontamos as irregularidades na representação, mas o então corregedor entendeu que não havia irregularidade porque antes não havia regras a serem seguidas. No entanto, a Constituição prevê o princípio da moralidade e da impessoalidade na administração pública. Sendo assim, vamos ao CNJ. Vamos protocolar isso amanhã (terça-feira). Que o Conselho diga, então, se é lícito e moral privilegiar uns em detrimento de outros", criticou Homero.
A resolução que garante o cumprimento de regras para a nomeação dos ativos foi assinada pelo atual presidente do TJES, desembargador Sérgio Gama. Por meio de nota, o TJES informou que "houve um longo estudo sobre o tema e somente agora é que a resolução foi concluída e aprovada pelo Tribunal Pleno".
DEFENSORES CONTESTAM NOMEAÇÕES
A Associação dos Defensores Públicos do Estado do Espírito Santo (Adepes) não culpa o TJES pela regulamentação, mas critica o governo do Estado pela falta de orçamento e de pessoal para atuação da Defensoria Pública em todas as comarcas do Estado. É somente pela falta de defensores que os dativos são necessários.
"Desde maio de 2014 foi promulgada a Emenda Constitucional 80, que diz que deve haver defensor público em todas as comarcas do país. Enquanto vários Estados tiveram avanços na questão orçamentária e no quantitativo de defensores, no Espírito Santo a gente só teve o quadro reduzido. No final de 2013 eram 215 defensores e hoje são apenas 165. E temos o pior salário do Brasil. O salário de um defensor é de R$ 10.395 brutos hoje no Espírito Santo. A média nacional está acima de R$ 20 mil", disse o presidente da Adepes, Pedro Paulo Coelho.
"Essa regulamentação institucionaliza a advocacia dativa, quando na realidade a gente deveria fortalecer a Defensoria. O Tribunal de Justiça não tem culpa quanto à situação da Defensoria e buscou a regulamentação para um problema que existe de fato, que é a falta de defensores. A única solução é a instalação de Defensorias em todas as comarcas. Os advogados dativos estão recebendo dinheiro público. E sabemos que tem dativo recebendo do Estado e ainda cobrando da parte, que é pobre", afirmou Coelho.
A resolução do Tribunal de Justiça estabelece que "apenas haverá nomeação de advogados para atuarem como dativos quando a Defensoria Pública do Estado não puder prestar a devida assistência à parte, por inexistência ou insuficiência de defensores públicos na Comarca ou Juízo, devendo ser conferida à Defensoria Pública do Espírito Santo a prioridade para a prática dos atos processuais".
Por meio de nota, a Secretaria de Estado de Planejamento informou o seguinte:
O orçamento da Defensoria Pública é definido a partir de critérios previstos na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), de forma compatível com a capacidade econômica e financeira do Estado.
Os mesmos critérios são aplicados de forma isonômica para todos os poderes do Estado, que assim como a Defensoria Pública têm autonomia para organizar seus orçamentos dentro do teto aprovado pela LDO. A LDO, assim como o Orçamento, é submetida à apreciação e aprovação pela Assembleia Legislativa.
Em 2018, o orçamento anual proposto para a Defensoria Pública é 4,48% maior do que o de 2017. O mesmo índice de variação, de 4,48% em relação a 2017, é aplicado aos valores propostos para os orçamentos do Executivo, dos poderes Legislativo e Judiciário, do Tribunal de Contas e do Ministério Público"
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